Vagueira, a praia dos tesouros

Passadiços da Vagueira, entre as ondas e a ria. Fotografia: Maria João Gala /Global Imagens
De um lado está o mar; do outro, a ria. A localização é um trunfo da Vagueira. Mas é preciso ir lá experimentar os desportos náuticos, saborear os peixes e mariscos e, acima de tudo, conhecer as pessoas, para perceber por que lhe chamam “a melhor praia do mundo”.

“É o Entroncamento com os fenómenos e nós aqui com este campo magnético”, brinca João Real, aludindo à Praia da Vagueira, onde conduz os destinos do MARE – RESTAURANTE & GIN BAR com Maria Pedro. Este lugar da freguesia de Gafanha da Boa Hora, concelho de Vagos, tem crescido e atraído moradores, a sua vivacidade não se resume à estação quente. Por algum motivo lhe chamam “a melhor praia do mundo”.

A expressão, que deu origem a uma hashtag, foi popularizada por um grupo informal de jovens que passavam as férias de verão na Vagueira e acabaram por se fixar ali, atraídos pela qualidade de vida. São os vagueirudos, termo depreciativo a que deram a volta e ostentam com orgulho. João, Maria e o namorado desta, o tricampeão nacional de bodysurf Miguel Rocha (“Migas”), fazem parte do grupo, como outros que havemos de encontrar no caminho – todo percorrido a pé, que as distâncias são curtas.

A praia da Vagueira levou à criação de uma hashtag: “a melhor praia do mundo”.
Fotografia: Maria João Gala /Global Imagens

“Esta é a melhor praia do mundo pelas pessoas que cá estão”, defende João Real, enquanto dá a saborear as várias opções do MARE: piza da avó, tataki de atum, risoto de cogumelos, entrecôte de corte japonês… Parece haver de tudo neste restaurante em frente à praia, até carnes maturadas. No menu, as comidas surgem acompanhadas por sugestões de bebidas, e no bar há grande variedade de propostas, incluindo cocktails de aspeto cuidado, como tudo em volta. Nem falta uma parte de mercearia, que inclui produtos de marca própria (aMARE), como cerveja artesanal ou conserva de carapau da Vagueira – e vem aí um gin.

No MARE Restaurante & Gin Bar há vários cortes premium e maturados. Aqui, o entrecôte de corte japonês.
Fotografia: Maria João Gala / Global Imagens

João e Maria são ainda responsáveis por um segundo espaço, chamado HISTÓRIAS DA TERRA E DO MARE. Pequenos-almoços e lanches são o forte desta cafetaria, com esplanada protegida do vento, que procura oferecer alternativas, como bebidas vegetais e diferentes tipos de pão, e também vende gelados artesanais da marca Artiframi. Queijadinhas, cappuccinos com desenhos na espuma, taças de iogurte com granola e frutas, crepes e waffles integram a oferta da casa, que conta histórias de pessoas da Vagueira.

Gil era capitão de um bacalhoeiro e levava nas suas viagens muitos pescadores de arte xávega da Vagueira. Quando se reformou, venceu duas vezes seguidas o Totoloto.

Atualmente, a figura em destaque é o Capitão Gil, avô de Maria Pedro, assim batizada porque era desejo dele que o primeiro neto ou neta tivesse o nome de S. Pedro, padroeiro dos pescadores. Gil era capitão de um bacalhoeiro, e quase todos os pescadores da praia da Vagueira fizeram viagens com ele, quando não havia condições para a arte xávega (pesca artesanal), que ainda se mantém. Outra curiosidade é que, quando se reformou, ganhou duas vezes consecutivas o jackpot do Tototolo. Na cafetaria da neta há jogos da Santa Casa, mas já é sorte bastante conhecer tantos sabores e narrativas em poucos passos.

