Chama-se Tareco, alcunha de família, e só neste verão começou a fazer passeios pelo rio Mondego. Victor Seco e Fábio Nogueira querem que o seu barco seja como uma sala de aula, e têm muita história para dar a conhecer, em Penacova, ao longo de três percursos que podem ser enriquecidos com experiências – uma degustação de produtos regionais, um momento musical, uma palestra. Para isso, encomendaram a um carpinteiro local uma réplica de barca serrana que só difere da original pela inclusão do motor elétrico que lhe permite navegar sem esforço nem ruído. E criaram o projeto SERRANAS DO MONDEGO em homenagem a dois antepassados que eram barqueiros.
Victor ainda se espanta ao pensar que o seu avô e o bisavô de Fábio cozinhavam e dormiam na barca serrana com que faziam vida naquele rio, décadas atrás. Os dois irmãos tinham um negócio de transporte entre Penacova e Figueira da Foz: para a Figueira levavam madeira, produtos agrícolas e outras mercadorias, e de lá traziam sal. Ir e voltar demorava uma semana, porque a embarcação, que carregava toneladas, era movida à vara, à vela ou à sirga (com os homens a puxar das margens). Outra função era levar a roupa suja das senhoras de Coimbra para as lavadeiras, nas aldeias, e devolvê-la limpa. Hoje, o Tareco é mais um motivo para visitar Penacova e passar uns dias tranquilos junto à água doce.
A PRAIA FLUVIAL DO RECONQUINHO, acessível e com Bandeira Azul, é um dos locais mais procurados. Todos os anos, pelo calor, é montada uma ponte de madeira sobre o Mondego, que dá acesso às sombras e mesas de piquenique na outra margem, além de render belos mergulhos. Já o BAR DO RECONQUINHO funciona o ano inteiro. Desde que Edite Almeida tomou conta dele, serve caracóis, moelas, enguias fritas e outros petiscos, mas também almoços e jantares, rematados com tarte de pão baseada numa receita familiar.
A natureza e a gastronomia são fortes de Penacova, como bem sabem Hugo Teixeira Francisco e João Ramos, cofundadores da PORTUGAL GREEN TRAVEL, um novo operador turístico, especializado em territórios de baixa densidade e apostado em explorar o potencial do interior. Entre as atividades que a start-up desenvolve no concelho, onde tem sede, está uma experiência de rapel e escalada que pode ser realizada em família, no Penedo da Carvoeira, próximo do Reconquinho.
Também perto do Mondego, visível das janelas, fica o restaurante CÔTA D’AZENHA, de cozinha tradicional, com enfoque nos pratos regionais. Os peixinhos do rio abrem caminho para a chanfana ou o bacalhau à Côta. Novembro é época de míscaros e sarrabulho e, de janeiro a meados de abril, há lampreia. Penacova é “a capital da lampreia”, assegura o responsável pela casa, Jorge Côta, assumindo como apelido a alcunha do falecido sogro, Henrique, que abriu o café contíguo, ainda na família. Jorge gosta de conversar com os clientes e, no fim, adoça-lhes a boca com pudim caseiro, leite-creme ou doces conventuais da terra: a nevada e o pastel de Lorvão.
Vitorino Nemésio e os moinhos
Em tempos, os moleiros complementavam as azenhas, moinhos de água mais usados no inverno, com os moinhos de vento, acionados durante o verão. Há uma certa poesia nesses engenhos ligados aos elementos, e Penacova tem dos maiores conjuntos molinológicos do país. O núcleo da Serra de Gavinhos, em Figueira do Lorvão, reúne 14 moinhos de vento e ainda tem um moleiro ativo (ler caixa). E o núcleo da Portela da Oliveira, na Serra do Buçaco, conta com mais de 20 moinhos de vento e o MUSEU DO MOINHO VITORINO NEMÉSIO. Esse equipamento nasceu no lugar de um moinho de que só resta a cúpula, já que foi convertido em casa de férias de Arantes de Oliveira, ex-ministro das Obras Públicas de Salazar, antes de a autarquia ter adquirido o edifício.
As peças expostas ajudam a entender como funcionavam os moinhos, e o de Vitorino Nemésio faz parte do complexo do museu, logo, é visitável. O escritor, que foi presidente da Associação Portuguesa dos Amigos dos Moinhos, chegou a ter três moinhos em Penacova. Sobre o concelho, o “incansável moleiro de palavras”, como lhe chamou David Mourão Ferreira, afirmou: “É preciso chegar às abertas e miradouros para achar a razão de ser da fama de Penacova, que é o seu admirável panorama de água, pinho e penedia”.
