Não sendo a capital do país, o Porto não teve a mesma visibilidade mediática no dia 25 de abril de 1974 que Lisboa teve. Era em Lisboa que se centrava o poder político que era necessário derrubar para acabar com quatro décadas de ditadura. Mas também no Porto as tropas se mobilizaram para pôr em curso aquela que ficou conhecida como Revolução dos Cravos.
Os militares saíram do CICA – Centro de Instrução e Condução Auto N.º1, onde hoje funcionam as consultas externas do Hospital de Santo António. Foi aqui que se preparou a revolução na Invicta. Depois da senha “Grândola vila morena”, os militares juntaram-se para tomar o quartel de Santo Ovídio, na Praça da República. Estas forças foram reforçadas com os militares que vieram de Lamego.
A contar estas e outras histórias estará a 19 de maio Germano Silva, jornalista e cronista da cidade do Porto, na altura repórter do Jornal de Notícias, que acompanhou a noite e o dia da Revolução. No passeio Os Trilhos da Liberdade, iniciativa integrada na comemoração dos 50 anos do 25 de Abril, fará paragens em alguns dos pontos essenciais da Revolução, mas também vai abordar outras datas da cidade, como a Revolução Liberal e a revolta republicana de 31 de Janeiro. O ponto de encontro é às 10 horas no Largo Soares dos Reis.
#Praça da República/Quartel de Santo Ovídio
“Saí com o Manuel António Pina [escritor e também jornalista do JN] para ir comer uma isca numa tasquinha da Rua da Lapa”, conta Germano Silva. Ao passarem pelas traseiras do quartel de Santo Ovídio (Praça da República), cerca da 1 da manhã, viram movimentações de militares. Perceberam imediatamente o que estava a acontecer pois Pina, que recentemente tinha saído da tropa, sabia o que se preparava. “Ele esteve no departamento de informação e contrainformação. Naquela noite, recebeu uma chamada que dizia, ‘já chegou o livro, eu vou lê-lo e depois digo-te alguma coisa’”. Era o código para dar conta que a revolução estava em curso. Com a chegada dos militares, este quartel, erguido no início do século XIX, foi palco de mais um importante acontecimento para o país. Por ali, já tinham passado outras revoluções, como a liberal, em 1820, e a revolta de 31 de janeiro de 1891, que tentou implementar a República.
#Edifício JN
Como “marca de resistência e de combate”, o Jornal de Notícias é um dos pontos de referência do passeio de Germano, que ali trabalhou como jornalista durante décadas, e com o qual continua a colaborar. Por isso, haverá uma paragem em frente ao icónico edifício JN, Rua Gonçalo Cristóvão, onde entre dezembro de 1970 e o verão de 2023 funcionou o jornal. O autor lembra que na madrugada de 25 de abril “a euforia era muita na redação; pela primeira vez podíamos escrever sem medo da censura”. Germano chegou à lá, depois de ter percebido as movimentações militares, pelas 2 horas da manhã. Com o chefe de redação Manuel Ramos e o subdiretor Freitas Cruz, começou a ligar para os jornalistas. Era hora de irem para a redação fazer as edições especiais que saíram durante o dia. “Sempre que chegava alguém era uma alegria. As pessoas abraçavam-se. Já podíamos trabalhar em liberdade.”
#Museu Militar
O passeio pelos lugares da liberdade passa na antiga delegação no Porto da PIDE, a polícia política, onde atualmente funciona o Museu Militar. Durante quatro décadas, foram ali presas e torturadas mais de 7 mil pessoas. Na noite da Revolução, os militares que vinham do Centro de Instrução de Operações Especiais de Lamego tinham como objetivo ocupar a prisão. Mas só no dia 26 isso aconteceu e foi libertado o último preso político. Os agentes que lá se encontravam foram deixados em liberdade. Para a celebração dos 50 anos, o museu apresenta programação que inclui as exposições “A censura durante o Estado Novo”, “O 25 de Abril e as novíssimas gerações”, “26 de Abril, um dia depois do fim”, e também visitas guiadas ao percurso da Unidade de Informação e Interpretação do projeto “Do Heroísmo à Firmeza”, da União de Resistentes Antifascistas Portugueses, entre outros eventos. Programa em facebook.com/museumilitardoporto
#Outros trilhos
O Porto foi também um bastião na luta republicana. Neste passeio, Germano Silva passa por dois espaços ligados à sua História. Um, na esquina entre Santa Catarina e a Rua Formosa, outro na Praça dos Poveiros. No primeiro, falar-se-á de Alves da Veiga, um dos impulsionadores da revolta de 31 de Janeiro de 1891, que tentou implementar a república a partir do Porto. Era ali que ele tinha o seu escritório e onde se delineou a rebelião. No dia em que vão pôr em prática o golpe, Alves da Veiga e os republicanos que o acompanhavam vão até ao centro Centro Democrático Federal de 15 de Novembro, nos Poveiros, buscar a bandeira vermelha e verde, para a hastear. E é o que fazem quando invadem o edifício dos Paços do Concelho e Alves da Veiga discursa. A revolta, mal planeada, não resultou e Alves da Veiga viu-se obrigado a exilar-se em Paris, tendo apenas regressado a Portugal quando a República vingou, em 1910.