Graciosa: o que conhecer na ilha branca açoriana

Ilha da Graciosa, Açores (Fotografia de Orlando Almeida/GI)
É o território menos montanhoso do arquipélago dos Açores, o que não lhe compromete o encanto. Das queijadas às termas, dos moinhos aos monumentos naturais, estar na “ilha branca”, como assim a apelidou Raul Brandão, é ficar mais próximo da vida sem pressa e da graciosidade dos lugares e das gentes.

Todas as ilhas têm uma nuvem sua, uma nuvem própria, independente das outras nuvens e do céu, e com uma vida à parte no universo”, assim escreveu Raul Brandão, em 1926, no livro “Ilhas Desconhecidas”. A obra terá eternizado a cor da Graciosa, a de “Ilha Branca”. O traquito, tipo de rocha vulcânica de cor esbranquiçada, predomina, mas o verde é tão avassalador aqui como em qualquer outra parte dos Açores. Tem também outras tonalidades: a cada passo que se percorre, os moinhos e os faróis dão rasgos vermelhos e cinzentos à paisagem. A este elemento do grupo central do arquipélago perdoa-se tudo, até o vento revolto, que nos envolve na chegada ao aeródromo.

Não se consegue dizer bem o que é, mas quem a visita consegue perceber o porquê de ser chamada de Graciosa. Lançámos algumas hipóteses: as vistas desafogadas, sem grandes relevos, e a simpatia dos habitantes, que falam da sua “casa” sem grande pretensão. É a segunda ilha mais pequena dos Açores e, apesar da ausência de escarpas galopantes, vale-se da harmonia e dos pontos dignos de roteiro para nos encantar. Como a Caldeira da Graciosa, a formação geológica que nasce de um “vulcão ativo, mas adormecido”, afirma Sandra Lourenço, técnica superior no Centro de Visitantes da Furna do Enxofre, localizado em Santa Cruz da Graciosa. É ali que se tem a oportunidade de entrar numa caverna lávica, no meio de muito verde. O local está classificado, desde 2007, como Reserva da Biosfera da UNESCO.

Graciosa é conhecida como a “ilha branca”. (DR)

Na entrada do centro, há um painel que informa sobre os níveis de dióxido de carbono. Caso sejam elevados, o que geralmente acontece no verão, a visita à furna não pode ser feita. Quando a Natureza assim o permite, desce-se à caverna por uma torre, que tem uma escadaria de 37 metros de altura e é composta por 183 degraus. Não é uma atividade física fácil. Na descida, é possível fazer um intervalo nas várias aberturas e ver o topo e o fundo da furna. Na subida, prepare-se para ficar um bocadinho ofegante. “Os visitantes não se podem aproximar da água”, avisa Sandra Lourenço, sobre o lago na base que emite uma fumarola. A terceirense, a viver na Graciosa há 15 anos, já presenciou situações caricatas, como um grupo de estrangeiros que, de toalha de praia, pensavam ser possível ir a banhos no vulcão. Não é.

Uma mistura de rochas e vegetação moldam o cenário da Furna do Enxofre, num ambiente escuro e húmido. Para conforto e segurança dos visitantes, foi construída uma espécie de vedação em madeira que os leva até mais perto da base do vulcão. Não é de agora que a Caldeira da Graciosa se tornou local de visita e romaria. “No verão, temos muito movimento”, refere a técnica. Contudo, é quase impossível imaginar, em 1879, o príncipe Alberto I do Mónaco a chegar ao fundo da furna agarrado por uma simples corda. O membro da realeza foi um dos primeiros visitantes e tornou-se um importante impulsionador da caldeira. A torre só seria edificada no início do século XX e mantém-se assim até aos dias de hoje.

Termas à beira-mar

Em pleno Parque Natural da Graciosa, e ainda nas imediações da caldeira, não faltam lugares para simplesmente estar, desfrutar de passeios em trilhos ou aproveitar para recarregar as baterias em piqueniques. Há um parque de merendas com assadores, mesas e bancos dentro do monumento natural. E se o intuito for mesmo relaxar e fazer o tempo parar por alguns minutos, saiba que as Termas do Carapacho estão apenas a 16 minutos de carro. Localizada numa das zonas balneares de eleição da Graciosa, na freguesia da Luz, a estância tem uma piscina interior com temperaturas entre os 35ºC e os 40ºC. A atividade termal remonta a 1750 e desde então se fala das propriedades milagrosas da água. Nada como experimentar.

Furna do Enxofre (Fotografia de Orlando Almeida/GI)

Em frente às termas, há as piscinas naturais do Carapacho. Uma água bem mais fresca e aconselhável a banhos na época da primavera e do verão. Integrada na paisagem entre rochas basálticas negras, o azul do oceano salta à vista com naturalidade. Diz-nos o Rodrigo, um dos nossos guias na Graciosa, que esta zona é equivalente ao “Algarve no continente”. Cheia de vida no verão e mais serena no outono e no inverno. Lá em cima, no Farol da Ponta do Carapacho, na Ponta da Restinga, conseguimos ter um vislumbre das ilhas Terceira e São Jorge, sobretudo nos dias mais amenos. Na Graciosa, nunca estamos verdadeiramente sozinhos.

