Da gastronomia aos passeios: o sereno pulsar da Peneda-Gerês

O coração do Parque Nacional da Peneda-Gerês - o único parque nacional do país, Reserva Mundial da Biosfera - tem um novo pulsar, mais sereno e concentrado nos benefícios da proximidade com a natureza. É um roteiro de bem-estar entre as águas que curam, os sabores, as paisagens e o património que merecem ser descobertos uma e outra vez, com novos e acutilantes olhares.

A paisagem envolvente, que muitos descreveram como de rara beleza, parece agora enviar um alarme silencioso. Por estes dias, devido à seca extrema que fez baixar drasticamente o caudal da barragem de Vilarinho da Furna, as paredes de pedra das casas da antiga aldeia (na freguesia de Campo do Gerês, a noroeste do concelho de Terras de Bouro) estão a descoberto – e o local tem sido, pela revelação do que a água guardava, cada vez mais alvo da atenção dos turistas. Há 50 anos, as 250 pessoas que viviam nesta aldeia foram obrigadas a realojar-se noutras localidades, no decurso da construção da barragem no leito do rio Homem. Felizmente, a população juntou-se e o NÚCLEO MUSEOLÓGICO DE CAMPO DO GERÊS foi inaugurado em 1989, com um espólio etnográfico de grande valor sobre a vida da aldeia, que foi comprada por pouco mais de vinte mil contos, à época.

A exposição aborda a organização comunitária agro-silvo-pastoril, o culto religioso, a vida quotidiana, os ofícios e a ruralidade de Vilarinho da Furna – para que as suas memórias não se percam no tempo – e replica o interior de uma casa da aldeia, cuja cozinha era a divisão mais importante, para a aquecer, cozinhar e cozer a broa. No piso térreo funciona uma loja e um posto de informações sobre a Peneda-Gerês. Já no núcleo da Porta do Campo do Gerês dá-se a conhecer a história geológica do território (que ocupa quase 70 mil hectares e é Reserva Mundial da Biosfera da UNESCO) e rica flora e fauna que nele se encontra. No Museu da Geira, mesmo ao lado, exalta-se, por sua vez, o engenho da civilização romana, que há dois mil anos construiu uma via entre Braga e Astorga, da qual 30 quilómetros estão no concelho.

Na vizinhança do museu encontra-se a EQUIDESAFIOS, o único centro hípico federado dentro do parque nacional e que há 20 anos desafia miúdos e graúdos a montar a cavalo, em batismos e passeios lúdicos. “Os passeios a cavalo com uma hora são os mais solicitados”, conta Henrique Rodrigues, sócio-gerente, enquanto aparelha um dos 13 dóceis animais que vão participar no passeio da manhã. Os animais estão mais do que habituados à tarefa, pelo que não é necessário ter qualquer experiência prévia. Consoante o grupo, o percurso pode seguir pelas ruas da pitoresca aldeia de Campo do Gerês, ou pelo interior da serra. Quem fica apenas a ver, pode comer e beber num bar com esplanada e explorar as outras atividades disponíveis, como escalada, paintball, arborismo, passeios pedestres e de charrete.

A relação das populações do Gerês com os cavalos – especialmente os de raça garrana – é longa, e para a valorizar mais o município de Terras de Bouro tem em curso uma obra de requalificação do Centro Interpretativo do Garrano, situado nas imediações. Este espaço terá conteúdos multimédia e atividades relacionadas com os equinos, para promover o turismo de natureza, que é tendência a nível mundial. Para recarregar baterias à mesa, vale a pena conduzir até à aldeia de Brufe, a 800 metros de altitude, na Serra Amarela. No Gerês, a distância conta-se em minutos e não em quilómetros; mas felizmente, à chegada a O ABOCANHADO, a esplanada debruçada sobre o vale do rio Homem faz esquecer o desconforto causado pelas curvas. A expressão significa uma aberta no céu, quando para de nevar ou chover.

Maria Helena Ramos e Henrique Marques, casal do Porto, edificaram o restaurante há 20 anos, numa altura em que a aldeia tinha sido uma das primeiras a requalificar as casas de alvenaria granítica para o turismo. Muitos duvidaram da sobrevivência do projeto, mas dois prémios de arquitetura vieram dar razão e alento à equipa. A posta de vitela e a tibornada de bacalhau estão entre as especialidades da cozinha. Da mesma safra empreendedora resultou o recente Leiras do Tempo Cottages, um conjunto de dois T1 com kitchenette e quatro estúdios espalhados pela aldeia, decorados com materiais da região e detalhes de luxo pensados por Helena. Os alojamentos casam a contemporaneidade com a ruralidade, dispondo também de uma sala de estar e de jogos, uma piscina exterior e serviço de pequeno-almoço.

