Crítica de Fernando Melo: Restaurante Faz Frio, Lisboa

Covilhanense itinerante, o chef Mateus Freire é o mais recente cozinheiro à frente do fogo que lavra diariamente na cozinha do Faz Frio. No alforge traz tudo o que absorveu nos sítios por onde passou e com que aquece o coração de todos os que se sentam à mesa da casa que de fria só tem o nome.

Quis o destino que o jovem marinheiro dos sabores e raízes portugueses amarasse nos altos do Príncipe Real, após muitas marés e ventos de aprendizagem. Mateus Freire é um pensador livre e rege-se unicamente pela sua sensibilidade culinária, juntando paixão e conhecimento na síntese de todos os seus pratos. Oficia no Faz Frio, um dos locais mais conspirativos de Lisboa, parte dos chamados restaurantes da marinha, outrora altas patentes dessa arma conspiravam à mesa, nos recantos sabiamente criados por divisórias que de resto ainda hoje ali encontramos.

Prato de excelência e referencial dessa comunidade anfíbia era o bacalhau à Brás, na variante lisbonense e fosse por onde fosse o chef Mateus Freire sentiu-se em boa hora obrigado a preservar a tradição, ainda que liberto dos rigores de fardas e regime. Há pratos que são mesmo bons e vão direito à alma. O nosso timoneiro foi direito ao bacalhau à Assis (12 euros), ponte evidente com o Brás, mas ornada com outros sabores da nossa tradição, a receita permite o pimento, a cenoura e o presunto a gosto do cozinheiro. Batata palha e ovos macios, com isso é que não se brinca. É o prato do dia de peixe à sexta, o da carne é pastéis de massa tenra com arroz de feijão (11,5 euros), e que bem que sabem.

O rapaz ainda pega no bacalhau noutros três dias, a saber à terça numa açorda de bacalhau (11,5 euros) onde não há medo da intensidade nem do tempero – brilhante a textura, só o pão precisa de ajuste -, à quarta na esplêndida feijoada de sames (12 euros), as gomas da bexiga natatória a ligar o caldo e a configurar vício, e à quinta, em que o chef Freire bate no peito evocando Eusébia, a cozinheira que outrora em Braga eternizou o bacalhau à Narcisa (13 euros), frito como a cidade dos arcebispos impõe, batata frita e outras luzes. Mateus Freire até arrepia na forma inteligente como entra na grande tradição portuguesa, fazendo lembrar com ternura Vítor Claro, seu mestre.

Há mais bacalhaus e muitas outras praias para fundear a jangada do gosto. Passeia-se provocante na carta um imperdível cachaço de porco ibérico com xerém de amêijoas (16 euros), acena-nos vaidoso um espartano ensopado de borrego com hortelã (16 euros) e fugimos para uma ilha deserta com o arroz doce com creme de canela (3 euros). Grande armada a que Freire integra com o proprietário feliz Jorge Marques e o biónico segundo Rui Bastos. Para ficar, aconchegados no bom calor.

Classificação
O espaço: 4
O serviço: 3,5
A comida: 4,5

A refeição ideal
Peixinhos da horta (3,5 euros)
Bacalhau à Zé do Pipo (16 euros)
Cachaço de porco ibérico com xerém de amêijoas (16 euros)
Mousse de chocolate 70% com abóbora, laranja e amêndoa (3,5 euros)

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Mapa da ficha ténica
Morada
Rua D. Pedro V 96 (Príncipe Real), Lisboa
Telefone
215814296
Horário
Terça a domingo, das 12h00 às 00h00.
Custo
(€€) Preço médio: 21 euros


GPS
Latitude : 38.71600919999999
Longitude : -9.146923300000026

 

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