Crónica de Manuel Molinos: Mais uma ficha, mais uma volta

(Fotografia de Mihai Vlasceanu/Pexels)
Estar presente num romaria é fazer com que os costumes e as tradições não se percam de vez nestes dias vividos em bolhas mediáticas que não refletem o país real.

“Juventude, cuidem deste planeta que parece estar meio… atrofiado.” A frase é de Nel Monteiro e foi proferida durante um concerto do cantor nas festas em honra de Nossa Senhora da Saúde, em Gueifães, Maia.

O artista, com muitos anos de estrada e detentor de um sentido de oportunidade único, passou ao público várias mensagens sociais e políticas naquela noite de chuva, nos intervalos dos seus temas populares. Percebe-se o sentido cívico de Nel Monteiro quando fala também da violência exercida sobre as mulheres, ainda sobre a discriminação a que estão sujeitas, e do pão que faltou na sua casa. Olha diretamente o público e não esconde as dificuldades por que passou, devido à pandemia e à sua situação financeira e de saúde. É um espetáculo num palco sem ostentação, despido de tecnologia, de estrelato de páginas de revistas e programas de televisão. Simples e cru. Poderemos chamar-lhe pimba?

Não sou fã de romarias. Mas marcar presença nas festas das nossas terras é isto mesmo. É conhecer o país real, as suas gentes e os seus locais. Os artistas que lutam pela vida ao percorrer quilómetros cá dentro e lá fora. A sobreviver.

Estar presente é fazer também com que os costumes e as tradições não se percam de vez nestes dias vividos em bolhas mediáticas, enquanto assistimos ao nascimento de uma inteligência artificial que não sabemos como nos moldará.

É certo que há romarias que não precisam de cartaz, como, entre outras, a Festa das Cruzes, em Barcelos, o Senhor de Matosinhos e as Feiras Novas, de Ponte de Lima. Outras são pequenas, carregadas de essência religiosa e cultural. Tão pequenas que se tornam belas pela sua naturalidade e simplicidade.

E quem as mantém merece mais. Mais dos seus habitantes, mais dos seus governantes. Tal como outros setores de atividade, os feirantes das empresas itinerantes de diversão e restauração passaram por grandes dificuldades durante a pandemia. Alguns continuam a lamentar a falta ou o atraso nos apoios prometidos.

Mas continuam cá. Resistentes e a cumprir um papel nem sempre com o devido reconhecimento, muitas vezes olhados com desdém. Estão cá para que haja mais uma ficha para mais uma volta.




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