Crónica de Vítor Santos: Eu quero morrer na praia

Vista da esplanada do bar L´Kodac, em Leça da Palmeira (Foto: Rui Oliveira/Global Imagens)
Terá sido um dos dias mais importantes da minha adolescência. Não me recordo se estava frio ou se chovia, mas lembro-me bem que foi no Salão Paroquial de Leça da Palmeira que o meu irmão me perguntou se queria pertencer à OLP.

Quem me conhece sabe que tenho mais irmãos do que dias na semana, mas permitam-me que, atendendo à sensibilidade do tema, não divulgue o nome daquele que me fez a tentadora proposta. Não aceitei imediatamente. Até queria, mas era impossível. Para pertencer àquela organização, que mais parecia saída de um filme de Dan Brown, teria de passar por uma série de desafios e privações. Só depois seria admitido como membro de uma espécie de irmandade secreta que me ajudou a perceber a importância de Leça da Palmeira e, sobretudo, de ser de Leça da Palmeira.

Para manter as autoridades (e os invejosos) ao largo, opto também por não revelar se fui ou sou membro da Organização de Leça da Palmeira (OLP). Ou mesmo se ela existe. Mas confesso que, anos depois, já adulto, me encarreguei de instruir os meus filhos no sentido de se purificarem para poderem, um dia, aspirar a integrar tão nobre quanto clandestina instituição.

Pode até não ter passado de um truque, mas acredito que resultou, pois se há coisa que o meu filho Rui não me perdoa é o facto de ser obrigado a escrever “Matosinhos” no campo destinado à naturalidade. E agora não adianta nadinha, vai apontar-me a falha até à morte, ainda que já lhe tenha dito, vezes sem conta, que tem pouca importância, que poderá sempre pertencer à OLP, não obstante aquela mancha – admito – na certidão de nascimento.

Agora que o Rui chegou aos 20 anos, já pouco tenho para lhe contar sobre Leça da Palmeira. Mas é com a alma leceira cheia que o vejo debitar histórias de noites à beira daquele mar, com o companheiro Simão. Leça nunca mais lhe sai da alma e nisto encontro um bom motivo para pensar que a missão está cumprida. Ao ponto de encarar com grande otimismo a expressão morrer na praia – se for na de Leça da Palmeira, será sempre um adeus de coração cheio, sem necessidade de chorar por mais.




Outros Artigos





Outros Conteúdos GMG





Send this to friend