Paredes de Coura, paraíso todo o ano

A paisagem protegida de Corno de Bico tem grandes manchas de carvalhal. Fotografia: Rui Manuel Fonseca / Global Imagens
O festival de música homónimo valeu a Paredes de Coura o título de “Couraíso”. Muitos a gravaram no seu mapa veranil. Mas esta terra tem mais encantos, para lá da vila e da praia fluvial do Taboão: há um santuário animal onde dormir, uma paisagem protegida para conhecer a pé e várias marcas da história, tudo emoldurado pelo verde vivo da floresta e dos campos.

A primeira imagem que temos da QUINTA DAS ÁGUIAS, quando o portão se abre, é de Ivone Ingen Housz acompanhada pelo carneiro Zacarias, que a segue como um cão. É um dos mais de 130 animais que habitam esta área com cerca de cinco hectares, todos resgatados do sofrimento ou salvos da panela. Zacarias, por exemplo, tinha mês e meio quando chegou, muito fraco, “com três patinhas para o lado de lá”, após sair numa rifa.

Depois há o cão Robin, que viveu anos acorrentado junto a um rio, sem abrigo, e desenvolveu otites crónicas que o deixaram surdo; o cavalo Artax, que veio do mundo da competição e só saía da box para os treinos, “com dor”; ou os porquinhos-da-Índia, uns usados para experimentação, outros descobertos no lixo. Entre os residentes contam-se ainda gatos, tartarugas, porcas, pavões, galinhas, gansos e mais, cada um com a sua história.

Na Quinta das Águias, animais de diferentes espécies convivem harmoniosamente.
Fotografia: Rui Manuel Fonseca / Global Imagens

Ivone Ingen Housz com os cavalos Artax e Silver.
Fotografia: Rui Manuel Fonseca / Global Imagens

A Quinta das Águias, de Ivone e do marido Joep Ingen Housz, tem como bandeira o respeito por todas as formas de vida. Nem uma formiga se mata, neste santuário para flora selvagem e animais em dificuldades, que é também uma organização sem fins lucrativos, uma quinta biológica, um projeto educativo focado na sustentabilidade, uma “arca botânica” para preservação de sementes, um centro de promoção da cozinha 100% vegetariana e um destino de férias ou fim de semana. Basta escolher entre a Casa do Pavão, um loft, e a Casa de Hóspedes, um T3 cedido inteiro ou por quarto.

A Casa do Pavão pede uma estadia mínima de duas noites.
Fotografia: Rui Manuel Fonseca / Global Imagens

De resto, qualquer pessoa pode fazer uma visita guiada à propriedade, com direito a chá de ervas colhidas por Ivone e muffins veganos confecionados por Joep. Tantos foram os pedidos de receitas, que o casal lançou um livro (ler caixa). A paixão de Joep pela cozinha é antiga, só que antes ele vivia absorvido pelo trabalho como engenheiro informático. Já Ivone dava consultas de psicologia. Conheceram-se em França, fixaram-se no Porto, mas escolheram viver em harmonia com a natureza no Minho, onde estão as raízes dela (as dele são holandesas). E hoje dizem-se padrinhos do vegetarianismo em Paredes de Coura.

Ivone e Joep foram dos que mais incentivaram Laurentino Alves, produtor de enchidos tradicionais, a criar um enchido vegetariano, em 2015. Ele respondeu ao desafio com uma alheira vegetariana de receita própria, envolvendo cogumelos Shiitake, pimentos e azeitonas. E teve tanto êxito que ela passou a dominar, quase por completo, as encomendas. Assim nasceu a marca AGRAMONTE VEGAN, que ditou o investimento numa nova unidade de produção. Às alheiras produzidas por si e pela mulher, com ou sem glúten, somaram-se entretanto os hambúrgueres de grão e de feijão, que podem ser adquiridos na origem – basta telefonar.

Laurentino Alves e as suas alheiras vegetarianas
Fotografia: Rui Manuel Fonseca / Global Imagens

Além de se dedicar àquele negócio familiar, Laurentino Alves é guarda prisional, presidente da União das Freguesias de Cossourado e Linhares e membro da associação A Cividade, que todos os anos celebra o solstício de verão no POVOADO FORTIFICADO DE COSSOURADO, testemunho de tempos proto-históricos.

