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As origens e as curiosidades sobre os pratos natalícios

Bolo-rei, bacalhau, polvo, peru e capão e rabanadas: percorra a fotogaleria para conhecer curiosidades e factos sobre alguns dos alimentos mais presentes nas mesas dos portugueses no Natal.
Bacalhau A configuração seca e salgada, pronta para a despensa, é a mais clássica do bacalhau entre os portugueses, que por razões diversas se habituaram a chamar-lhe fiel amigo. São contudo dois os aspetos mais importantes do qualificativo popular. Por um lado, estava presente na mesa nacional mesmo nos mais de cem dias de guarda ao longo do ano em que havia a imposição religiosa do jejum e abstinência, e por outro mesmo os mais pobres conseguiam o seu bocado de bacalhau para num dia de festa demolhar e alegrar a família. Não espanta por isso que o bacalhau pontifique na mesa portuguesa em várias declinações, e que na consoada seja ele próprio homenageado, o povo português deve-lhe muito. A esse sentimento de gratidão junta-se no Natal a couve que nos rigores do frio é curtida pela geada tornando-se mansa e tenra e outros dois produtos, da capoeira o ovo, da horta a batata. Ambos sinais de abundância e mantença, por isso presença à mesa de Natal, tudo regado com o ouro líquido que é o azeite.
Bolo-rei Le gâteaux des rois, chamava-se originalmente, quando o incontornável Balthazar Castanheiro Junior, filho do fundador da Confeitaria Nacional, em Lisboa, o provou e tomou nota numa incursão a Paris em 1875. O bolo em França era apenas produzido na altura da festa dos Reis, em janeiro, mas o mestre pasteleiro português viu nele novidade e interesse para os seus clientes e começou a produzi-lo diariamente. Como era normal na época e de certa forma hoje ainda é, a massa base é de brioche a que se junta frutos cristalizados e secos, depois adornado com pedaços coloridos como adornos da coroa real. Intensifica-se a produção e o consumo na altura do Natal mas um pouco por todo o país há casas que o fazem todos os dias e raramente sobra. A partir do bolo-rei criou-se variantes como o bolo-rainha, que não tem fruta cristalizada, apenas frutos secos, começou a fabricar-se bolo-rei de chocolate e muitos outros. Tradição bem viva e avivada por muitos pasteleiros, o bolo-rei tornou-se indispensável nas Festas natalícias.
Peru e capão O peru é originário da América Central e disseminou-se pelo mundo inteiro como ave de criação de grandes proporções de que se aproveitava tudo. Aconteceu por ação comercial intensa dos mercadores turcos que atravessavam o Atlântico e aportavam em Inglaterra e na América do Norte. Por incrível que pareça, apesar de originária do México entrou no território americano trazida de Inglaterra pelos turcos, pelo que foi batizada de «turkey», hoje sinónimo de peru em inglês. Os franceses chama-lhe «dinde» - lê-se dande - por ser para eles «la poularde des indes», a galinha das Índias Ocidentais. Os espanhóis chama-lhe pavo, pela configuração viva semelhante à do pavão, alusão mais ao aspeto ornamental do que gastronómico da grande ave. Nós portugueses, chamamos-lhe peru pura e simplesmente porque naquele tempo tudo o que vinha da América do Sul dizia-se que era do Peru. Deu grandes passos e está pronto a voar o nosso Capão de Freamunde, agora já com Indicação Geográfica Protegida (IGP), pelo que há que o procurar e exigir. Ave genuinamente portuguesa, de assado copioso, para a família inteira.
Rabanadas Pegue num pão, tire-lhe a côdea ou não, ensope-o em leite adoçado e prepare-o para fritar em óleo fervente, como se de filetes ou peixinhos da horta se tratasse, ovo inteiro batido, imediatamente a seguir passe em açúcar e canela e deixe arrefecer em travessa. De repente, cumpriu um dos desígnios doceiros mais antigos do país e se percebeu que em fatias é melhor do que inteiro, as rabanadas são fatias douradas e servem para expor em casa à mercê da família, aproveitamento sublime do pão com mais de dois dias. Os bolinhos de jerimu - abóbora - cumprem ritual semelhante e é no Natal que são bons, quando as abóboras despontam e se nos insinuam na horta e no mercado. Os fofos e as filhós seguem vias semelhantes, mais a sul que a norte temos os coscorões, fritos inefáveis pela crocância e simplicidade de consumo, já que dispensam prato e talher. Mas devemos sempre ficar pelo mais simples e quem não tem rabanada, pelo Natal não tem nada.

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É bem verdade o aforismo «dos santos ao Natal vai um salto de pardal». Em Portugal os santos populares já são momento de ir até à praia e de andar mais devagar na vida, depois vêm o fim das aulas e as transumâncias típicas das férias. Substituímos a mesa pelo carvão a que damos vida nos recantos, jardins e varandas que nos surgem ou para que somos convidados. Sardinhas, febras, fruta, legumes, de tudo um pouco sacrificamos nas brasas, na companhia dos amigos e da música.

De repente, impõe-se o outono, com as chuvas – infelizmente tardias este ano – e o frio a chamar-nos para dentro de casa, quando não mesmo a fazer-nos acender as lareiras e a aquecer a casa. Os portugueses não são os maiores foliões do mundo, mas são dados à festa e alegram-se com muito pouco.

Quando se aproximava o Natal, o calendário litúrgico marcava o quotidiano com a privação do prazer da mesa em quase todas as frentes, fazia-se alheiras e demais enchidos, começavam as matanças do porco e o abate dos animais mais copiosos, além de começar a caça, com o receituário que ainda hoje tão bem conhecemos e celebramos. No Natal faz-se a maior festa da mesa e sempre se pautou pela liberdade total a reunião familiar. Daí dizer-se que «do Natal ao Entrudo come-se tudo».

Só voltávamos ao recolhimento com a chegada da quaresma, num jogo cíclico que tacitamente sempre aceitámos. Impressiona do ponto de vista gastronómico o ecletismo dos portugueses e o quanto aprendemos, em todos os momentos importantes, a celebrar o sabor e os bons momentos em família. Bom Natal!

 

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