Crítica de Fernando Melo: Restaurante Pesca, Lisboa

Diogo Noronha sentiu o apelo do mar, onde tudo é simples e não admite véus nem disfarces, e bolinando, criou o Pesca, no Príncipe Real, em Lisboa. Agora nunca mais nada vai ser como era.

Exageramos sempre que dizemos que o nosso peixe é o melhor do mundo, apesar de ser exatamente o mesmo que outros países afirmam sobre a sua fauna marítima. Mas enquanto isso fizer encher o peito de um português aumenta a nossa autoconfiança, que nem sempre tem sido o nosso forte. A pescada e o que se faz com ela na Galiza, Espanha, merece pelo menos que se conheça, os pregados e linguados de Dover, Inglaterra, são de grande gabarito, mas a afirmação como melhor do mundo é antes de mais a sustentação da mesa portuguesa como espaço de festa e partilha. Não há português que não sinta prazer em partilhar na sua mesa um bom pargo assado no forno, servido diretamente no recipiente onde cozinhou, acompanhado de vinho que não desmereça. Todos temos a noção de frescura e excelência incrustada no código genético e por isso abraçámos as novas formas de preparar, cozinhar e comer peixe, nas chamadas cozinhas étnicas, tão bem representadas entre nós.

Todos os nossos chefs de proa têm provas dadas no peixe e marisco que propõem nas ementas, a par da oferta vegan e carnívora, muitas vezes a raias a genialidade. Diogo Noronha, nome associado a projetos lisboetas que acompanhámos com entusiasmo como Pedro e o Lobo, Casa de Pasto e Rio Maravilha decidiu abordar o assunto marítimo na vertente mais luxuosa possível. Produto exclusivamente português, diversidade, equipa de elevado nível técnico e qualidade sem contemporizações.

Chamou-lhe Pesca e não tem de acrescentar praticamente mais nada, tirando que a carne entra apenas eventualmente na forma de fumados em assessorias brilhantes como é o caso da ostra panada (17 euros), escabeche tépido do mar, migas de morcela da Guarda – aqui está -, rábanos, cenoura e laranja confitada e do atum rabilho e cecina (19 euros) – outra -, madalena de pinhão, cebolas novas em picle e chagas em folha. Alguma pena, a propósito, de não ver mais pratos vegan, por saber que o chef Noronha tem total fluência e experiência no assunto, basta conferir a incrível criação que é a couve-flor na brasa (14 euros), creme de avelãs, puré de limão, ervilha de quebrar e carvão vegetal. Calo-me logo quando vem o tártaro de lula (17 euros), gema de ovo em picle, maçã granny smith, rama de aipo e aneto.

A estrutura amaciada do cefalópode, objetivo afinal de qualquer tártaro, e a integração com os restantes ingredientes é notável, e que bem sabe. Dos oito pratos principais provei cinco e em todos encontrei personalidade e inteligência, o que põe uma nota muito forte na cozinha, a mostrar-se mais que capaz. Escolho o que mais me impressionou, pargo legítimo braseado (39 euros), puré de topinambo, laranja, espinafres selvagens, sésamo e emulsão de alho negro. Escolha injusta, todos os que provei são excecionais. Excecional é também Claiton Ferreira, chef de pastelaria, pelo pão que produz, pelo que faz com o chocolate peruano 65% de cacau (11 euros) e pelo magnífico arroz doce do Sado (9 euros). E não só. Grande casa, grande chef e grande experiência. O melhor peixe do mundo já tem casa.

 

Classificação:
O espaço: 4,5
O serviço: 5
A comida: 5

 

A refeição perfeita:
4 ostras: ao natural (3 euros); com pérolas de mirim, molho de soja e coentros (4 euros); com água de pepino, limão confit e salicórnia (4 euros); e com foie gras, beterraba e pimenta sichuan (6 euros)
Couve-flor na brasa (14 euros)
Tártaro de lula (17 euros)
Pargo legítimo braseado (39 euros)
Arroz doce do Sado (9 euros)

 

Algo está a fazer com que o sistema não consiga mostrar a ficha ténica desejada. Pedimos desculpa pelo incómodo.

 

Leia também:

Crítica de Fernando Melo: restaurante Mesón Andaluz
Crítica de Fernando Melo: Restaurante Kanazawa, Algés
Crítica de Fernando Melo: Restaurante Brasão, Felgueiras




Outros Artigos





Outros Conteúdos GMG





Send this to friend