Crónica de Ana Costa: viajar sozinha

(Fotografia de Adelino Meireles/GI)
Ainda agora, a poucos dias da partida, não nego sentir algumas borboletas na barriga, um nervosismo misturado com o entusiasmo de experimentar algo pela primeira vez e conhecer um lugar novo.

Quando o leitor parar nesta crónica, estarei a embarcar num avião, de mochila às costas, para viajar, pela primeira vez, sem companhia. Uma escapadela de fim de semana a uma grande capital europeia pareceu-me uma escolha segura para a minha estreia na aventura libertadora, segundo dizem, que é viajar desacompanhada. Há muito que o desejava fazer, mas confesso que fui adiando a decisão por um receio difuso: de não ser capaz, de me sentir sozinha, de preferir partilhar a experiência com alguém, de me perder, de não conseguir resolver contratempos ou do meu inglês estar demasiado enferrujado para me safar. Dúvidas, em muito cultivadas pela crença ainda generalizada de que não é seguro para uma mulher viajar sozinha.

Marquei os voos por impulso, numa ânsia por mudar de ares e afirmar a minha independência, e praticar a convicção de que apenas eu posso concretizar os meus desejos e fazer por ser feliz. Em reação, ouvi das vozes paternais da minha vida um apreensivo “Ai! Mas vais sozinha? Não tens medo?”, e daquelas ansiosas por descobrir o mundo, como eu, um almejante “Também gostava de ir, mas não sei se tenho coragem”. E percebi que o receio, um alheio, outro impreciso, pelo desconhecido e o longínquo, é o que retrai e paralisa os nossos sonhos. Mas é também essa mesma energia, na sua essência, transformada em curiosidade, o motor que nos leva a desbravar terreno e a descobrir o Mundo. Basta uma pitada de coragem, ou como dizia o autor de um blogue de viagens onde fui buscar conselhos, “desligar o complicador que todos temos dentro de nós”.

Ainda agora, a poucos dias da partida, não nego sentir algumas borboletas na barriga, um nervosismo misturado com o entusiasmo de experimentar algo pela primeira vez e conhecer um lugar novo. Confortam-me os testemunhos de outros viajantes a solo, e principalmente de mulheres como a Ana Isabel Mineiro do blogue “Comedores de Paisagem”, a Shannon O’Donnell do “A Little Adrift” ou a Geraldine De Ruiter do “The Everywhereist”, que há mais de uma década se aventuram sozinhas por esse Mundo fora. Para a lista de próximas leituras entrou também o livro “Mulheres Viajantes”, de Sónia Serrano, que traça, desde o século IV, a evolução da condição feminina no domínio da viagem.

Há cuidados a ter, claro, mas não diferem dos que temos todos os dias ao sair de casa. Desde que estudemos o destino e as suas particularidades, sair da nossa zona de conforto e desafiarmo-nos a fazer algo que nunca fizemos antes pode ser uma experiência enriquecedora para o nosso crescimento pessoal e de auto-confiança. Para além de que as vantagens de viajar sozinha são bastante sedutoras: a liberdade de poder tomar decisões, mudar planos, agir por impulso e seguir as vontades que vão surgindo no caminho, ao nosso ritmo. Viajar a solo parece ser uma boa forma de nos conhecermos a nós próprios, de desenvolvermos habilidades sociais e de aprendermos a estar bem apenas com a nossa companhia. É o que espero! Mas qualquer que seja o desfecho desta aventura, sei que regresso de alma cheia.




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