No Povoado Fortificado de Cossourado celebra-se o solstício de verão no próximo dia 20 de junho.
Fotografia: Rui Manuel Fonseca / Global Imagens

Naquela área, que terá estado ocupada entre os séculos V e II antes de Cristo, são visíveis estruturas habitacionais e de reunião comunitária. Duas foram reconstituídas e costumam servir de apoio à festa, que engloba fogo, malabares, música, dança, comida e bebida, e decorre no sábado mais próximo do solstício – desta feita, 20 de junho. “Há anos em que se está aqui até ao nascer do sol”, comenta Laurentino, enquanto aponta Valença, Cerveira ou Espanha – este sítio elevado deixa ver tudo em volta.

De lá de cima tem-se uma vista ampla, que alcança até Espanha.
Fotografia: Rui Manuel Fonseca / Global Imagens

Trutas e uma colónia agrícola

Décio Guerreiro e Cristiana Gonçalves, tio e sobrinha, são os responsáveis pela CASA DO XISTO, onde se pode apanhar trutas para comer ali ou levar. Este parque de pesca foi o primeiro do país a ser licenciado, ainda nem existia o restaurante, que cativa sobretudo pelas trutinhas fritas com molho de escabeche e pelo javali à Xisto, com batatas e legumes.

No parque de pesca da Casa do Xisto, só se paga se as trutas vierem à linha.
Fotografia: Rui Manuel Fonseca / Global Imagens

Muito característicos são também o arroz das matanças com costelinhas de javali ou o estrolho, um prato minhoto, feito com carne de porco e milho partido, disponível por encomenda. Tudo para acompanhar com vinho verde tinto em malga, na esplanada ou numa das salas, cuja decoração acentua o caráter local: tanto há fotografias antigas de um campo florido de batatas, na Serra da Boalhosa, como de porcos bísaros ali criados.

O ambiente bucólico mantém-se no caminho até à antiga COLÓNIA AGRÍCOLA DE CHÃ DE LAMAS, em Vascões, criada pelo Estado Novo no seio da política de reestruturação agrária levada a cabo pela Junta de Colonização Interna para tornar cultiváveis largas áreas de terreno baldio. O projeto arquitetónico previa equipamentos, zona de habitação e uma parte social e de lazer, enquadra o vice-presidente da Câmara Municipal, Tiago Cunha. Havia 15 habitações geminadas, com capacidade para 30 famílias, escola primária, residência do professor e forno comunitário; a capela e o posto médico ficaram por construir.

O CEIA tem uma exposição sobre a antiga colónia agrícola, que assume a forma de uma concha, vista de cima.
Fotografia: Rui Manuel Fonseca / Global Imagens

Os primeiros colonos chegaram em 1957. Recebiam casas mobiladas, alfaias agrícolas, juntas de gado, um empréstimo de 10 mil escudos, sementes e adubos; e ficavam obrigados a entregar ao Estado um sexto do valor das colheitas. Na aldeia, há uma habitação praticamente inalterada, tanto que conserva, no piso térreo, o palheiro para guardar cereais e a manjedoura dos animais. Foi atribuída a familiares de Paulo Oliveira, de 40 anos, que se apresenta: “Devo ser o último colono que nasceu aqui”. “Isto era uma alegria. Escola primária à beira de casa… Não é que eu gostasse muito de ir”, graceja. E remata: “Era uma colónia de trabalho, e duro”.

Paulo Oliveira diz-se o último colono nascido ali; a casa outrora atribuída a familiares está praticamente inalterada.
Fotografia: Rui Manuel Fonseca / Global Imagens

Vista de cima, a ex-colónia agrícola assume a forma de uma concha, e na parte mais estreita fica o CENTRO DE EDUCAÇÃO E INTERPRETAÇÃO AMBIENTAL DO CORNO DE BICO (CEIA), que tem uma exposição permanente sobre o passado do lugar. A sua estrutura abrange a velha escola primária, que virou refeitório, e a casa do professor, agora centro de acolhimento.

Mas o CEIA é, sobretudo, uma porta de entrada para a PAISAGEM PROTEGIDA DO CORNO DE BICO, uma pequena reserva natural de fauna e flora. Tem zonas dedicadas à investigação e divulgação dos recursos naturais dessa área rica em biodiversidade, com densas manchas de carvalhais, bosques ripícolas junto a cursos de água, garranos à solta e ainda animais como o lobo, a lontra, o lagarto-de-água ou a águia-real.

