Crítica de Fernando Melo: restaurante Bem-Haja, Lisboa

A bonita Praça das Flores, em Lisboa, é onde o Bem-Haja Lisboa tem hoje morada estável, após um período de instalação na Rua de Campolide. Cozinha rigorosa de registo beirão, deliciosamente complementada por receituário familiar. Universal por isso mesmo.

Agora que a chuva voltou, ainda que de forma intermitente, é altura de olhar de novo para os altos graníticos a norte e perceber o quanto os incêndios dos últimos meses dizimaram campos, vinhas, floresta, casas e criação. O fenómeno deu-se um pouco por todo o planeta, foi ano de fúria incandescente, a ponto de darmos por nós a pensar que os céus nos abandonaram.

O nosso querido e importante queijo Serra da Estrela vive os piores momentos de que há memória. Ao mesmo tempo, vive-se
também a solidariedade na forma mais pura, traduzida em apoio material e mão de obra para que todos de alguma forma possam reconstruir e reorganizar produções e negócios. Isabel Raposo continua imparável na ligação à Beira quanto a produto e ao Dão enquanto vinho, na que é a forma mais eficaz de ajuda. Fui encontrar alguns pratos de sempre, outros novos, todos de sabores definidos, temperos acertados e a qualidade indiscutível de que a empresária não abdica.

Uma vénia à disponibilização inicial de uma boa fatia de queijo Serra da Estrela, mensagem passada na perfeição, assim como
perfeito é o queijo em si. Fico com o sentido no bacalhau gratinado com queijo Serra da Estrela (15 euros), configura tentação
mesmo. Integração conseguida de texturas, a massa do queijo a um tempo a temperar e hidratar o fiel. Trabalho para um bom
Encruzado do Dão, e aqui a escolha vínica é farta. O assunto beirão pronuncia-se e anuncia-se em delícias como os filetes de polvo com migas (17 euros), proteína trabalhada com respeito e migas do grande preceito tradicional. O entrecosto com arroz de carqueja (14 euros) é imperdível, a gramínea impregnada da infusão delicada da erva mais portuguesa e simples de Portugal, as costelinhas a vir em pote aquecido. As costeletas de borrego com mel e alecrim (16 euros) são perfeitas, produto do nosso, consolo da gula em modo patrimonial, mais um a recuperar agora.

Isabel tem um livro de receitas que merece conspiração e espionagem, acumuladas ao longo de gerações e que funcionam bem. Não há como resistir aos bifinhos de frango recheados com farinheira (14 euros) nem aos filetes de pescada com açorda de ovas (14 euros), a fazer-nos viajar no tempo. Não há cozinha beirã sem estufados longos e não temos de procurar muito para dar com o lombinho a desfazer-se na boca, pedir logo dose dupla, uma apenas esgota só de olhar.

Presta-se quase a comer à colher, de fino e macio que está. Está visto que numa visita apenas não se chega a provar nem metade do programa mínimo, o que leva em casas semelhantes a saltar a sobremesa. Aqui isso é impossível e claro que atacamos a mesa de doces (5 euros), para encontrar delícias como o pão de ló húmido, barriga de freira, farófias e um bolo de chocolate que se repete sempre. Repetentes saímos todos, volta-se em breve, difícil será não repetir, tudo ali deixa saudades. Bem-haja, Isabel Raposo.

Classificação
O espaço: 4
O serviço: 3,5
A comida: 4

A refeição perfeita
Fatia de queijo Serra da Estrela (4 euros)
Bacalhau gratinado com queijo Serra da Estrela (15 euros)
Entrecosto com arroz de carqueja (14 euros)
Mesa de doces (5 euros)

Algo está a fazer com que o sistema não consiga mostrar a ficha ténica desejada. Pedimos desculpa pelo incómodo.

 

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