(Fotografia: Victor Machado)

Valorizar os produtos locais

Pedro Casinhas, especializado em património geológico e geoconservação, também sentiu o apelo da montanha quando decidiu trocar Sintra por Braga, para ficar mais perto das cascatas e termas da Peneda-Gerês. “Guia por natureza”, criou a Keen Tours com a qual leva caminhantes a percorrer a fauna e flora, a arqueologia e a antropologia locais. A mulher, Rita Barros, ajuda-o na organização dos passeios. Há três meses mudaram-se para a pacata vila de Covide, e o balanço é mais do que positivo, a avaliar pela felicidade estampada nos rostos. De permeio, nasceu a LOJA DO PARQUE, uma montra do trabalho dos produtores e artesãos sediados no território da Reserva da Biosfera transfronteiriça. “A maioria são mulheres”, nota Rita, mas também cooperativas e associações com forte ligação às comunidades.

O pequeno espaço agiganta-se em sabores e histórias, vendendo sabonetes, doces, conservas, queijos, compotas, vinhos, cogumelos desidratados, tostas, mel, azeite, biscoitos e bolachas. Pedro destaca as Cervejolas (produzidas pela Letra, de Vila Verde, com mosto de uva) e destapa o véu de uma cidra de maçã biológica da espécie Porta-da-Loja, “mais rija e ácida”, e que ainda está em fase de afinação. A meia-dúzia de metros, no CANTINHO DO ANTIGAMENTE, Adelaide Pereira atrai comensais de todas as latitudes com as suas pataniscas de bacalhau com arroz de feijão e posta de vitela. É assim há quase uma década, num espaço pertencente à Calcedónia – Fundação para o Desenvolvimento Rural. O nome corresponde a uma fenda entre dois blocos graníticos que é muito procurada pelos amantes de trilhos.

Seguindo para Terras de Bouro, vale a pena trocar o asfalto pelo espelho de água da ALBUFEIRA DA CANIÇADA, a bordo do Rio Caldo. Esta embarcação de recreio operada pelo município tem saídas diárias da marina do rio Caldo e faz passeios de cerca de uma hora (mínimo de 25 pessoas) pelas pontes e pela praia de Alqueirão. Na parede da barragem, no rio Cávado, avista-se um desenho esculpido por Vhils.

Literatura e termas

A beleza da serra do Gerês tem inspirado inúmeros artistas, mas Ramalho Ortigão foi quem melhor cunhou a sua passagem pela vila. Por dedicar tantas horas a ler e a escrever sentado numas pedras no PARQUE DA ASSUREIRA, os moradores batizaram-nas de “os bancos do Ramalho”, e em 1920 a Sociedade Propaganda de Portugal inaugurou mesmo um banco, encomendado a Raúl Lino, em homenagem. Volvidas décadas de abandono, o parque foi requalificado pelo município e é agora um centro literário dedicado ao escritor, com o banco restaurado num pequeno lago e várias cadeiras espalhadas pelas sombras a convidar à leitura e à contemplação, debaixo dos medronheiros e castanheiros. Poucos metros abaixo, não é fortuito o nome da ADEGA RAMALHO, conhecido restaurante minhoto de tributo ao escritor.

Entre refúgios literários e consolos de estômago, é impossível esquecer aquilo que, afinal, tornou o Gerês tão afamado: as termas, movidas pela água mineromedicinal que brota naturalmente das profundezas da serra, há milhares de anos. No ÁGUAS DO GERÊS – HOTEL, TERMAS E SPA, situado na própria vila, o termalismo “cura”, com prescrição médica, vários problemas de fígado, vesícula, obesidade e diabetes. A terapêutica é feita através da ingestão controlada de água termal (pH de 9.1, rica em sílica e muito fluoretada), de uma dieta rígida (a dieta geresiana) e de tratamentos como duche vichy, hidromassagem e banhos de imersão, por exemplo. E desengane-se quem pense que se trata de um serviço procurado apenas por pessoas mais velhas: muitos chefs, escanções e outros profissionais fazem termas para se restabelecer e prolongar a sua saúde.


Acordar com vista para a albufeira

Encaixado numa encosta frondosa da serra, o Agrinho Suites & Spa Gerês é uma sucessão de miradouros e pontos panorâmicos sobre a albufeira da Caniçada. Dispõe de duas casas independentes (uma delas, a desafiar a inclinação) e de 25 quartos modernos e minimalistas, apoiados por um bar e restaurante com pequeno- almoço buffet, piscina interior aquecida, spa e piscina exterior com relvado. Na margem, tem ainda um pequeno cais de apoio para quem passeia de barco.

(Fotografia: Victor Machado)


Terras de Bouro aposta no bem-estar

O município quer tirar partido da Mata da Albergaria, cascatas, lagoas, miradouros e percursos pedestres do Parque Nacional da Peneda-Gerês – entre outros ativos naturais e turísticos – para o posicionar como um destino turístico ligado ao bem-estar. O minH2O Wellness Experience by Terras de Bouro vai ter pacotes para particulares, famílias e empresas, com o objetivo de atrair adeptos de uma vida mais serena e saudável, ou quem procura combater os vícios da vida moderna, numa lógica de fruição da natureza e encontro espiritual com o próprio ser.

 

Algo está a fazer com que o sistema não consiga mostrar a ficha ténica desejada. Pedimos desculpa pelo incómodo.



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