Guarda: No Museu de Tecelagem de Meios nascem cobertores dignos de um Papa

Museu de Tecelagem de Meios (Fotografia: Maria João Gala/GI)
No Museu de Tecelagem de Meios, instalado numa antiga fábrica de cobertores de papa, há um tecelão a mostrar como nascem essas peças de nome peculiar, em lã, que tanto serviam de enxoval como eram usadas pelos pastores para afugentar os lobos.

O Museu de Tecelagem de Meios, no concelho da Guarda, fica numa antiga fábrica de cobertores de papa. Foi inaugurada em 1954 e laborou até aos anos 1980, com teares em terceira mão e que tinham cadastro de máquina. Devem somar “cento e muitos anos, ninguém consegue saber a data deles”, conta o tecelão José Manuel Teles, que ainda ali trabalha. Só que agora este é um equipamento municipal que funciona como espaço expositivo e pedagógico, além de ter uma vertente de loja.

Os tradicionais cobertores de papa, em lã de churra ou merina, custam, no mínimo, 75 euros. Percebe-se, quando se vê José em ação no enorme tear de madeira, pernas e braços com a lição decorada desde a infância. O nome pode ser explicado em duas versões: se é verdade que, a meio do processo, as peças eram mergulhadas numa mistura de água e terra que formava uma espécie de papa, também há quem diga que a lã era tão boa, que o produto final era digno da cama de um Papa.

 

Aqueles cobertores – ou mantas – podem ser de vários tipos: há a manta de papa branca, de cama, que era a primeira peça do enxoval das moças casadoiras; a manta de papa pastor, com barras brancas e castanhas, impermeável; e a manta de papa lobeira, barrenta ou espanhola (porque em Cáceres fazia-se uma idêntica), com barras brancas, castanhas, amarelas, verdes e vermelhas.

Nos percursos da transumância, quando os pastores eram confrontados com lobos, defendiam-se com o cajado e esta manta – o animal não reconhecia nas suas cores fortes a sua matriz de alimento, ficava confuso, desfocava-se do alvo. Hoje, os cobertores de papa são usados também em decoração, e até já desfilaram nas passarelas, pela mão da designer de moda Alexandra Moura.

# Outras peças
O museu vende cobertores de papa e outras peças nesse material, como pantufas ou pregadeiras; e ainda tapetes e mantas de trapos feitos de roupa velha ou garrafas de plástico recicladas.

# O último tecelão
José Manuel Teles, de 57 anos, começou aos 12 a fazer cobertores de papa, na fábrica de tecelagem da sua aldeia – Meios, a quase mil metros de altitude -, que produzia, diariamente, 48 cobertores. Cada tecelão devia tecer seis ou sete cobertores por dia, para ganhar 20 escudos. José é apresentado como “o último tecelão” de Meios. Não se tem conseguido conquistar sangue novo para um ofício tão duro.

Tecelão José Teles (Fotografia: Maria João Gala/GI)

 

# Como tudo começou
O cobertor de papa nasceu na Guarda, primeiro em Meios e Trinta (a primeira aldeia a ter luz elétrica no distrito), depois em Maçainhas. Em povoações muito ligadas à pastorícia, havia que dar uso à lã das ovelhas, no fim da tosquia. E o Mondego ajudou: a lã era lavada e fiada em engenhos ao longo do rio, antes de ir para o tear, onde havia várias etapas a cumprir. Uma delas era encher as canelas (uma canela dá cerca de 15 centímetros de cobertor), tarefa desempenhada, outrora, por crianças e idosos, para poupar na mão de obra. Do tear, as peças, chamadas pisas, seguiam para o pisão, onde eram postas numa tina com água e grede, uma terra avermelhada que servia de detergente; depois de serem pisoadas (batidas), o pelo era cardado (puxado) e secavam ao sol. Hoje, já não se recorre aos processos antigos.

 

# As cores
As barras brancas e castanhas nos cobertores de papa eram feitas com lã de ovelhas brancas e castanhas ou pretas, respetivamente. Para obter outras cores, tingia-se a lã, antigamente, com produtos naturais, como casca de noz, conta o tecelão José Manuel Teles.

 

Museu de Tecelagem de Meios
Rua Direita, s/n.º, Meios, Guarda
Tel.: 271591046
Das 9h às 12h30 e das 13h30 às 17h. Encerra ao domingo.
Entrada livre




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