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Como se ganham e perdem as estrelas Michelin?

Saiba nesta galeria algumas curiosidades acerca do processo de atribuição das estrelas Michelin
1. Ainda hoje não se sabe quantos inspetores cobrem a Península Ibérica, mas é um facto mais ou menos conhecido que são praticamente todos espanhóis.
2. Os estabelecimentos podem apresentar-se por e-mail e solicitar uma visita, mas é o guia que decide como, quando e quem avalia.
3. Durante as visitas aos restaurantes, e para falarmos apenas da comida – porque em linha de conta entram igualmente o serviço, a decoração, a lista de vinhos, a frequência –, os inspetores evitam tomar notas para não dar nas vistas. É um trabalho de memória e de análise, em que tentam decifrar cada ingrediente, avaliar a qualidade dos produtos, o rigor técnico (consistência e precisão são fundamentais) e o equilíbrio das combinações, das texturas. Só depois vem a criatividade.
4. Em cada restaurante visitado, além da comida, têm ainda de prestar atenção a outros detalhes que contam para a avaliação como a limpeza das casas de banho, o nível dos equipamentos, o ambiente, entre outros fatores.
5. No relatório-padrão que preparam no final, com várias entradas e um sistema de classificação e notas, dão conta de cada ingrediente que comeram, das técnicas usadas e de tudo o mais que seja relevante desde a marcação da mesa por telefone até ao momento em que pagam a conta.
6. As visitas são sempre anónimas, a não ser depois de pagarem a conta, se anunciam para recolher informações práticas do estabelecimento – contactos, capacidade e, detalhe a não subestimar, a duração do contrato de arrendamento (importante para avaliar se é uma aposta a longo ou curto prazo).
7. Sempre que um restaurante está em iminência de ganhar uma estrela, a Michelin chega a enviar quatro a seis inspetores, em períodos diferentes, para se certificar de que não há falhas graves.
8. Nas reuniões anuais das quais saem os resultados finais, a prudência reina e, mais do que apenas a comida, a pergunta é de ordem psicológica: este chef e este restaurante, por tudo o que implica (em termos de qualidade, negócio e ambição), estão preparados para uma, duas, três estrelas?
9. A atribuição da primeira estrela que dizer que um restaurante se distinguiu da média e que a sua cozinha vale a visita. A segunda premeia a consistência de uma cozinha já evidenciada, mas em linha de conta entram fatores como serviço de sala ágil, boa carta de vinhos e o ambiente. A terceira assinala a excelência a todos os níveis.
10. Ter estrelas não sai barato. Num restaurante «normal», estima-se que os custos consumam cerca de 60 por cento dos ganhos, proporção que pode subir para 80 por cento ou, muitas vezes, saldo negativo nos estrelados devido ao investimento em produto, equipa, despesas de manutenção (da renda à lavandaria), equipamento (cozinha, roupa, loiças, copos) e melhorias.

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Estava anunciado e cumpriu-se. À duplicação do número de estrelas em território nacional na edição de 2017 do Guia Michelin, não será estranha a boa fase que a alta cozinha atravessa no nosso país – ou a nossa crescente exposição como destino turístico –, mas muitos veem nesta «operação de charme» uma intenção real, por parte dos responsáveis do guia, de promover uma maior aproximação à nossa realidade.

Claro que ainda estamos longe do ideal. O guia foi criado numa época diferente, em que tudo era muito mais simples e a gastronomia francesa uma referência incontornável que servia de bitola a todas as outras. O mundo mudou; a cozinha também. A ascensão ao estrelato das gastronomias japonesa, norte-americana ou espanhola, por um lado, e de outras emergentes (como a brasileira ou a peruana), por outro, obrigou a Michelin a dar o braço a torcer em algumas questões para travar a queda de vendas do guia e os avanços da concorrência, mas não a abdicar da abordagem demasiado «técnica e formal» na suas avaliações.

Veja na fotogaleria, em 10 passos, como se consegue alcançar, ou não, uma estrela Michelin.

A aura de mistério, somada ao facto de que os responsáveis pelo guia sempre foram vagos em relação ao número efetivo de inspetores que trabalham para si, contribuiu para gerar rumores e alimentar suspeitas, mas há coisas incontornáveis: a maioria das publicações que tentou competir, cedo ou tarde, deparou-se com a necessidade de aceitar refeições oferecidas ou de fazer permutas de publicidade nos seus guias para cobrir custos.

Uma cedência que ninguém ainda conseguiu imputar à Michelin, que continua a assegurar as despesas dos seus enviados e goza por de um estatuto sem comparação. Será por isso muito difícil ultrapassar, em peso e credibilidade, o impacto dos resultados anuais anunciados pelo célebre Guia Vermelho.

 

Adaptado a partir de um artigo publicado originalmente na revista Evasões de 2 de dezembro de 2016.

 

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