O «retrato íntimo» do vinho português está nos cinemas

'Setembro a vida inteira', um «retrato íntimo» do mundo do vinho português, realizado pela jornalista Ana Sofia Fonseca, já está em exibição nos Cinema City de Alvalade (Lisboa), Leiria e Setúbal, sempre às 19h30.

Como surgiu a ideia de produzir este filme sobre o mundo do vinho?
É uma ideia antiga. Em 2003, comecei a fazer a investigação para o livro ‘Barca Velha, histórias de um vinho’. Quando andava a fazer essa investigação, houve um momento em que estava num sótão da Quinta do Vale Meão com a proprietária, a Maria Luísa Nicolau de Almeida. A imagem de ela a vir por entre teias de aranha, com a luz a entrar muito difusa pelas telhas, e a dizer «Olhe para isto, está aqui tudo! São os vestidos da filha da Dona Antónia, até a retrete [de campanha] de andar pelo Douro aqui está.» Aquela imagem era tão bonita, e aquilo era um universo tão desconhecido que eu pensei, «Isto dava um filme». Claro que na altura estava ainda longe de imaginar que o iria fazer, mas acho que a ideia, verdadeiramente, surgiu aí. Depois andou meia esquecida, ganhou força e em 2015 comecei a trabalhar na produção.

Este é o primeiro documentário cinematográfico sobre o mundo do vinho. O que importa abordar?
As garrafas de vinho sentam-se à nossa mesa várias vezes. E quem são estas garrafas? O que é que vem lá dentro? Claro que vem a uva e todo o processo alquímico, mas eu acredito que a maior alquimia são as histórias, as pessoas. As pessoas sentam-se à nossa mesa e acabam por ser desconhecidos e eu quis perceber quem eram essas pessoas que produzem o vinho. Isto tem particular interesse porque é um universo de paixão. Não é só transformar a uva em vinho, há aqui muito mais, são pessoas que contam a vida pelas vindimas. E eu acho que isso é que é interessante, tentar perceber mais sobre este universo. Por outro lado, é um filme sobre a liberdade, sobre a paixão, sobre a entrega e sobre as relações entre quem tem a terra e quem a trabalha. É um pouco um convite à reflexão sobre a condição humana, não é um filme só sobre o vinho.

Que histórias conta?
Tentámos ter histórias diversas, não só em termos de diversidade geográfica, porque Portugal é um país que produz vinho em qualquer canto e com qualidade; mas também histórias de vida diferentes. Temos desde famílias que há 200 anos que estão no vinho, até pessoas que começaram há pouco tempo e que vieram até de condições de vida muito difíceis e que hoje em dia têm empresas grandes de vinho. É o caso da Herdade da Malhadinha e da Casa Ermelinda Freitas, que do nada criaram tudo. São histórias diferentes, misturadas também com quem trabalha no campo. É um filme também sobre o amor à terra. No fundo, este filme humaniza o vinho porque mostra-lhe os rostos. E depois, numa altura em que o vinho português está na moda e tem um reconhecimento como nunca teve, costumo dizer que é um retrato mais íntimo e pessoal do vinho.

 

Ana Sofia Fonseca fotografada na Casa Ermelinda Freitas, em Fernando Pó—. (Fotografia de Rui Minderico/GI)

 

Quem são os protagonistas?
A família Guedes, da Sogrape, a família Olazabal, da Vale Meão, os Soares, da Herdade da Malhadinha, o Luís Pato, o Ricardo Diogo, da Madeira, a Leonor Freitas, da casa Ermelinda Freitas, Dirk Niepoort. E depois algumas mais curiosas, como um vinho feito na prisão ou um vinho guardado pelos monges da Cartuxa. E depois a tradição que se alia a uma grande modernidade no vinho português. Houve um grande investimento e isso é retratado na música do final do filme. Queria ter um fado, o ‘Oiça lá ó senhor vinho’, mas não queria o fado, porque já não é só tradição. Então pedi ao Jorge Palma para reinterpretar o fado como ele quisesse.

Ser de Azeitão deu-lhe alguma sensibilidade especial para o tema?
Acho que tudo o que fazemos na vida um dia nos vem bater à porta. Não fiz o filme por ser de Azeitão, mas se calhar tenho este interesse por histórias do vinho porque sempre convivi com elas. É óbvio que quem cresce num sítio ligado ao vinho tem, se calhar, muito mais possibilidades de ter uma atração pelo mundo do vinho, mas as coisas não são sempre líquidas.

 

PASSAPORTE PARA CONHECER PORTUGAL

‘Setembro a vida inteira’ (99 minutos, Carrossel Produções) é uma viagem pelas vinhas de Douro, Bairrada, Alentejo, Península de Setúbal e Madeira. Está em exibição nos Cinema City de Setúbal (onde a realizadora vai estar este sábado), Lisboa (Alvalade) e Leiria, diariamente às 19h30, e segue depois pelos cineteatros de todo o país.

 

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