Mesmo ao lado fica a MARISQUEIRA DA VAGUEIRA, onde Isabel Oliveira foi construindo uma clientela sólida ao longo de 15 anos. A proprietária e cozinheira deste negócio de peixe fresco e marisco esteve na Venezuela e, quando voltou, abriu um primeiro restaurante, junto ao mar. “Eram outros tempos, não havia nada na Vagueira”, recorda, frisando que este já não é mero lugar de passagem, virou casa e local de trabalho para muitos, há quem coma ali diariamente.

Isabel Oliveira faz questão de que ninguém saia da Marisqueira da Vagueira com fome. Na imagem, o festival de marisco.
Fotografia: Maria João Gala / Global Imagens

“Tudo o que fazemos é caseiro”, garante Isabel, já com pataniscas, lulinhas e carapauzinhos da praia na mesa. A especialidade é o marisco, servido em doses generosas, com batata frita às ondas. Há ainda a caldeirada de enguias, típica da região, e sobremesas como natas do céu em telha de amêndoa ou o bolo da chef, folhado, com ovos-moles – feitos por ela, claro.

Surf, paddle e passadiços

O peixe, a arte xávega e as condições privilegiadas para a prática de surf são alguns dos atrativos da Praia da Vagueira, segundo Sara Caladé, vereadora da Câmara de Vagos com o pelouro do Turismo. Mas “o que de melhor temos”, assegura, “são as pessoas”.

Uma das mais inspiradoras será Miguel Rocha, ou Migas, que não tem deixado a esclerose múltipla afastá-lo do bodysurf nem tolher-lhe os sonhos (ler caixa). Ainda no verão passado abriu uma loja de surf com o amigo Zé Miguel Rocha – partilham a paixão pelas ondas e parte do nome. A STAY SALTY vende sobretudo material de surf, bodyboard e bodysurf: fatos, barbatanas, pranchas e outros acessórios, como mochilas impermeáveis ou relógios à prova de água, com informação sobre as marés.

As pranchas de madeira, além de serem mais sustentáveis, proporcionam um estilo de surf mais de diversão do que de espetáculo, diz Migas, tricampeão nacional de bodysurf que tem uma loja dedicada aos desportos de ondas.

Destacam-se as pranchas de madeira, feitas à mão, que permitem “outro estilo de surf, muito mais de diversão do que de manobras e espetáculo”, e são mais sustentáveis, pois duram “a vida toda”, explica Migas. Há ainda bonés, t-shirts e sweatshirts de marca própria e material de surf e bodyboard para alugar, neste ninho de desportistas em funcionamento o ano inteiro.

Outra loja que está longe de ser sazonal, na mesma avenida, é a SABORES SILVESTRES, onde Pedro Amaral vende conservas, vinhos e produtos regionais diferenciados, fruto de uma seleção muito própria. Tem ali cerca de 100 referências de vinhos, o mesmo para as compotas, de produtores com certificado artesanal, e ainda cervejas artesanais, azeites, biscoitos, mel, sal ou sabonetes. Pedro decidiu abrir esta casa de mercearia fina na Vagueira, há quase uma década, seduzido pela calma do lugar.

Sabores Silvestres, uma loja de mercearia fina que está longe de ser sazonal.
Fotografia: Maria João Gala / Global Imagens

Mesmo junto à praia, acessível e com Bandeira Azul, ergue-se o CASABLANCA LOUNGE BAR, branco, com apontamentos azuis, a acusar influência mediterrânica. A ementa inclui refeições leves (tábuas, tostas, bruschette, wraps) e uma variedade de bebidas (sumos, cervejas, sangrias, cocktails, gins, vinhos), tudo adornado com flores. O bar, que tem como lema “nós e o sol”, fica rente aos PASSADIÇOS DA VAGUEIRA, que se estendem até à vizinha Praia do Labrego e dão uma noção mais ampla da paisagem, feita de mar e ria.

