Não se passa nada no verão foi chão que já deu uvas. Nunca como agora abriram tantos espaços novos nesta época quente do ano, para muitos apelidada de tonta, e com eles vieram novidades que se comem com os olhos e nos fisgam pelo estômago — como estas quatro sobremesas, todas de restaurantes recém-abertos em Lisboa, que elegi.
Relegadas muitas vezes para segundo plano, porque chegam por norma numa altura da refeição em que já somos mais olhos do que barriga, as sobremesas — não sei se repararam — raramente são tema de conversa quando se fala deste daquele restaurante; ao contrário dos doces, de confeitarias ou caseiros, que são tão certeiros a arrancar “gostos” nas redes sociais quanto instigadores de discussões acaloradas.
O pastel de nata, por exemplo: quem não tem uma opinião (e um favorito) a respeito?
Ciente desta paixão nacional, que galgou fronteiras e converte a cada segundo novos admiradores, Rui Paula resolveu desconstruir a receita para incluir uma versão muito própria do pastel de nata na carta de sobremesas do recém-aberto Terraço (entrevisto o chef e escrevo sobre o restaurante na edição de dia 18 de agosto da Evasões), no topo do Tivoli Avenida da Liberdade. No prato, em quarto crescente, estão dispostos todos os sabores, da massa folhada ao creme sem esquecer a canela e até o café (há quem não separe um do outro), presentes num Nata (como se diz no Norte), só que com texturas totalmente diferentes. Custa 13 euros.
Açaí e gaspacho de frutos vermelhos de Kiko Martins em O Watt [fotografia de João Miguel Simões]
, o restaurante decorado pelo
designer de interiores Jasper Morrison na nova sede da EDP em Lisboa,
Kiko Martins (também falo deste projeto na edição de dia 18 de agosto da Evasões) não deu igualmente
a menor margem de manobra ao açúcar branco nas sobremesas. Inspirado na
taça de açaí com granola, complemento nutricional que muitos desportistas não dispensam no pós-treino, ele e a sua equipa criaram um equilíbrio ótimo entre doçura e acidez, recorrendo apenas à papaia (espuma), granola (crocante), açaí (sorvete) e ao caldo, o gaspacho, à base de frutos vermelhos. O toque da lima, quase um recurso de marca de Kiko, está lá — e sente-se.
Custa 7,20 euros.
Mousse de chocolate peruano de Diego Muñoz na Cantina Peruana [fotografia de João Miguel Simões]
entra no rol de clássicos que poucos, muito poucos, restaurantes se atrevem a desconsiderar nas suas cartas de sobremesas. Quis o destino que
o peruano Diego Muñoz, o primeiro chef a estar representado num espaço de José Avillez — no caso: a Cantina Peruana no andar de cima do
Bairro do Avillez (falo dela
aqui) — tivesse nas suas memórias de infância uma receita de mousse que resolveu recriar e trazer para a cantina. Servida num copo em
s-e-t-e camadas, ela leva telha crocante de chocolate e caramelo, espuma de chocolate, queque de chocolate branco, mousse, amendoim caramelizado, doce de leite (… e não, anda não terminou…) panna cotta de chocolate. É para levar a colher até ao fundo e rezar a cada nova colherada.
Custa 5 euros.
Marquise de Chocolate de Miguel Castro e Silva no Less @ Pollux [fotografia de João Miguel Simões]
Como chocolate nunca é demais — pelo menos para quem, como eu, não passa sem —, termino com a Marquise de Chocolate do
Miguel Castro e Silva, uma nova sobremesa para a segunda versão do Less, estreada no início deste mês no oitavo andar da Pollux — essa mesma, a loja de utensílios de cozinha. Castro e Silva, escrevi-o antes, possui tão boa mão para os salgados como para os doces, o que nem sempre é fácil de reunir num chef. É famosa a sua receita de bolo de chocolate, com mais de 20 anos, mas neste caso a consistência está mais próxima de uma mousse, não muito doce e que vai buscar a acidez à laranja em calda e ao sorvete.
Custa 5 euros.
Porque dias não são dias — mesmo no verão.
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