Crítica de Fernando Melo: Sra. Peliteiro, em Esposende

Na tranquilidade idílica da Foz do Cávado, Esposende, há um dínamo biónico que ninguém consegue parar. Paula Peliteiro puxou ares das quatro partidas do mundo e no seu Sra. Peliteiro, junto ao campo de golfe, executa o que o imenso e colorido mundo interior lhe inspira. Cada refeição um retiro, cada prato uma lição.

Paula Peliteiro nasceu em Vila Nova de Famalicão e desde muito cedo a cozinha e doçaria estão nos seus hábitos diários. A avó, também de Famalicão, tinha na mesma casa restaurante, mercearia e talho, pelo que alguma coisa de primevo se deve ter instalado no coração da pequenina feliz que a fez mais tarde, já no Brasil, despertar para a vocação. Até lá, estudou artes e alimentou a paixão pela fotografia. Deram pelo nome de Porto das Francesinhas os restaurantes que abriu e explorou no Brasil, oferecendo a dita na forma original e sete variações mais, com sucesso assinalável.

A abordagem estética, essa ficou e nota-se bem em tudo o que faz, tanto nos matizes da comida que serve como na noção de harmonia que impõe aos pratos que produz, em termos de aromas, temperos e texturas. O polvo à Sra. Peliteiro (19,50 euros), prato inefável e inesquecível, é tostado em azeite, alho e molho de pimenta da terra com laranja. O resultado é equilibrado, preocupação rara quando toca à cozinha dita tradicional portuguesa. As texturas conseguidas do bacalhau com cabelos de anjo (18,50 euros) e da gloriosa moqueca de gambas (17,50 euros), esta das artes brasileiras que absorveu, põem-nos quietos a olhar lentamente para tudo à nossa volta.

Desconheço a inspiração e influência por detrás da cataplana de tamboril (36 euros), mas é nela que se sente o rigor e a técnica com que a chef Paula trabalha proteína, legumes e sucos. O pernil de porco fumado no forno (34 euros) é obrigatório nesse sentido, além de que como num passe de mágica foge da linha normal dos desleixos culinários do costume, em que as gorduras estão soltas e mal resolvidas. Impossível não namorar o caril de galinha (13,50 euros) pela riqueza e abundância de sabores, dignas de Sherazade, e não sentir vontade de roubar a tagine minhota e cuscuz marroquino (16,5 euros), cubos de vaca, pimentos e ananás em molho agridoce.

Paula Peliteiro é professora de cozinha e pastelaria na escola profissional de Esposende, ali ao lado, pelo que só um tolo abdica das derradeiras delícias feitas por esta guardiã do fogo. Atrevida no abade de priscos com mascarpone de nozes (5,50 euros), irrita qualquer santo pela insistência no batismo, mas o sabor está conseguido, há o brownie Sra. Peliteiro com ganache de chocolate quente (5,50 euros), tratado de pastelaria com chocolate, e prazer supremo nos à nossa espera nos quindins mini (4,50 euros), a suplicar «leva-me contigo». Mas o que nós queremos é ficar.

 

Algo está a fazer com que o sistema não consiga mostrar a ficha ténica desejada. Pedimos desculpa pelo incómodo.

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