Encontrar laranjais na paisagem algarvia é relativamente comum; mais raro é achar uma propriedade agrícola onde, depois de um mar de árvores de citrinos e do comboio, se avista ao fundo a linha de água. Esta terá sido, precisamente, uma das particularidades que levou Pedro Estrela, com formação em turismo, a convencer os pais a investir do seu próprio bolso para criar no local uma unidade de agroturismo.
A Quinta dos Perfumes foi adquirida na década de 1970 pelos avós de Pedro à família Sommer, que tinha aqui uma fabrica de essência de perfumes obtida a partir das malvas – daí o nome. Como os tempos eram outros, os novos donos não mantiveram a chaminé da fábrica – para grande desgosto de Pedro – e começaram a usar os armazéns para fins agrícolas, atividade principal até hoje e que é fundamental como suporte para a vertente turística. Em 2013, e sem necessidade de estarem sempre por perto, abriram apenas seis quartos, duplos e estúdios, equipados com kitchenette.
A procura, sobretudo entre estrangeiros, animou-os a dar o passo seguinte e a investir cerca de 750 mil euros. Este ano, a tempo do verão, no lugar da antiga fábrica surgiu uma ala, de arquitetura depurada e decoração contemporânea de inspiração nórdica (a cargo de Rita Ribeiro da Increation Interior Design), com mais nove quartos (três com terraço no rés do chão e seis duplos, três deles com cama de dossel, no piso de cima), receção, rooftop, sala de estar e sala de pequenos-almoços – jantares, só para 2018. À volta, os jardins foram também melhorados, contando com camas de dia no relvado, e criou-se uma horta biológica para ter sempre produtos frescos. À parte, numa zona mais recatada e rodeada por laranjeiras, a piscina de água salgada com bar self-service completa a oferta. E que bem se está no campo com a serra e o mar à vista.
Uma outra mais-valia desta unidade é que disponibiliza gratuitamente bicicletas, o que vem mesmo a calhar não só para explorar a propriedade como também, em muitos casos, para ir até à praia – a de Cabanas de Tavira é a mais próxima, sendo apenas necessário efetuar uma curta travessia de barco.
Aliás, nunca é demais relembrar que Tavira está em pleno Parque Natural da Ria Formosa e perto de outras praias como a da Ilha da Fábrica, do Forte São João da Barra, do Barril, cujo acesso se faz por comboio, da Manta Rota ou Praia Verde. É só escolher. Com ou sem banhos de mar, não faltam todavia alternativas de passeio para quem se hospeda na Quinta dos Perfumes – desde curiosidades locais como a ponte romana, o castelo mourisco, a cascata do Pego do Inferno, o mercado municipal ou a pitoresca aldeia de Cacela Velha.
Já o Parque Natural da Ria Formosa, que acompanha praticamente toda a costa desde o Ancão até à Manta Rota, guarda ingredientes para nos entreter por horas a fio. São, ao todo, mais de 18 mil hectares e, apesar do desenvolvimento galopante do Algarve e do avanço do betão, tem conseguido manter um ecossistema muito peculiar, assente nas lagoas e nos canais que se formam entre cordões de dunas e onde várias aves procuram abrigo no inverno, sem contar que vivem aqui ainda inúmeras espécies ameaçadas de extinção – como o caimão-comum ou o camaleão –, que se extrai sal e se cultiva, em abundância, a amêijoa.
Quem quiser mais do que um simples passeio de barco pela ria e alguns cartões postais, pode sempre optar pelos vários percursos pedestres existentes.
E já que falamos em sal, convém não esquecer que as salinas de Tavira, onde boa parte da extração é feita de forma industrial e não artesanal (salvo algumas exceções), são, a par das de Castro Marim, alvo da curiosidade de quem visita a região. Com o atrativo extra de se encontrarem integradas no Parque Natural.
A única desvantagem, ou não, em tornar esta escapada mais ativa é que o apetite vai aumentar exponencialmente, mas para isso existem, felizmente, os restaurantes. São várias as possibilidades, mas vamo-nos ficar por duas sugestões. Em primeiro lugar, em Santa Luzia, o Alcatruz mantém-se firme no que já foi uma taberna e uma casa de pasto, não tendo mãos a medir para atender quem chega desejoso de provar especialidades da casa como a cabidela de choco (em vez do sangue, a tinta do choco). Luís Gorgulho, o proprietário, faz gala em ter na carta várias opções de pratos de polvo e outras curiosidades locais que já não se encontram facilmente.
Num outro registo, o Chá com Água Salgada, na praia da Manta Rota. Aberto desde 2008, este espaço continua a surpreender não só pela sua arquitetura despojada entre dunas – ganharam pontos desde que a esplanada foi incorporada ao resto da casa, criando um ambiente único panorâmico que permite gerir melhor a frustração daqueles que não conseguem uma mesa mais próxima da linha de areia –, bem como por servir, sem a ditadura dos horários, um cardápio fresco assinado pelo chef Marco Jacó.
No verão fica tudo mais cheio? É certo, mas nesta altura, não há volta a dar, o Sotavento algarvio também tem outro sabor. E outros perfumes, já agora.
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