Crítica de restaurante: Mesa de Lemos, Viseu

Crítica de Fernando Melo
Diogo Rocha, chef do restaurante Mesa de Lemos, em Viseu
O grande reduto da cozinha portuguesa está na proximidade, entendida e interpretada de forma abrangente. Diogo Rocha comanda a cozinha do Mesa de Lemos, em Silgueiros, e está na linha da frente da revolução inevitável. Assim vamos mesmo ser os maiores.

Tenho muitas vezes vontade de escrever cartas a cozinheiros em quem vejo brilho nos olhos e talento vertido nos muitos pratos que depois fotografamos, instagramamos e guardamos. Só que quando estou quase a fazê-lo acho que não devo. Mesmo sendo coisas positivas, acabo por entender que qualquer palavra é interferência desnecessária, melhor é acompanhá-los e seguir o que vão fazendo. O bem-disposto e ainda jovem chef Diogo Rocha definiu sem querer a rede de todas as proximidades de que dependemos para explicar o passado e criar o futuro. O restaurante está integrado ele próprio num demonstrador de arquitectura, fabrico de têxteis e exponenciação do novo design português, sem dúvida inspirador para quem tem a seu cargo uma cozinha que se quer de leitura universal mas que está em lugar remoto.

Joga primeiro o jogo da proximidade geográfica, ao concentrar-se em produtos específicos de diferentes regiões. A maçã, as leguminosas e o cabrito, por exemplo, estão logo ali. Mas o «logo ali» do chef Rocha é o país inteiro, porque ele aparece em toda a parte, ao lado dos nossos maiores a cozinhar, a conhecer e a tornar um pouco seus os produtos com que depara. Os seus menus – a forma de nos relacionarmos com ele e conhecer a sua comida – estão repletos de pares região/produto, resultado dessa inquietude vibrante que põe o mundo ali. O segundo nível de proximidade é familiar. É este, de resto, o que ainda continua a pautar as cartas da maioria dos restaurantes portugueses, e entram as receitas passadas de geração em geração, aquela sopa que a avó fazia ou a cabidela inesquecível.

As bases da cozinha de Diogo Rocha são cândidas e estão presentes em todos os seus pratos, desde a simples caldeirada aos pratos de tacho, com o tempo necessário. Cumpre também com o que considero o terceiro nível de proximidade, e que é cultural, pela simpatia com cozinhas de outros continentes e formas de síntese de sabor alternativas das nossas. Aparecem bem integradas soluções com caril, caldos orientais e sabores brasileiros, tudo para favorecer o resultado final. Inesquecível o que fez uma vez com um simples caldo de bacalhau, a propósito. E na derradeira expressão que é a proximidade técnica, é um rapazinho culto e informado que adotou sequências e abordagens que não aprendeu na escola, e em bom momento o fez. Isso permitiu-lhe, entre outros, ter uma enorme facilidade em integrar os vinhos da casa, Quinta de Lemos, nas suas criações. Exige técnica e experiência o exercício, especialmente quando o resultado é tamanho.

É fundamental visitar a Mesa de Lemos, sentados à mesa e a conversar com um dos maiores talentos culinários do momento. Assente na humildade e simplicidade que marca o seu perfil, tem tudo para continuar. Eu quero ver.

 

A refeição ideal
Menu do Chef (105 euros)
Suplemento de vinhos (40 euros)
Da costa portuguesa – Os mariscos
Do mercado de Viseu – As leguminosas
Dos Açores – O cherne
De Peniche – O polvo
Do Caramulo – O cabrito
De Portugal – Os queijos
Da nossa horta – A beterraba

 

Algo está a fazer com que o sistema não consiga mostrar a ficha ténica desejada. Pedimos desculpa pelo incómodo.

 

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