Três dias em Amarante, à boleia do Universo do Vinho Verde

Casa de Cello (Fotografia de Artur Machado/GI)
Três dias dedicados ao vinho verde dão pretexto a uma visita mais prolongada à região. Entre provas e conversas sobre vinho, faz-se o convite a passear pelas vinhas e conhecer in loco os produtores que participam na sexta edição do UVVA, com paragens para saborear a gastronomia local e a arte que envolve a cidade.

O Universo do Vinho Verde Amarante (UVVA) regressa ao claustro do Convento de São Gonçalo de 16 a 18 de junho, para celebrar o Vinho Verde com um programa recheado de provas de vinhos, sessões de showcooking, conversas temáticas e atuações musicais. Pelo segundo ano consecutivo, além de se dedicar à mostra a promoção do que de melhor se faz na região dos Vinhos Verdes, o UVVA dá ainda um reconhecimento, através do Concurso de Vinhos, que atribui prémios em diversas categorias.

António Sampaio, filho, e António Sampaio, pai, da AJTS (Fotografia de Artur Machado/GI)

 

Nesta sexta edição do evento são esperados mais de 30 produtores, que ao longo dos três dias irão dar a conhecer as suas referências aos visitantes. Entre os projetos amarantinos a marcar presença estão os vinhos AJTS, produzidos na Quinta da Ribeira, em Gatão. Esta pequena empresa familiar nasceu há 30 anos, quando António José Teixeira de Sampaio comprou uma quinta na margem direita do rio Tâmega, naquela freguesia afamada pelos seus vinhos tintos. Hoje, com o filho António Sampaio ao comando da enologia, e o filho José no desenho dos rótulos, são os vinhos brancos que representam a maior parcela de produção. Mas o ex-líbris da marca continua a ser um tinto 100% vinhão, o Vinha do Menino. “Foi o meu pai que plantou essa vinha e por isso dizemos que é o menino dele”, justifica o enólogo. “É o nosso vinho mais conhecido”, realça. Ainda assim, fruto do seu objetivo pessoal em criar vinhos de guarda – contrariando a tendência nos Vinhos Verdes – nasceu o Gentilis Grande Reserva, um branco que pede para esperar e que a família conta que venha a provar-se mais um sucesso.

Quinta de Carapeços (Fotografia de Artur Machado/GI)

 

Entre provas e conversas sobre vinho e as suas histórias, dificilmente não surgirá a vontade de ir conhecer in loco alguns destes produtores. A Quinta de Carapeços, em Travanca, é uma das que disponibiliza provas e almoços personalizados (por marcação). Estando bom tempo, tira-se partido do jardim da propriedade, e em dias mais frios ou chuvosos, abre-se a casa da família Abreu, particularmente a sala de jantar ou uma sala de leitura mais intimista, com janelas abertas para as vinhas que envolvem a habitação. A paisagem nem sempre foi essa. Antes da reformulação dos terrenos agrícolas, nos anos 1980, aquelas terras eram retalhos de diversas culturas, e a vinha existia essencialmente em ramada.

A reconversão para bardos veio otimizar a produção de uva, que até surgir a marca, há 20 anos, era vendida à cooperativa local. “O primeiro registo que há de ligação da Quinta de Carapeços à nossa família é de 1338, daí aparecer essa data no nosso rótulo”, diz Miguel Abreu, que enaltece ainda o papel da Quinta de Carapeços como precursora na introdução do alvarinho fora da sub-região de Melgaço-Monção. A casta branca predomina nas vinhas da propriedade, onde existem ainda parcelas de trajadura, espadeiro e vinhão.

Casa de Cello (Fotografia de Artur Machado/GI)

 

Outro produtor local que se orgulha de ser pioneiro nos Vinhos Verdes é a Casa de Cello, no caso por rejeitar a adição de gás e açúcar nos seus vinhos, desde o primeiro lançamento, em 1997. Oito anos antes, João Pedro Araújo regressava dos seus estudos em Bordéus com a ideia de profissionalizar a vinha e a produção de vinho na Quinta de Sanjoanne, na sua família desde 1891. Desviou-se daqueles que eram os moldes da produção vitivinícola da região, e assume-se, desde então, como “viticultor independente”, controlando todo o processo, desde a vinha até à garrafa, e adotando o mínimo de intervenção na adega, para que os vinhos sejam um reflexo do terroir.

