Crítica: Restaurante Ignácio de Paula Peliteiro, Braga

O novo posto de vigia é o Ignácio, em pleno Campo das Hortas, onde os clássicos locais estão e onde todos à vez acabam por ir conferir e comparar cardápios. Paula Peliteiro, do Sra. Peliteiro, fez o impensável e trouxe para a cidade dos arcebispos a liberdade dos oceanos.

De vez em quando faço o que todos fazem e roubo tempo ao tempo para satisfazer um capricho. Tenho a sorte de capricho e profissão se sobreporem exatamente e nada é sequer comparável a visitar quem está longe só porque sim. Estando um dia pelo Porto, fui bater ao ferrolho do Sra. Peliteiro, em Esposende, o restaurante estava calmo, conferi com a chef Paula Peliteiro e permiti-me a alegria da perspetiva de estar com a cozinheira de truz que vou acompanhando há algum tempo.

O polvo à Sra. Peliteiro animou parte da vontade, confesso, assim como o cenário da foz do Cávado e o mar logo ali. No final, quase a partir, a chef Paula dá-me conta da sua vontade de tomar conta do Inácio, um dos restaurantes clássico do Campo das Hortas, com quase 85 anos de funcionamento sem pausa. Quando voltámos a falar, estava já a terminar a intervenção no espaço do restaurante e nem três meses depois aconteceu a inauguração do Ignácio (a grafia rètro é intencional). Por detrás do sorriso e dos gestos ligeiros de Paula Peliteiro esconde-se uma vontade indómita de que toda a vida deu provas. E tem um exército indefetível junto a si chamado família, que se mobiliza sem precisar de ser chamado.

Eu estava à espera de ver uma espécie de transcrição da ementa do restaurante de Esposende, mas há mais. Procurei o bacalhau, diadema bracarense fiscalizado de perto por habitantes e passantes. Constam os bolinhos de bacalhau (9 euros, 6 unidades), puxam pela gula como lhes compete e vão-se em três tempos; pataniscas enroladas de bacalhau (6 euros, 4 unidades), abordagem de que se aprende a gostar, à segunda correu-me melhor que à primeira; lombos de bacalhau à lagareiro (16 euros), vezeiro mas aqui declinado à antiga, minimalista e centrado na qualidade do peixe regenerado com carinho, sem excessos nem desmazelos e sem confusão possível com o bacalhau do Ignácio (28 euros, 2 pessoas), esse sim, patrimonial e no espírito do bacalhau à Braga, posta copiosa, cebola e batatas fritas, texturas e processamento bem conseguidos. A chef é invulgarmente inteligente e sabe que para impor os seus bacalhaus na cidade onde o bacalhau tem reputação patriarcal tinha de acrescentar pela qualidade.

No capítulo entradeiro, gloriosas as papas de sarrabulho «da minha avó» (4 euros) – já avisei da importância da família – frescas e perfeitas as gambas no abacate (8,50 euros) e excecional o caldo verde com broa de milho (3 euros). Peixando, brilhante o tentáculo de polvo com batata recheada (18,50 euros), o bicho tem parceria com Paula Peliteiro e gosta do tratamento que lhe dá, viciante a caldeirada de bivalves com filete de dourada (16,50 euros), que na linha do bacalhau é contido nos temperos e rico na boca. Destaque ainda para a pescada à poveira (14 euros), arrepiada e processada de forma canónica, a chef Peliteiro estuda e ensaia em contínuo esse grande prato.

Nas graças carnívoras, é de ir ao domingo pelo cabrito em forno a lenha do Ignácio (18,50 euros), pelo menos uma vez provar o delicioso ossobuco de vitela (14,50 euros) e todos os dias conferir o pernil de porco fumado (32 euros, 2 pessoas).
Extensa e boa doçaria, começando pelo competente pudim abade de Priscos (5,50 euros) e terminando no celestial pão de ló Sra. Peliteiro. O mar que chegou a Braga é bem-vindo, vida longa é o que lhe desejamos.

Classificação (de 1 a 5)
O espaço: 4
O serviço: 4
A comida: 4,5

A refeição ideal
Bolinhos de bacalhau (9 euros, 6 unidades)
Gambas no abacate (8,50 euros)
Tentáculo de polvo com batata recheada (18,50 euros)
Arroz de pato com perna confitada (16,50 euros)
Cornucópias de doce de ovos (4 euros)

Algo está a fazer com que o sistema não consiga mostrar a ficha ténica desejada. Pedimos desculpa pelo incómodo.

 

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