Refeições leves diante das ondas – eis a proposta do Casablanca Lounge Bar.
Fotografia: Maria João Gala / Global Imagens

Entre a ria e o mar

“Vivemos rodeados de água salgada, como se estivéssemos numa pequena ilha”, diz Bruno Maria, responsável pela SECRET SURF SCHOOL, que aproveita os recursos naturais da Vagueira. De um lado está o mar, com boas condições para desportos de ondas; do outro, a ria de Aveiro, que permite fazer stand up paddle ou canoagem. Este professor de Educação Física que virou professor de surf também faz passeios de stand up paddle pelo Canal de Mira, um braço da ria, sob o olhar atento da cadela Roxy, enfeitada com um colar de búzios. Quem preferir ficar em terra encontra, junto à ria, uma via pedonal e ciclável, com pontos de descanso e pequenos areais aqui e ali.

Bruno Maria, responsável pela Secret Surf School, e a sua inseparável cadela Roxy.
Fotografia: Maria João Gala / Global Imagens

Passeio de stand up paddle no Canal de Mira da ria de Aveiro. Fotografia: Maria João Gala / Global Imagens

Bruno também gere uma casa de hóspedes, na Praia da Vagueira, à medida de apaixonados pelo surf, como ele. A SECRET GUEST HOUSE, de decoração simples, minimalista, guarda um pouco da sua história e da região. Na sala, decorada com imagens de salinas, moliceiros ou palheiros da Costa Nova, há recordações de viagens que fez para surfar. Dorme-se em camaratas ou quartos duplos, e o andar superior é para lazer: tem mesa de bilhar, jogos de tabuleiro e um terraço com vista para campos de milho, a ria e os passadiços junto à praia. “Quando falamos da Vagueira, é sempre a melhor praia do Mundo”, atira. Já não é segredo.

Terraço da Secret Guest House.
Fotografia: Maria João Gala / Global Imagens

Miguel Rocha (“Migas”): bodysurf com o tricampeão nacional

Miguel Rocha, conhecido como Migas, é tricampeão nacional de bodysurf, que descreve como “a maneira mais pura de surfar”. “Não vais em cima de uma prancha, usas mais o corpo e a força do mar”, explica ele, que já o fazia sem saber, aos 3 anos, às cavalitas do pai. Quando percebeu que aquilo a que chamavam “boleias” era um desporto, começou a ver vídeos de campeões internacionais e a treinar.

“Entras e há sempre uma onda que vale a pena. Nunca saí do mar triste”, garante Migas, que foi diagnosticado com esclerose múltipla no início de 2016, mas não desistiu do bodysurf – pelo contrário, ainda lhe deu mais força para continuar.

O tricampeão nacional de bodysurf em ação.
Fotografia: Maria João Gala / Global Imagens

Migas garante que o desporto o ajuda, até o simples ato de ir à água mandar um mergulho. “Acho que é o sal e o sol. Andas uns dias sem ir ao mar e começas a ficar insosso”, comenta, a rir. Também dá aulas de bodysurf a crianças e adultos, na Praia da Vagueira. O primeiro aluno foi o sobrinho Tiago Mesquita, de 14 anos, que se tornou no primeiro campeão nacional júnior.

Tel.: 965576394
Aula de duas horas, 15 euros; dez aulas, 100 euros (material incluído). Maiores de 4 anos.

 

Mercado pequeno, mas bem recheado

“É pequeno, mas tem muita qualidade e variedade”, diz Maria Benilde Martins, sobre o MERCADO DO PEIXE, na Praia da Vagueira, onde vende há 33 anos.

Maria Benilde Martins no Mercado do Peixe.
Fotografia: Maria João Gala / Global Imagens

Nas bancas encontra-se choco, lula, besugo, cantaril, robalo, sargo, dourada, choupa, polvo e outros habitantes do mar, mas o que tem mais saída é o carapau, incluindo os jaquinzinhos, conta a peixeira. Até há quem, sendo de fora, faça questão de ir àquele edifício castiço abastecer-se de peixe fresco.

Largo Parracho Branco, Vagueira, Gafanha da Boa Hora, Vagos
Das 08h às 19h. Encerra à segunda.

Algo está a fazer com que o sistema não consiga mostrar a ficha ténica desejada. Pedimos desculpa pelo incómodo.

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