Crítica de Fernando Melo: dez vinhos para comemorar o Dia do Pai

Conheça as sugestões vínicas de Fernando Melo, para oferecer no Dia do Pai. (Fotografia: Monstera Production/Pexels)
É um dia especial o que celebra o amor incondicional de um pai em relação aos filhos, respondendo estes com o inefável afeto de que são capazes. Não há contabilidade alguma a fazer e está sempre tudo bem. Queremos que não falte a inspiração a ninguém, basta escolher o pai para o filho encontrar o vinho certo.

Uma garrafa de vinho está ao alcance da mais parca semanada e só a falta de inspiração justifica o esmorecimento. Como é apanágio da Evasões, estabelecemos dez tipos de pai para que cada filho possa identificar facilmente o seu e para cada um, uma proposta de presente vínico. O pai novidade aprecia o inédito. O pai mesa adora estar rodeado de gente por várias horas, sem perspetivas de acabar. O pai clássico prefere o que conhece desde a juventude e sente-se confortável com uma certa evocação do passado. O pai cabernet delicia-se com a evocação de pimento verde característica da casta Cabernet Sauvignon e isso distingue-o de todos os outros. O pai macio quer vinhos aveludados e ao mesmo tempo sofisticados, e renuncia aos vinhos de arestas e taninos demasiado vincados. O pai elegante preza sobretudo os vinhos finos e requintados, para poder ligar com iguarias igualmente elegantes. O pai mineral procura acidez fixa para casar com pratos mais desafiantes e eventualmente ricos em proteínas e gorduras. O pai queijo vê no vinho a assessoria correta do queijo. O pai legado gosta que o vinho conte uma história familiar ou profissional. O pai intemporal tem fixação nos valores vínicos de sempre e tem pouco respeito pela novidade só por si.

Pai novidade
Morgado do Quintão Vinhas Velhas Algarve branco 2022 (12%)| Morgado do Quintão 25 euros
Pontuação*: 17,5
Uvas provenientes de vinha velha com mais de 50 anos da casta Crato (Roupeiro). Cachos inteiros levados a prensa pneumática, hiper-oxidação do mosto. Fermentações alcoólica e malolática e estágio de seis meses 50% em inox, 50% em barricas usadas. Boa moção, a que animou esta casa a dedicar-se com afinco a esta casta revitalizando-a – nunca a Roupeiro conheceu tanta nobreza. Aromas de vagens de favas, flores brancas e melão verde. Boca de evocação salina, a que se junta citrino acentuado e pimenta branca. Recomendado para o debulhe manual de um belo berbigão aberto a vapor, aguentando bem uma cataplana de polvo com batata doce. Se nunca experimentou, prove-o com gelado de caramelo.

 

Pai mesa
Herdade do Sobroso Élevage Alentejo tinto 2022 (14%) | Herdade do Sobroso 90 euros
Pontuação*: 18
Estreme de Alicante Bouschet, proveniente de parcelas xisto-argilosas expostas a sul. Fermentação em lagar, estágio de 12 meses em ânforas. Enologia brilhante, a proporcionar prova a um tempo frutada e terrosa. Evocação de trufas no final, após longa e vagarosa sequência de amoras, ameixa preta e alcaçuz. Conjunto a mostrar excelente frescura e aptidão para a mesa sofisticada. Vai deliciar o pai que aprecia uma boa perdiz estufada ou um assado longo, como perna de borrego no forno com especiarias. E não enjeita a companhia de presunto finamente cortado se a toada for petisqueira, sobretudo se orlada por queijo, frutos secos e tostas de pão alentejano. É vinho para umas horas à mesa, em boa companhia.

 

Pai clássico
Herdade do Rocim Clay Aged Alentejo branco 2022 (12%)| Rocim 42 euros
Pontuação*: 17
O respeito pelo terroir valor pauta a totalidade da história da herdade desde a sua fundação. A preocupação com a integração no ecossistema da propriedade no Baixo Alentejo, entre Cuba e Vidigueira, não impede contudo de explorar castas e sistemas de condução das vinhas inovadores, visando resultados eficazes. Está em causa o futuro, face às prementes alterações climáticas. Este vinho configura por isso a contemporização da técnica clássica da talha com as castas Verdelho, Viosinho e Alvarinho. Uvas pisadas a pé em lagares de pedra juntamente com os engaços, utilização apenas de leveduras indígenas. Estágio de 12 meses em talhas de barro de 140 litros. Resultado exuberante a revelar incrível e bem-vinda frescura.

 

Pai cabernet
Scala Coeli Reserva Alentejo tinto 2019 (14,5%) | Fundação Eugénio de Almeida 120 euros
Pontuação*: 19
A marca Scala Coeli é normalmente utilizada em vinhos varietais produzidos a partir de castas menos tradicionais do Alentejo e este Cabernet Sauvignon não é exceção. Maceração pré-fermentativa a frio, fermentação alcoólica com maceração prolongada. Após malolática, estágio de 15 meses em barricas novas de carvalho francês e 24 meses em garrafa. A pirasina e usual tipicidade da casta estão presentes mas sem excessos, permitindo a fruição que se espera de um grande tinto alentejano. O pai amante de Cabernet Sauvignon vai adorar este presente, que brilhará com um vigoroso ensopado de borrego e algum picante. Também vai revelar-se genial parceiro de sarapatel, do magnífico receituário indo-português.

