Crónica de Carina Fonseca: precisamos de cor

(Fotografia: Pexels/DR)
Jim Carrey mostra a sua paixão pela pintura num documentário já com anos. É um recordar do compromisso que devemos ter com a alegria, base de muitas outras coisas essenciais.

Em 2017, um documentário de seis minutos mostrou outro lado artístico de Jim Carrey, ator conhecido do grande público sobretudo pela comédia, mas que deu provas de forte talento, igualmente, no drama. Na curta-metragem I needed color (Precisava de cor), realizada por David L. Bushell, Carrey – que já falou da luta contra a depressão – conta como a pintura o ajudou a curar um coração partido e lhe conferiu liberdade.

Lembro-me muitas vezes daquele filme e do título, sobretudo nas alturas de maior desmaio existencial: eu precisava/preciso de cor. Não precisamos todos? Especialmente quando, às circunstâncias pessoais (os combates que cada um trava dentro de si, sem que outros lhes possam medir a enormidade), se juntam questões macro. Hoje, qualquer otimista vê embaciar-se as lentes rosa dos óculos com que olha em volta, perante tantos sinais de alarme e desesperança no Mundo. Guerra, violação de direitos humanos, alterações climáticas, ameaças de extinção, desequilíbrios sociais… é ir somando à lista.

Face a tudo isso, o que nos pode animar? As cores que transbordam da arte, mas também dos sorrisos das pessoas boas com quem nos cruzamos – como relata Anastasiia, que fugiu da guerra na Ucrânia há um ano, renunciando a quase tudo o que construíra. Em alguns dias, até uma camisa garrida costurada à mão, com tempo e cuidado, pode ajudar.

Aí, já falamos das cores presentes no quotidiano, do impacto emocional que têm, da história e dos simbolismos que carregam, e nos quais tendemos a não pensar muito, pelo menos até tropeçarmos em certos livros. Por exemplo, os que Michel Pastoureau dedicou ao vermelho, ao azul, ao verde, ao amarelo e ao preto; As cores das coisas, de Rosa Alice Branco; ou mesmo Happy inside, de Michelle Ogundehin, que frisa a importância da paleta escolhida para decorar a casa, se nos queremos sentir bem lá.

Tenhamos mais ou menos sensibilidade para apreciar as belezas simples do dia a dia, todos nos detemos perante a visão de um arco-íris. Paramos para tirar fotografias e sentimos esse momento como algo revitalizante, alívio da carga num dia cinzento. As cores também moram na nossa língua, até têm estatuto de lugar-comum. Por vezes, sai-nos um sorriso amarelo, ficamos vermelhos de raiva ou embaraço, brancos de susto. Quando estamos apaixonados, vemos tudo cor de rosa, e desejamos sonhos assim aos alvos da nossa afeição. E, claro, é nesse leito de conforto e delicadeza que ganhamos forças para lidar com o resto da paleta de tons universal.




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