Ao atravessar a Rua Camilo Castelo Branco, os intervalos no corredor de tílias de grande porte vão deixando a descoberto o modernismo da Igreja do Sagrado Coração de Jesus, situada a dois passos da Avenida da Liberdade e do Marquês de Pombal, e que se tornou disruptiva no então cenário das igrejas alfacinhas, tanto pelo uso de materiais como o betão e o mármore de Vila Viçosa como pelas linhas retas e minimalistas e o conjunto de sinos a descoberto, sem estarem envoltos numa torre sineira.
Mas não só. A igreja de Lisboa construída durante a segunda metade da década de 1960 e inaugurada no verão de 1970, autoria dos arquitetos Nuno Teotónio Pereira e Nuno Portas, também marca pela diferença ao integrar-se na malha urbana, já que o seu pátio e escadaria serve de ligação pedonal a duas artérias desniveladas – a Rua Camilo Castelo Branco e a Rua de Santa Marta – junto a limoeiros, crassulas ou begónias. Essa relação integrada com o edificado urbano foi uma das maiores preocupações dos próprios arquitetos – e a única das 60 candidaturas no concurso para a construção da igreja a sugerirem-no. Citados no site da autarquia lisboeta, os autores explicam que “os corpos do conjunto, igreja propriamente dita e outros serviços, tinham de realizar a amarração à cidade que tínhamos à volta”.
Na ampla nave da igreja, onde cabem mais de 1200 pessoas sentadas, destacam-se a claraboia que ilumina o altar-mor de luz natural, o batistério, candeeiros retangulares em mármore, estátuas (pastorinhos Francisco e Jacinta, Nossa Senhora de Fátima e Sagrado Coração de Jesus), um leque de quinze pinturas alusivas à Via Sacra, algumas dracenas a trazer o verde para dentro do salão e o órgão de 908 tubos junto à tribuna onde se fixa o coro.
No piso inferior da Igreja do Sagrado Coração de Jesus, é possível visitar a cripta, onde se observam mais estátuas (Santo António, Nossa Senhora das Dores, arcanjo São Miguel e Nossa Senhora da Conceição, entre outros) e exemplares de confessionários em madeira do século XVIII. Nos pisos mais baixo, há ainda espaço para zonas como a sala de conferências, auditório e as capelas mortuárias (visitáveis sob pedido). É nestas últimas que estão os painéis de azulejaria original da primeira Igreja do Coração Sagrado de Jesus (situada noutro local da Rua de Santa Marta), que somam três séculos e espelham desenhos como cordeiro, espigas, pelicano e uvas.
Em 1975, esta igreja venceu o Prémio Valor e em 2010 foi classificada como Monumento Nacional. “Ainda hoje é estudada por muitos arquitetos de várias partes do mundo”, conta Paulo Lopes, assistente litúrgico da paróquia. O interesse, esse, existe desde o primeiro momento, como o mesmo responsável recorda: “No dia da inauguração, a cidade estava cá toda”.
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