A paisagem protegida do Corno de Bico, atravessada por trilhos pedestres, tem belos carvalhais.
Fotografia: Rui Manuel Fonseca / Global Imagens

Natureza com pessoas dentro

A Paisagem Protegida, numa região essencialmente montanhosa, prima pela beleza natural, com visível mão humana: dela fazem parte também os campos agrícolas de um verde elétrico quebrado pelas cores dos rebanhos, aldeias e lugares. Uma forma de a conhecer diretamente e sem pressa é seguir o TRILHO CORNO DE BICO. Este percurso pedestre de 7,5 quilómetros, que começa e acaba no lugar de Túmio, passa por lugarejos tradicionais que espelham a cultura minhota e, claro, pelo Corno de Bico, um miradouro natural com um marco geodésico à cota de 883 metros (a máxima atingida).

A paisagem protegida combina natureza e mão humana. Fotografia: Rui Manuel Fonseca/Global Imagens

Já no limite da paisagem protegida fica o RESTAURANTE LINO, que reabriu em maio, a cargo de Patrícia Cunha e Ivo Silva. Nesta segunda vida, a aposta faz-se nas carnes autóctones, de animais próprios, conta ela, explicando que o sogro, Lino, é que abriu a casa, há mais de duas décadas, até que se reformou, pondo fim ao negócio. Ora, a dupla decidiu reativá-la, aproveitando para mudar o espaço e a ementa.

A generosa posta de carne minhota com batata a murro e legumes.
Fotografia: Rui Manuel Fonseca / Global Imagens

Além da posta de carne minhota, o prato com mais saída, há picanha, sarrabulho e cozido ao domingo, “tudo com carnes nossas”, sublinha Patrícia. A generosidade nas porções é ponto assente, até porque “a primeira coisa que come são os olhos”. Confirma-se que a vista sai de Paredes de Coura saciada, transbordando imagens de um verde vivo e muito tranquilo, entrecortado por linhas de água. Não restam dúvidas: é “Couraíso” em todas as estações.

Receitas da quinta em livro

Ivone e Joep Ingen Housz, responsáveis pela Quinta das Águias, assinam o livro “Semear o futuro”, em que partilham a história do lugar e dezenas de receitas 100% vegetarianas. Algumas delas podem ser saboreadas pelos hóspedes: por marcação, Joep prepara um jantar de três pratos feitos, de raiz, com ingredientes da quinta, que tem horta biológica. A obra, que custa 19,99 euros, foi editada em outubro passado e tem segunda edição a caminho; a refeição in loco vale 15 euros por pessoa.

Trilho do Sistema Solar

Outro percurso que atravessa a Paisagem Protegida do Corno de Bico é o Trilho do Sistema Solar, que constitui um modelo à escala 1 : 831 000 000 nas distâncias e dimensões dos principais astros do Sistema Solar. O Sol fica no Centro de Educação e Interpretação Ambiental do Corno de Bico (CEIA) e os planetas distribuem-se, à escala, por um trajeto de 8,6 quilómetros, devidamente sinalizado. O projeto nasceu no âmbito das atividades do campo de férias científico AstroCamp, que tem decorrido no CEIA e é coordenado pelo astrofísico Carlos Martins.

A paisagem protegida do Corno de Bico. Fotografia: Rui Manuel Fonseca / Global Imagens

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Morada
Caminho de Moreira, 664, Rubiães, Paredes de Coura


GPS
Latitude : 41.895047
Longitude : -8.615666
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Morada
Casa do Xisto, Boalhosa-Insalde, Paredes de Coura
Telefone
939334565
Custo
(€) Preço médio: 18 euros. Pesca: trutas para levar, 10 euros/kg; para comer ali, 20 euros/kg.
Horário
Sábado e domingo, das 08h às 21h; restantes dias, por marcação (até junho).


GPS
Latitude : 41.9593677
Longitude : -8.509967299999971
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Morada
Coqueira, Castanheira, Paredes de Coura
Telefone
251782069
Custo
(€€) Preço médio: 25 euros
Horário
Das 09h às 24h. Encerra ao sábado.


GPS
Latitude : 41.8806075
Longitude : -8.5577921
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Morada
Cossourado, Paredes de Coura
Telefone
966526693


GPS
Latitude : 41.9197754
Longitude : -8.6353224
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Morada
Chã de Lamas, Vascões, Paredes de Coura
Telefone
251780126


GPS
Latitude : 41.9130327
Longitude : -8.4927887
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