Festival Iminente está de volta a quatro bairros de Lisboa

A programação inclui workshops comunitários. (Fotografia: Pexels/DR)
A cozinha da associação Passa Sabi, no Bairro do Rego, em Lisboa, acolhe a "culinária inclusiva" da chefe Luísa Mafei, convidada de um dos projetos que o festival Iminente tem em curso em quatro bairros "sensíveis" da capital.

Uma dezena de ajudantes divide tarefas: uns amassam o hambúrguer de cogumelos e feijão preto, outros fritam-no e acrescentam-lhe cebola caramelizada, outros ainda fazem o arroz e uma maionese sem ovos. O queijo vegetal à base de caju já está pronto, em cima da mesa, à volta da qual todos se concentrarão dali a nada, saboreando o que estiveram a preparar.

“É um tipo de culinária inclusiva que mantém a lembrança afetiva do hambúrguer”, descreve Luísa Mafei, assinalando que a receita encontra substitutos para carne, ovo e queijo. Dali a pouco, será preciso limpar e arrumar e a chefe de “cozinha afetiva” há de ter de insistir com os rapazes para também participarem nessas tarefas.

A sessão “Cozinhar para Prosperar” faz parte da terceira edição da iniciativa “Bairros: Workshops Artísticos Comunitários Iminente”, que decorre durante o verão e envolve mais três bairros: Alta de Lisboa (Associação de Moradores do PER 7 e Associação do Bairro da Quinta Grande), Vale de Alcântara (Associação Clube de Boxe Paulo Seco) e Vale de Chelas (Associação Geração com Futuro).

De um leque variado de propostas, a associação Passa Sabi, no Bairro do Rego, escolheu as artes visuais (com Márcio Carvalho), o vídeo (com Diogo “Gazella” Carvalho) e a arquitetura (com Nuno Pimenta).

A quarta escolha recaiu na culinária, para responder ao aumento da obesidade infantil e criar um produto gastronómico do bairro para ser vendido no futuro.

“Temos na comunidade algumas pessoas obesas, principalmente jovens, e a ideia era eles terem uma alimentação mais saudável e saberem o que devem comprar”, diz Musho, presidente da Passa Sabi, contando que em pouco dias transformaram a loja que acolhia um atelier de tempos livres numa cozinha, que agora “é de todos, mesmo de outras comunidades”.

Este espírito de entreajuda está vertido nos ‘graffiti’ pintados nas paredes dos bairro – “Todos precisamos de todos” -, que a Passa Sabi quer transformar numa “galeria a céu aberto”.

Um dos próximos desenhos, virado para “os prédios da venda livre” na zona de Entrecampos, lembrará que “A cidade também mora aqui”, porque “muitas vezes as pessoas não atravessam a estrada para passar nas comunidades”, recorda Musho.

“O nosso objetivo também é trazer as pessoas à comunidade, […] para […] perceberem que os bairros não têm só coisas negativas, têm pessoas trabalhadoras, pessoas honestas, pessoas capazes”, destaca.

O trabalho que o Iminente desenvolve nas comunidades desde 2021 “faz todo o sentido”, considera o dirigente associativo, distinguindo a atuação do festival de outras entidades que visitam a comunidade, “sem perguntar” a opinião de quem lá vive.

“As coisas estão aí abandonadas ou não são utilizadas. Está bonito, mas as pessoas não se identificam”, relata.

“Tem de ser algo que faça sentido. Não queremos só para ficar bonito, não é o suficiente para nós. Queremos algo que tenha impacto ou mesmo para criar polémica também, para meter as pessoas a pensar”, diz, reclamando “uma voz”.

O projeto Bairros é uma co-organização do Iminente e da Câmara Municipal de Lisboa, a que se junta, nesta edição, a Gebalis, empresa municipal que assegura a gestão nos bairros.

Porém, o programa é decidido com os parceiros locais, “no sentido de, em conjunto”, determinar “o que é que eles precisam, do ponto de vista cultural e artístico”, descreve Carla Cardoso, diretora do Iminente.

“É um projeto verdadeiramente comunitário”, destaca, explicando que o Iminente “faz a ponte” entre as comunidades e artistas de diferentes áreas, recorrendo a uma metodologia “pouco comum” em plataformas internacionais.

O objetivo é valorizar “o dito território periférico” e dar visibilidade aos artistas dessas comunidades e ao “trabalho incrível que se lá faz”, realça a ‘designer’ e gestora cultural.

“[N]a maioria destes bairros, destes territórios, as pessoas não têm férias, como nós as conhecemos, e, portanto, é também uma forma de, durante o verão, haver alguma programação divertida e que, ao mesmo tempo, desenvolve competências na comunidade”, destaca.

Nesta edição, estão previstos 16 ‘workshops’ comunitários de diferentes expressões artísticas, que o Iminente orienta, de junho a setembro, nos quatro bairros da capital, e que serão apresentados publicamente, nas comunidades, em setembro, e às “grande massas”, em outubro.

A “novidade” desta edição é que a curadoria das apresentações finais vai ser feita pelos líderes comunitários dos bairros.




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