A oferta de enoturismo da Quinta de Sanjoanne contempla visitas personalizadas, que começam com um passeio ao jardim da bonita casa setecentista que figura nos rótulos. Segue-se a vinha e adega, que ocupa o antigo beiral da quinta, e termina com uma prova de vinhos, que pode incluir referências das duas propriedades da Casa de Cellos e acompanhar com uma tábua de charcutaria. Para visitantes mais curiosos, está também disponível uma prova avançada, que dá acesso, por exemplo, a vinhos antigos ou a provas de vinhos diretamente da adega.

Vila Coura (Fotografia de Artur Machado/GI)

 

Havendo vontade de prolongar este mergulho nas quintas vinhateiras de Amarante, encontra-se em em Vila Caiz, um alojamento que permite acordar a olhar a vinha. O Vila Coura é composto por nove casas rurais recuperadas, mantendo a traça original, e dotando-as de um recheio cómodo e elegante. Cada um dos alojamentos – na sua maioria de tipologia T1 – foi batizado com o nome de uma casta típica da região dos Vinhos Verdes, e há detalhes da decoração que remetem para o mundo da viticultura. Todas as casas estão equipadas com kitchenette e algumas têm também lareira, como é exemplo a casa Vinhão, a única com dois quartos, e que tem ainda acesso direto à piscina exterior. Os vinhos produzidos na propriedade são servidos na sala de estar e receção amadeirada ou na esplanada que ocupa a antiga eira da quinta.

Vila Coura (Fotografia de Artur Machado/GI)

 

O vinho na mesa regional
Abrindo o apetite, o restaurante Pena, a menos de cinco minutos do Vila Coura, oferece uma carta de clássicos, como o bife wellington, a bochecha de porco com batata doce, o bacalhau com broa e o arroz de lavagante e pescada. Pesam de igual forma nestes e outros pratos, a apresentação cuidada de uma mesa contemporânea e os sabores apurados que se esperam de uma cozinha de conforto. O restaurante está instalado num antigo edifício do século XVIII onde funcionavam os lagares e o alambique da Quinta da Pena, propriedade que pertence à família de Amadeo de Souza-Cardoso, e é um dos seus descendentes, Miguel Cardoso, quem toma as rédeas do projeto. Pelas paredes da sala aconchegada por uma lareira, ainda se mantém viva a memória do pintor modernista, mas no verão, o pátio à entrada torna-se o lugar mais apetecível para uma refeição no Pena, que tem para acompanhar uma bela seleção de vinhos da região. Para mostrar este casamento, na sexta-feira, dia 16, Miguel vai orientar uma sessão de showcooking no UVVA.

Restaurante Pena (Fotografia de Artur Machado/GI)

 

No sábado, dia 17, é a vez do chef Rui Ribeiro, do Ciao Tílias, levar a sua receita de risoto de robalo com miolo de amêijoas e redução de vinho branco ao balcão do UVVA. O prato, confecionado com uma das referências da Quinta da Calçada, integra a carta deste restaurante italiano aberto no verão passado em frente ao Tâmega, junto à ponte de São Gonçalo. É um dos projetos mais recentes do grupo Casa da Calçada, e prima por uma agradável esplanada coberta, com vista para o rio, assim como um menu para todas as horas. Se ao almoço e ao jantar brilham as pizas de massa romana e as pastas variadas, durante a tarde entra em vigor uma lista de focaccias, baguetes, tábuas de queijos e enchidos, e taças de gelados. Os cocktails são outro dos trunfos do espaço, que irá inaugurar o Tilinhas Summer Club, dedicada às bebidas e snacks, acompanhados por música ao vivo e DJ sets.

Ciao Tílias (Fotografia de Artur Machado/GI)

Ciao Tílias (Fotografia de Artur Machado/GI)

 

Artes e letras amarantinas
A escritora Agustina Bessa-Luís é a personalidade homenageada nesta edição do UVVA. A autora nasceu em Vila Meã, em 1922, num ambiente rural que marcou fortemente a sua obra, com várias referências à tradição vitivinícola de Amarante, como é exemplo o excerto d’”O livro de Agustina”, onde diz: “Sou um produto da região, como o vinho verde, que não embriaga, mas alegra”.

