Crítica de Fernando Melo: Canalha, em Lisboa

(Fotografia: DR)
Paixão pelo bom produto, primor na confeção e minimalismo na síntese e apresentação de cada prato são atributos centrais no desempenho do chef João Rodrigues ao longo do seu notável percurso profissional. Abriu o Canalha na Rua da Junqueira, em Lisboa, numa abordagem de proximidade e disponibilidade que tem encontrado eco nos amantes da boa mesa.

Entra-se e fica-se logo com os olhos postos nos bancos altos ao balcão e nas mesas alinhadas ao longo da sala, evocativos da restauração lisboeta de outrora. Tempos em que casas como esta serviam para conviver, debater, conspirar e ocasionalmente comer. Procuro o chef João Rodrigues num varrimento rápido e lá está ele, em conversa informal com clientes e ao mesmo tempo a dar orientações ao seu pessoal. Acena-me com a mão e rapidamente sou conduzido à minha mesa.

O melhor do dia está em exposição logo à entrada, peixes, carnes, mariscos em jeito de preciosidades, todas apetecíveis. Vislumbra-se a cozinha em coreografia apressada e silenciosa. O chef é líder exigente e seguro, trouxe do Feitoria a chef Lívia Orofino, oficiaram aí juntos quatro anos e no Canalha continua a ser o seu braço direito. A sala é governada por Nuno Elvas e conta com os oficiantes Hugo Alvarez e Susana Varela na execução do serviço, na que é uma das mais eficazes brigadas da capital.

Os pastéis de bacalhau do Canalha. (Fotografias: DR)

O linguado chega à mesa pelas mãos do chef João Rodrigues.

Fisgámos um linguado brilhante na montra da entrada, e fixou-se assim o ponto de chegada da empreitada. Como começámos? Com dois magníficos pastéis de bacalhau (3,20 euros), massa intensa no sabor, correta na composição, fritura irrepreensível. Seguiu-se um exótico tiradito de atum rabilho (24 euros), suave e requintada evanescência peruana ao nível do melhor sashimi. Quando há, o berbigão (80 euros/kg) é para mim etapa fundamental e veio uma travessinha processada à Bulhão Pato de forma canónica, na próxima terá de ser mesmo cozido natural, que quando é deste gabarito merece bem. De resto, era o que tinha sido pedido. O berbigão é o meu bivalve favorito para o debulhe, há que dizê-lo e assumi-lo, espécie de fraqueza a que sucumbo de imediato. É, além disso, um marisco de gosto de inequívoca matriz popular, não se entende por que não é mais vezeiro na rede restaurativa.

As molejas de borrego, um dos petiscos do novo restaurante.

O peixe-rei frito.

Outro petisco tão delicioso quanto exigente que também estava no escaparate e não escapou é o peixe-rei (41 euros/kg). Isco infalível na pescaria, é cheiroso e sápido e sujeito à fritura cuidadosa é de ir às lágrimas. E foi exatamente o que aconteceu. Polme e fritura perfeitos, o génio de João Rodrigues elevou a simplicidade aos píncaros do sabor como só ele sabe fazer. As molejas de borrego grelhadas (9,20 euros), fresquíssimas e sacrificadas de forma exemplar, foram o ponto culminante da sequência selecionada de petiscos. Entregámo-nos então ao linguado (92 euros/kg) que havíamos escolhido, processado e servido na nossa mesa pelo chef Rodrigues. Está-se bem no Canalha.

O berbigão à Bulhão Pato.

Classificação:

O espaço: 4,5/5

O serviço: 5/5

A comida: 5/5

A refeição ideal:

Presunto Maldonado bolota 30g (13,10 euros); queijo de cabra fresco (2,80 euros); pastéis de bacalhau 2 unidades (3,20 euros); tortilha aberta de camarão e cebola (17,90 euros); tiradito de atum rabilho (24 euros); bitoque do lombo (16 euros); leite-creme (4 euros).

Canalha. Rua da Junqueira, 207-A, Lisboa. Tel. 962 152 742. Das 12h às 15h e das 19h às 23h. Fecha ao domingo e segunda. Preço médio: 22 euros




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