A este concelho do distrito de Coimbra também se vai comer leitão assado em forno de lenha, à vista dos clientes. Acontece no restaurante LEITÃO DO AIRES, inaugurado, há mais de uma década, na Espinheira. Aires Seco esteve emigrado na Alemanha e no regresso abriu uma casa de leitão na Mealhada; continuou a apostar nessa carne quando montou este espaço, cheio de figuras de porcos que os clientes trazem de toda a parte. “Começámos com um e agora temos uns mil”, conta.
O projeto de turismo rural CASAS NO TERREIRO, na aldeia de Felgar, também tem crescido, pela mão de Pedro Santos e de Elisabete Aleixo, que guarda ali muitas memórias de infância. No total, são cinco casas. As primeiras três – a Casa da Avó, a Casa da Tia e a Casa do Forno – eram de familiares e estavam devolutas. Ressurgiram com a mesma traça e objetos antigos recuperados. No verão passado, currais e palheiros deram lugar a duas novas casas, com decoração mais moderna: as Casas do Alto. Seja qual for a opção, é complementada com piscina, parque infantil e uma quinta com cabras e ovelhas, a pensar nos mais novos.
Lugar de divertimento, independentemente da idade, é a PRAIA FLUVIAL DO VIMIEIRO, com Bandeira Azul, já em São Pedro de Alva. A praia, junto ao rio Alva, afluente do Mondego, fica num cenário tranquilo, com patos, casas de xisto, mesas de piquenique e um café-restaurante, O Vimieiro. Mas quem quiser ainda mais sossego tem perto o ESPAÇO FLUVIAL DE LAZER MARIA DELEGADA, a que se chega por uma estrada de terra batida, tomando como referência a povoação de Laborins.
Turismo histórico-militar
Penacova, Mortágua e Mealhada são os concelhos abrangidos pela Serra do Buçaco, que foi palco da Batalha do Buçaco, em 27 de setembro de 1810, no âmbito da terceira invasão francesa. Os três municípios integram o projeto CAMINHOS DA BATALHA DO BUSSACO e desenvolvem atividades em torno daquele momento histórico, que se revelou fulcral para a derrota final dos franceses nas Linhas de Torres.
De um lado, estavam as forças anglo-lusas, comandadas pelo tenente-general Arthur Wellesley, futuro Duque de Wellington; do outro, as forças francesas dirigidas pelo marechal Massena. O exército anglo-luso teve uma vitória moral, já que, segundo o código de guerra, é preciso permanecer durante 48 horas no campo de batalha, para ela ser inequívoca, e Wellesley não o fez. A explicação é de Luís Rodrigues, técnico de turismo da Câmara de Penacova, que tem os seus programas de turismo militar bem documentados.
Entre as iniciativas organizadas pela autarquia estão as VISITAS GUIADAS AO CAMPO DE BATALHA, com personagens que representam as partes em conflito: Arthur Wellesley e o general Reynier. Estas visitas, gratuitas, mas sujeitas a marcação, dão a conhecer o posto de comando de Wellesley, a colina de batalha e a aldeia de Santo António do Cântaro, onde estava o inimigo francês. Tudo de forma amigável, que este território pede paz e descanso.
Lino da Silva Branco, moleiro por carolice
Lino da Silva Branco, de 78 anos, nasceu numa família de moleiros. Aprendeu a arte em criança e nunca a esqueceu – nem quando teve outras ocupações profissionais, e as dele começaram bem cedo. Fez a quarta classe, trabalhou numa fábrica de louça, foi para a tropa e depois para França, onde foi pedreiro. No regresso a casa, virou-se para os moinhos. Moía diariamente, aproveitava todos os ventos; agora só o faz de abril a outubro, mais ao fim de semana. “É por carolice, não dá nem para a gasolina. É muito raro vender farinha, um ou dois quilos para fazer papas ou enchidos”, conta ele, em pleno labor, com o chapéu enfarinhado que pertenceu ao pai, Aníbal Duarte Branco, também moleiro. Lino gosta tanto desta vida que prefere ficar a moer, em vez de passear ou ir para a praia. Visitas através da Câmara de Penacova (telefone: 239470300; mínimo: dez pessoas).
Batalha do Buçaco: passeio épico encenado
Entre as atividades organizadas pelo município de Penacova, no âmbito do projeto Caminhos da Batalha do Bussaco, estão os PASSEIOS ÉPICOS ENCENADOS. O mais recente teve lugar no passado dia 27 e recriou a travessia do vale do Mondego pelas tropas anglo-lusas, para se posicionarem na serra. Este passeio imersivo, com figurantes e efeitos especiais, durou duas horas e teve um custo de 5 euros; quem também quis pernoitar no acampamento militar pagou 7 euros. Os valores incluíram transporte e rações de combate. Para o ano há mais.
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