 

Pai macio
Tapada de Coelheiros Vinha da Sobreira Alentejo tinto 2020 (14%) | Tapada de Coelheiros 45 euros
Pontuação*: 18
Vinha de encosta plantada em 2001, estreme da casta Syrah, a quase 300 metros de altitude. Solo pobre em matéria orgânica. Em 2017 foi convertida para agricultura biológica e em 2020 para biodinâmica. Maceração pré-fermentativa de três dias, seguindo-se a fermentação alcoólica e depois a malolática. Trasfega para tonel de 18 hectolitros, onde permaneceu por 18 meses. Estágio de 18 meses em garrafa. Fruta negra de caroço cozida marca o primeiro contacto olfativo, a que se junta ligeiro balsâmico e evocações de azeitona preta. Boca fresca e especiada, terminando longo e floral, sempre em elegância. Taninos bem domados. Vai bem com gratinados de forno de peixe ou de carne.

 

Pai elegante
Pedra Cancela Vinha da Fidalga Monvedro tinto 2022 Dão tinto (12%) | Lusovini 34 euros
Pontuação*: 17,5
A Vinha da Fidalga fica em Carregal do Sal e tem sido palco de experimentação e recuperação de castas únicas do Dão. Este vinho estreme da casta Monvedro não teve qualquer contacto com madeira, as fermentações alcoólica e malolática ocorreram em inox. Remontagens suaves duas vezes por dia. Estágio de quatro meses em garrafa. Aromas de ameixa preta madura e figos frescos. Impressiona pela elegância e equilíbrio na boca, conseguindo corte total de proteínas e gorduras. O grupo de amargos que tem liga bem com uma certa copiosidade, por isso é fácil recordarmo-nos dele em situações de harmonização mais complexas. Pato assado com laranja é ligação feliz.

 

Pai mineral
Giz Baga Vinhas Velhas Bairrada tinto 2020 (13,5%) | Luís Gomes 25 euros
Pontuação*: 19
A casta Baga em todo o seu esplendor. Solos pobres de natureza calcária, vinha centenária, localização excelente, combinação feliz de fatores como exposição solar e drenagem no bom ponto. Aromas de pedra molhada, bagas de arbusto e vagem de ervilha. Boca equilibrada, notas lácteas e terrosas mas sobretudo de ameixa preta madura. Conjunto fresco, pronto para satisfazer bem o pai que gosta de encontrar no vinho mais mineral que frutados primários. Irão harmonizar muito bem com este vinho pratos de tacho de base de tomate, assim como pratos de arroz de gosto marisqueiro, como arroz de lingueirão à algarvia, ou mesmo caldeirada de raia. Funciona também muito bem com doçaria à base de chocolate negro.

 

Pai queijo
Quinta dos Monteirinhos Avô António Encruzado Dão branco 2021 (13%) | Quinta dos Monteirinhos 19 euros
Pontuação*: 18
Vinho de homenagem a um homem que foi pioneiro do cooperativismo agrícola no Dão. A descendência continua a honrar a sua memória dedicando-lhe este estreme de Encruzado, uma das castas mais notáveis de Portugal. O queijo Serra da Estrela harmoniza com extrema bondade os vinhos brancos que a partir dela se fazem e este é um exemplo particularmente feliz. Vinho e comida desmaiam nos braços um do outro, sem vencedor nem vencido. Fermentação em inox. Estágio de nove meses em barricas de carvalho francês. Aromas ainda velados de cravinho, jasmim e gengibre, boca muito equilibrada, a sugerir flores brancas e polpa de ameixa branca. Vai muito bem com queijos de ovelha de pasta mole.

 

Pai legado
Quinta da Lagoalva Dona Isabel Juliana Grande Reserva Tejo tinto 2021 (13,5%) | Quinta da Lagoalva 35,90 euros
Pontuação*: 18,5
Vai na quinta edição este tinto especialíssimo do Tejo, composto por Alfrocheiro (40%), Touriga Franca (40%) e Touriga Nacional (20%). Tem o nome de uma mulher incontornável da história familiar desta grande casa. Fermentação alcoólica em lagares inox, malolática em barricas novas e de segundo ano de carvalho francês, aí permanecendo 14 meses. Enologia cuidada produziu este néctar que desafia a lei do tempo, feito a pensar num futuro de décadas que é fácil prever-lhe. Aromas de caruma verde e frutos de arbusto, boca a revelar taninos muito finos, conjunto de enorme frescura, pronto para a posteridade. Excelente parceiro para galinhola estufada com trufas pretas e para pato assado com laranja.

 

Pai intemporal
Quinta do Perdigão Reserva Dão tinto 2013 (13%) | Quinta do Perdigão 29 euros
Pontuação*: 18
Vinho notável, de incrível juventude. Composição das castas Touriga Nacional (50%), Jaen (20%), Tinta Roriz (20%) e Alfrocheiro (10%), continua vibrante como no início. Nariz cítrico e floral, boca copiosa mas focada, a revelar taninos firmes e bem domados. Não se lhe nota qualquer sinal de fadiga, e é francamente flexível no encontro com comida. Reage bem a linguado gratinado com espinafres, prato menos funcional com vinhos mais novos. Adora a companhia de uma boa posta mirandesa assada. Brilha com bacalhau à Gomes de Sá. E agiganta-se perante um queijo de ovelha velho. Apressamo-nos para o inteiramente novo, mas há glória em cada trago quando temos o privilégio de provar uma pérola assim.




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