Crónica de André Rosa: Quem tem medo da rentrée?

Rua Augusta, em Lisboa (Foto: Nuno Pinto Fernandes/GI)
Cada um pode fazer aquilo que está ao seu alcance e continuar com a sua vida dentro das regras da pandemia, equilibrando as horas de trabalho com o lazer.

Quando o sol começa a pôr-se mais cedo no horizonte e a luz dos dias diminui, são dias de fim de verão e de regresso à rotina – ou a dita rentrée. Dito em francês até soa bem, mas na verdade o termo é um chavão para designar o período em que a sociedade regressa, letárgica e conformada, às rotinas dos empregos e da família, e geralmente nas grandes cidades. Deixa-se para trás a relva fresca, a areia quente, as noites mornas; regressa-se à dureza dos transportes públicos e do trânsito, às primeiras chuvas do outono e às horas de almoço apressadas.

É quase sempre doloroso, o corpo não corresponde, a mente ainda está focada no sabor daquele mojito à beira da falésia. E este ano ainda é mais penoso, saídos de um verão atípico, qual saída precária após meses de castigo. Máscaras na praia? Distanciamento social? Menus no telemóvel? Mãos em sangue de tanto esfregá-las em álcool-gel? Parece um filme de ficção científica, ou terror, do qual ninguém queria ser protagonista. A verdade, porém, é que agora nos encaminhamos para as estações frias, de temperatura e de afetos, numa pandemia sem fim à vista e a inspirar todas as cautelas.

Que rentrée existe parecendo que, na verdade, nunca saímos deste drama coletivo?

Que regresso é este que nos traz más memórias dos meses de março, abril e maio em que o país se fechou sobre si próprio e a apreensão social era palpável? Que cidades encontraremos numa altura em que o distanciamento social é imperativo, mas utópico, nos transportes públicos, nas ruas, nos centros comerciais, nas escolas, nos hospitais, nos restaurantes? Que paz sentiremos ao passar mais horas em casa recordando o duro confinamento?

As respostas serão encontradas ao longo dos próximos quatro meses e dependerão do comportamento coletivo e de cada um de nós, sendo certo que o cumprimento das distâncias sociais, do uso de máscara e da desinfeção regular das mãos é a trilogia-chave para minimizar os riscos de contágio em massa. O “novo-normal” que se anunciava há meses é aquele em que já vivemos sem dar conta, a ponto de, no futuro, virmos a estranhar quem não usar máscara num espaço público aberto ou fechado.

A rentrée política, escolar e laboral arranca, pois, neste cenário de cautelas e incertezas face ao futuro. E para que a crise, por agora silenciosa, não se agrave, cada um deve fazer a sua parte, naquilo que estiver ao seu alcance: continuar com a sua vida dentro das regras da pandemia, manter os hábitos de consumo possíveis, equilibrar as horas de trabalho com os momentos de lazer, consumir o que é português, de preferência. Ser um agente de saúde pública e motor da economia em prol da saúde do país. Porque não há mal que sempre dure, nem bem que nunca acabe.




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