Crítica de Fernando Melo: Restaurante Brasão, Felgueiras

Peguem num par de olhos alegres de criança, sorriso indefetível na cara e uma jaleca alva no corpo e têm uma imagem aproximada de António Carvalho, proprietário oficiante do Brasão, um clássico renovado no início de 2017.

Sempre que um restaurante de que gostamos faz obras de remodelação gera-se-nos dentro uma instabilidade que só se resolve quando nos sentamos de novo à mesa. No lugar da Refontoura, em Felgueiras, permanece viva a aura do restaurante Brasão, do bravo criador António Carvalho. 71 anos que ninguém diria, começou em 1975 com a que era então uma mercearia apenas, mas que cedo se tornou referência pelo arrojo e modernidade. Começou a servir uns petiscos simples e em dois anos apenas decidiu abrir o restaurante. Não entrava na cozinha, imagine-se! Passo a passo, começou a entrar no ofício até que uma década depois se sentiu preparado para assumir a cozinha do Brasão. À paixão pela cozinha juntou-se o lado empreendedor do chef Carvalho, abrindo com sucesso vários restaurantes. Levou aos píncaros, por exemplo, o Santa Quitéria, ali perto, que viria a passar a um colaborador seu em 1995. E chegou a ter casa aberta também no reino dos algarves, em Albufeira, com o Viveiros da Galé, que deixou marca no seu perfil culinário.

Tudo menos monotonia, aprendendo em todas as instâncias, assim se fez o mestre à mesa de quem nos sentamos. A vida encaminhou-se para a simplificação, e isso sente-se bem na renovação que fez no início do ano. O Brasão é a sua vida, a sala é genuinamente um espaço de partilha. A tábua mista de queijo e fumeiro (10 euros) dá-nos as boas vindas, tudo artesanal e regional, para irmos incrustando sabores e aromas. Há uma sopa de garoupa (12,50 euros) de tal talante que vai direita à alma, prenúncio feliz do que virá a seguir. É uma refeição inteira, diga-se, a que só os temerários se arrogam. Conferimos os bolinhos de bacalhau (60 cêntimos cada), fica assente o imperativo de meter o nariz nos pratos do fiel amigo e ei-los em desfile. Escolho dois, o patrimonial bacalhau à Brasão (11 euros), gratinado com puré de batata, e o bacalhau da Revolta (14 euros), assim chamado por ter arrebatado um diploma de ouro no concurso A Revolta do Bacalhau de 2017, constando de lombos confitados e assados com pimento vermelho. Ainda vem uma travessinha de amêijoas à Bulhão Pato e que bem trata António Carvalho a cascaria, maravilha, artes que terá aprimorado lá para os baixos algarvios. Para os mais céticos da influência dos mares mais a sul, há uma gloriosa cataplana (25 euros, 2 pessoas), mista de peixes, amêijoas e camarão, fusão feliz de aromas no caldo mais atlântico que se pode desejar.

Tomamos a rota carnívora e o mistério toma conta de nós, o cabrito assado no forno (12,50 euros) é de antologia e é servido com batata assada, arroz de miúdos e grelos salteados. A costela de boi no bafo (12,50 euros) é magia pura, transformação de oito horas sobre brasas mortiças. Tanto este como o cabrito têm de ser encomendados de véspera, melhor e mais seguro é telefonar, até porque com sorte ainda se conversa um pouco com o carismático chef. Chegados ao termo, há que encontrar espaço interior para pelo menos um queque de cenoura e pinhão (2 euros cada), atrozmente delicioso, um pudim abade de Priscos (3,50 euros) com que apetece dançar sala fora e o bolo de bolacha (2,50 euros), que configura regresso à infância. A seleção de vinhos novos e velhos é um dos motivos só por si para visitar este Brasão, não fora a copiosa coleção de aguardentes que António Carvalho partilha com prazer. Vai da alma, grande chef: obrigado!

 

Classificação

O espaço: 4
O serviço: 4
A comida: 4,5

 

A refeição ideal

Presunto de lavrador (5 euros)
3 bolinhos de bacalhau (1,80 euros)
Sopa de garoupa (12,50 euros)
Cataplana de peixes (25 euros, 2 pessoas)
Queque de cenoura e pinhão (2 euros)

 

Algo está a fazer com que o sistema não consiga mostrar a ficha ténica desejada. Pedimos desculpa pelo incómodo.

 

Leia também:

Crítica: os vinhos que marcaram a feira Vinhos & Sabores
Crítica de restaurantes: Uma Graciosa surpresa nos Açores
Crítica de restaurantes: Lisboa merece o JNcQUOI




Outros Artigos





Outros Conteúdos GMG





Send this to friend