Sesimbra tem pegadas de dinossauro que inspiraram um filme de Steven Spielberg

A Pedra da Mua, ao fundo, é um dos locais com pegadas de dinossauros em Sesimbra. (Fotografia de Orlando Almeida/GI)
Há 140 milhões de anos, o promontório do Cabo Espichel, em Sesimbra, era um imenso pântano por onde andavam dinossauros. As pegadas ficaram para sempre gravadas na rocha e consta que até foram inspiração para uma cena do filme Jurassic Park, de Steven Spielberg. Conheça a história das muito estudadas, mas pouco conhecidas, jazidas de icnofósseis de Sesimbra, o pretexto ideal para um passeio em família.

Reza a lenda de Nossa Senhora da Pedra da Mua que dois peregrinos avistaram uma luz, durante várias noites, sobre o planalto do Cabo Espichel. Certa noite, já no local, terão visto Nossa Senhora ser transportada do mar até ao topo da arriba em cima de uma mula gigante, cujas pegadas ficaram gravadas numa laje do promontório. Esta lenda, que versa sobre a aparição de Nossa Senhora do Cabo Espichel, motivou a construção da branca e frágil Ermida da Memória, forrada por dentro a painéis de azulejos que retratam o referido episódio e são considerados “a primeira gravura de trilhos de dinossauros”, segundo o município. A ermida tornou-se local de peregrinação durante séculos, e de forma a acolher as cerimónias religiosas cada vez maiores, no século XVIII foram construídos a igreja, duas alas de hospedarias, a Mãe de Água e a Casa da Ópera que correspondem ao que se conhece como Santuário do Cabo Espichel.

“Durante décadas, os religiosos acharam que as pegadas eram da mula gigante”, conta Fernanda Chagas, guia da Sesimbra Safari, um dos operadores turísticos com que fazem passeios pelo Cabo Espichel. Mas quando a comunidade científica portuguesa tomou conhecimento das pegadas, na década de 1970, percebeu-se que não eram, afinal, de nenhuma mula gigante, antes icnofósseis de dinossauros – vestígios da passagem dos animais naquele local que, há pelo menos 140 milhões de anos, era uma “zona plana e pantanosa”. Assim foi descoberta a jazida de icnofósseis da Pedra da Mua, cujo nome se deve à forma como mula era escrita no português antigo: “mua”. Depois de o paleontólogo Miguel Telles Antunes ter publicado um estudo sobre o local, em 1976, a jazida foi considerada um monumento natural, em 1997. No país só existem sete, e três deles encontram-se no concelho de Sesimbra.

 

Jazida de Icnofósseis da Pedra da Mua

“Esta é considerada uma das zonas mais ricas em vestígios, pelas circunstâncias de termos pegadas da época jurássica (145 milhões de anos) e cretácica (120 milhões de anos) na mesma laje e de termos dinossauros saurópodes e terópodes”, contextualiza Fernanda. E o que se vê na laje escura da Pedra da Mua é um trilho de 10 pegadas (sete de dinossauros pequenos e três de dinossauros grandes), que ajudam a imaginar uma manada de dinossauros a passar por ali. “As sete pistas que identificámos são de animais saurópodes quadrúpedes (de pescoço e cauda compridos), herbívoros”. Segundo o município de Sesimbra, estes vestígios terão atraído “a atenção dos consultores científicos de Steven Spielberg” e inspirado uma das cenas iniciais do filme Jurassic Park, de 1993, em que se vê braquiossauros andar em manada [vídeo abaixo] e a personagem do palentólogo Alan Grant exclama “Eles andam mesmo em manada!”.

Munida de um dinossauro em boneco, a guia da Sesimbra Safaris ajuda a perceber melhor a forma como os dinossauros terão passado por ali. “As pegadas originam-se com a pressão do animal no terreno pantanoso. Com a sedimentação de areias e sedimentos [ao longo de milhares de anos] foram tapadas, e quando se deu o choque das placas tectónicas [entre os períodos Jurássico e Cretácico], ocorreu a separação, por isso é que as vemos nas lajes com esta inclinação”, explica. As pistas paralelas de pegadas foram “consideradas a primeira evidência de comportamento gregário entre saurópodes reconhecida na Europa”, lê-se relativamente ao Monumento Natural da Pedra da Mua no website do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas.

Um dos trilhos que se avistam na Pedra da Mua. (Fotografia de Orlando Almeida/GI)

Para discernir as pegadas a olho nu, à distância, é preciso saber de onde olhar e olhar com atenção, tirando partido da luz. A melhor altura do dia, constam os guias Amândio Costa e Fernanda Chagas, é a partir das 10h e até à hora de almoço. Para ajudar a localizar as pegadas e a compreender melhor o comportamento dos dinossauros, existem painéis informativos no local. A Sesimbra Safari tem tours em jipes Land Rover e a pé com passagem pelas jazidas de icnofósseis do Cabo Espichel, mas qualquer pessoa pode fazer o percurso pelos locais próximos das pegadas, que está sinalizado e dista quatro quilómetros circulares. Nele, passa-se também pela jazida de icnofósseis dos Lagosteiros, na praia com o mesmo nome.

 

Jazida de Icnofósseis dos Lagosteiros

Considerada também Monumento Natural, foi formada no Cretácico, há pelo menos 130 milhões de anos. À época, os terrenos eram planos e alagadiços, e depois transformaram-se em rocha calcária, acolhendo e preservando os trilhos de pegadas de dinossauros. Observando de um ponto alto (e ainda que a vegetação tenha crescido bastante ultimamente) as pegadas são visíveis na pedra calcária castanho-amarelado e correspondem a animais bípedes – um carnívoro e um herbívoro – que passaram ali em diferentes direções. Com cautela, pode-se inclusive descer a pé sobre a falésia e sentir de perto as marcas gravadas pelos dinossauros, eles que foram o maior animal de sempre a pisar a superfície da Terra.

Jazida de Icnofósseis da Pedreira do Avelino

O terceiro Monumento Natural do concelho de Sesimbra encontra-se no Zambujal e dá pelo nome de Jazida de Icnofósseis da Pedreira do Avelino. Foi identificado na década de 1980 e preserva 108 pegadas distribuídas por cinco pistas de diversos herbívoros quadrúpedes (de cauda longa e pescoço comprido), que deixaram pegadas no fundo lamacento da margem de uma laguna litoral há cerca de 155 milhões de anos. Este centro interpretativo, dotado de passadiços de madeira e painéis informativos ao ar livre, pode ser visitado informalmente todos os dias e de forma gratuita.

Em Portugal existem vários locais com pegadas de dinossauros. Perto de Fátima, na Serra de Aire, há um trilho de pegadas que é o maior (tem mais de mil icnofósseis) e mais antigo do mundo (data de há cerca de 175 milhões de anos) e foi tornado Monumento Natural das Pegadas dos Dinossáurios. Na Lourinhã – considerada, de resto, a capital portuguesa dos dinossauros -, a praia da Peralta também conservou centenas de pegadas e em Vila do Bispo, na Praia da Salema e na Praia Santa, veem-se dezenas de pegadas. Já na jazida de Vale dos Meios, em Santarém, encontram-se as mais antigas pegadas conhecidas na Península Ibérica, com quase 168 milhões de anos.

 

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