Raízes: árvores centenárias e tradição à mesa
Trinta e cinco metros de altura, um verde brilhante nas folhas e um grosso tronco que passa os quatro metros de perímetro. Não há quem não conheça a maior Ginkgo Biloba portuguesa, e uma das maiores da Europa, situada no Jardim das Virtudes, no Porto. Quem por aqui passa todos os dias, já se habituou a contemplá-la. Para um lisboeta que visita a Invicta pontualmente, desta vez a convite de uma colega portuense, é uma espécie fascinante de se olhar. Ainda assim, a escassos metros de distância, há outra Árvore a roubar atenções e a virá-las para as artes, há cinco décadas e meia.
«No outono, a Ginkgo fica toda amarela. É lindo de ver», conta José Emídio, presidente desta cooperativa artística, no sossegado terraço da mesma, com vista para a Alfândega e para o Douro. «É preciso perceber que, nos anos 60, o país era cinzento, não havia muita liberdade. E o Porto era muito fechado. Havia pouca oferta do ponto de vista cultural», adianta o responsável. Preside esta casa há exatamente um ano, mas desde os anos 70 que é sócio da organização, fundada em 1963 por um leque de artistas plásticos, entre os quais o escultor José Rodrigues e o pintor Ângelo de Sousa.
A cooperativa cultural Árvore. (Fotografias: Pedro Granadeiro/GI)
No edifício do século XVII, em tons de amarelo torrado e remodelado depois do ataque bombista de que foi alvo, no pós-revolução de Abril, acolhem-se exposições gratuitas ao longo de todo o ano. Além disso, é casa de oficinas para artistas, em áreas tão vastas como a cerâmica, a serigrafia, a gravura e a litografia. «Isso é algo que nos distingue e identifica», conta José, também ele pintor. À loja onde se vendem peças de artes, juntou-se, mais tarde, um restaurante que serve almoços e jantares, e que veio trazer novos públicos ao espaço. Neste espaço ao ar livre, já me tinha sentado em tempos a beber um refresco, mas soube bem conhecer as novas facetas – ou ramos – desta Árvore.
A poucos metros desta casa de artes, há outras raízes que importam conhecer. No meio da confusão citadina, cinco minutos sentado à sombra na Alameda dos Plátanos, todos deformados e centenários, do Jardim João Chagas, também conhecido como Jardim da Cordoaria, podem fazer a diferença, com a Torre dos Clérigos a espreitar ao fundo Por estes lados, junto ao Palácio da Justiça, é ver alguns turistas captarem em fotografia as suas imitações dos Treze a Rir Uns dos Outros, as esculturas do madrileno Juan Muñoz, instaladas neste espaço verde a propósito do Porto Capital Europeia da Cultura 2001. Uns estão sentados, outros debruçados, outros ainda de cabeça para baixo.
O Catraio é o primeiro bar de cerveja artesanal do Porto.
O bar fica na Rua de Cedofeita.
Na porta 256 da movimentada Rua de Cedofeita, a cabeça está no sítio certo. Há cinco anos, uma dupla de apaixonados por cerveja artesanal abria aquele que é o primeiro bar de cerveja artesanal do Porto. Curiosamente, a 31 de janeiro, uma data emblemática para a Invicta. Ainda pouco se ouvia falar em cerveja artesanal, nessa altura, mas o risco compensou. «Assim como nós próprios fomos crescendo com o espaço, a cultura cervejeira portuense também», explica Bia Afonso, dona do Catraio – Craft Beer Shop, em conjunto com o companheiro de década e meia, Ricardo Queirós.
A informática e a psicologia ficou para trás, em prol de uma paixão maior. «Temos clientes muitos fiéis, que voltam todas as semanas», acrescenta Bia, sobre o descontraído bar portuense, com esplanada e um tranquilo terraço nas traseiras. Mais. «Há clientes que tiram férias para celebrarem a semana de festa de aniversário do bar», diz Ricardo.
No pioneiro Catraio, há 12 cervejas artesanais nacionais e estrangeiras à pressão, em rotação constante, e 200 referências em garrafa. A representação portuguesa vai desde Vila Verde ao Algarve. Para se manterem a par de uma indústria que cresceu a olhos vistos nos últimos anos, o casal viaja frequentemente pelo país e pelo mundo, à descoberta de novos sabores. «A cerveja artesanal é um lubrificante social, é uma desculpa para aproveitar a vida», remata o dono.
A Adega do Carregal é um clássico da gastronomia do Porto.
Num bairro onde o novo e o antigo coabitam saudavelmente, poucos segundos separam esta casa de outra, com morada quase centenária, quando era uma antiga casa de pasto. A nova faceta, enquanto Adega do Carregal, surgiu há duas décadas, para privilegiar a cozinha tradicional portuguesa e a gastronomia local. «Vinte anos disto já dá para tirar a carta de pesados, não já», pergunta César Marques. Para o gerente deste restaurante familiar, é assim desde 1997. «Todos os dias, menos ao domingo, que é dia de namoro», ri-se o portuense, que tem na irmã, Lídia, a líder da cozinha.
A receita para a longevidade percebe-se rapidamente. Doses generosas, preços simpáticos – algo cada vez menos frequente nesta zona – e a combinação de três ‘s’: simplicidade, sinceridade e simpatia. Aliás, a uma segunda-feira à noite, o restaurante encontra-se cheio, e ouvem-se muito poucos dialetos estrangeiros, claros sinais de fidelização e vitalidade.
À mesa, chegam pratos como o arroz de sarrabulho, a cabidela, os rojões ou um dos best-sellers, o bacalhau à moda da casa. É frito, crocante por fora e suave por dentro, e acompanha com cebolada e batata frita. Também vale a pena provar a fofa sericaia, com ameixa e vinho do porto, claro está.
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