No âmbito do seu centenário, a Biblioteca Municipal Albano Sardoeira e o pólo de Vila Meã acolhem até ao final do ano uma série de mostras bibliográficas e documentais sobre a vida e obra da escritora. E o Museu Municipal de Amadeo de Souza-Cardoso – porta de entrada para o claustro do Convento de São Gonçalo, onde se realiza o UVVA – tem patente uma exposição inspirada nas palavras da romancista no livro “Dicionário Imperfeito”.

Museu Municipal de Amadeo de Souza-Cardoso (Fotografia de Artur Machado/GI)

 

Em “Feminino, uma história ficcionada”, reúnem-se quase três dezenas de peças da coleção do museu, que evocam o universo feminino e dialogam com excertos deste e de outros títulos. Entre as obras de artistas como Amadeo de Souza-Cardoso, António Carneiro, Acácio Lino, Júlio Pomar, Sara Afonso, Barata Feyo e Paula Rego, destaca-se um desenho de Maria Antónia Siza Vieira, exposto pela primeira vez, e um busto de Agustina Bessa-Luís, da coleção do escultor Helder de Carvalho.

Café Bar São Gonçalo (Fotografia de Artur Machado/GI)

 

Outro ponto de encontro das artes e letras amarantinas, o histórico Café Bar São Gonçalo – quase a chegar aos 90 anos – ganhou uma nova vida, sob direção dos irmãos Miguel e João Pedro Antunes. O espaço frequentado por Teixeira de Pascoaes, Mário Cesariny, Maria Eulália Macedo e outras personalidades, exibe agora um visual mais contemporâneo, que mantém viva a memória do seu legado, em apontamentos rétro, e uma alcatifa colorida, inspirada numa das pinturas de Amadeo de Souza Cardoso, que se desenrola da escadaria até ao piso superior, em jeito de mezanino. Ali, uma oferta gastronómica renovada, a cargo da chef Ânia Robim, contempla pratos como o arroz de tamboril e lagostim, a vitela em massa filo, com queijo da Serra e alho-francês, ou um pastel de nata desconstruído, a encabeçar a lista de sobremesas.

Café Bar São Gonçalo (Fotografia de Artur Machado/GI)

 

Leitão bísaro e vinho da casa
O restaurante fundado pelos irmãos Vítor, Agostinho e Francisco José – os Filhos de Moura – na tranquila aldeia de Aboim, em 2009, é uma referência para os amantes de leitão assado. Tudo começou com a criação de porco bísaro. “A ideia era fazer fumeiro”, desvenda Agostinho, mas umas primeiras experiências a assar leitões para os amigos acabou por ditar outro destino. Os pedaços de carne, assada em forno a lenha, chegam à mesa acompanhados por um molho apimentado, batatas fritas, salada e laranja às rodelas. E no copo vai habitualmente o vinho da casa, de produção própria, ainda que não faltem os espumantes. A reserva é obrigatória.

Filhos de Moura (Fotografia de Artur Machado/GI)

 

Dormir rodeado de vinhas
Todos os quartos do Monverde têm vista para o mar de vinhas que rodeia o hotel, mas destacam-se as dez Wine Experience Suites, com piscina privada, lareira, enoteca e serviços personalizados. O primeiro hotel vínico da região nasceu em 2015, na Quinta de Sanguinhedo, em Telões, propriedade pertencente ao universo da Quinta da Lixa, um dos maiores produtores da região dos Vinhos Verdes. O complexo conta ainda com um restaurante de cozinha de autor, spa e uma dezena de experiências ligadas ao vinho.

Monverde (Fotografia de André Rolo/GI)

 

UVVA 2023

100 Igual
3 Rostos
ABValley Wines
ACampos
AJTS
Calçada Wines
Casa da Tojeira
Casa de Cello – Quinta de
Sanjoanne
Casa de Vila Pouca
Casa do Barroso
Dos Santos
Encostas do Mouro
Enoport Wines
GULA
Heitor
O Louzadense
PROVAM
Qta Pereirinhas
– Foral de
Monção
Quinta da Chouza
– Chão do Rio
Quinta da Levada
Quinta da Lixa
Quinta da Samoça
Quinta de Carapeços
Quinta de Maderne
Quinta de Santa Cristina
Quinta de Santiago
Quinta do Silvoso
Quinta dos Encados
Quinta Rodelo Velho
Quintas de Caiz
Quintas de Vila Garcia
Soc. Vin. Jóia Gatão
Val de Luzes
Vinho Carreiro
Vitimarante




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