Que o diga Franco Ceraolo, o cineasta italiano que trocou Roma pela Graciosa e mostrou à ilha como um burro autóctone pode ser motivo de orgulho e até de companhia. Na chegada à quinta de Franco, hoje com 67 anos, na freguesia de Guadalupe, os animais aproximam-se dos forasteiros. Cada um deles tem um nome e, parece-nos, que não lhes falta personalidade. Alguns chegam até nós movidos pela curiosidade, outros à espera de um mimo. Separa-nos um muro de pedra, que não inibe nenhum deles de querer conhecer quem vem lá. Cientes de que o burro anão da Graciosa se tornou cativante aos olhos dos turistas, os responsáveis pedem que não se dê alimentos, as tão desejadas cenouras, sem a sua autorização.

É verdade que não são a única raça autóctone de asininos no país. Também há o burro mirandês, no Norte de Portugal continental. Porém, quando Franco Ceraolo chegou à ilha no início de 2000, o burro-anão da Graciosa, que mede pouco mais de um metro, corria o sério risco da extinção. Não havia qualquer reconhecimento. Com a ajuda do Centro de Biotecnologia da Universidade dos Açores e a força de vontade do cineasta, a aprovação da Direção-Geral de Alimentação e Veterinária chegou em 2015. E assim nasceu a Associação dos Criadores e Amigos do Burro Anão da Ilha Graciosa. Em Guadalupe, Franco e a companheira Sandra recebem visitas e contam o caminho da preservação de um dos símbolos maiores da ilha. Mesmo que nem todos gostem da denominação de “ilha dos burros”.

Burro-anão da Graciosa. (Fotografia de Orlando Almeida/GI)

“As pessoas associam muito à pouca inteligência, mas os burros são um pouco mais teimosos”, explica Sandra Santos, de 49 anos. Se não quiserem sair de um determinado lugar, será difícil removê-los. O burro anão da Graciosa chegou a ter tanta população que poderia rivalizar em número com os habitantes. Os graciosenses contavam com o animal para os ajudar na agricultura, no entanto a mecanização assente em tratores tirou-lhes o lugar e o destaque. O casal reconhece a História da ilha e deixa que as fotografias do passado preencham as paredes de um pequeno anexo. São memórias de gentes, animais e lugares da vida na Graciosa.

Bem sabemos que quando se está de visita, a curiosidade leva a longas temporadas no terreno, mas nada como encontrar um lugar para descansar. Até porque estar na Graciosa é permanecer na tranquilidade. Mesmo que o tempo não pare, nem para turistas, nem para os locais. No Inatel Graciosa Hotel, no Porto da Barra, os 44 quartos de casal ou twin, as duas suites e as seis villas oferecem uma estadia inserida na Natureza e bem perto do mar. Independentemente do tipo de alojamento, há sempre janelas e varandas com vistas privilegiadas que nos envolvem num exterior cativante e muito verde.

Inatel Graciosa Hotel (DR)

A “procura pelo descanso” e a “beleza” da ilha são tidos como os atrativos de quem fica hospedado no hotel, localizado em Santa Cruz da Graciosa, de acordo com a diretora Sandra Ataíde. A graciosense de 40 anos tem recebido ali pessoas de muitas partes do país, incluindo turistas da ilha de São Miguel, e do Mundo. A unidade tem restaurante aberto para os hóspedes e o público geral e não faltam produtos regionais no menu. Há o alho certificado da Graciosa a temperar os pratos, como o camarão frito ao alhinho, as lulas em molho de alho, o bife vazia à casa e o “veggienara”, a opção vegetariana com espinafres, tomate e natas. Para a mesa ficar completa, brinda-se com um vinho Pedras Brancas, produzido em solo vulcânico.

Queijadas e não só

Durante a estadia, haverá várias oportunidades para provar os doces das Queijadas da Graciosa, seja numa merecida sobremesa ou somente num momento de gula. E desengane-se quem pensar que a doçaria da ilha se limita apenas às queijadas. “Os pastéis de arroz são também muito bons”, aponta Sara Félix, uma das responsáveis da empresa, juntamente com o irmão Paulo Félix. Para conhecer em pormenor um dos cartões-de-visita da Graciosa, o melhor é fazer uma visita guiada à fábrica. Ficará surpreendido por saber que o recheio dos doces é mexido à mão por uma pessoa e há pouca intervenção de maquinaria. O objetivo é levar os clientes de volta ao lar de Maria de Jesus Félix, a verdadeira impulsionadora da indústria das queijadas na ilha. Depois da morte da mãe, os irmãos Félix ficaram à frente do projeto.

Depois de sair da fábrica, e se o tempo ajudar, aproveite para dar um passeio pela freguesia de São Mateus, o único local da Graciosa com uma praia de areia. Dizem-nos que se está a tornar um ponto de eleição para surfistas, especialmente no outono e no inverno, altura em que o mar está revolto e as ondas desafiam os mais corajosos. A vista não desilude. Mas, se quiser ter um olhar ainda mais vasto sobre a Graciosa, volte novamente a Santa Cruz e suba até às três ermidas em redor da PRAÇA DE TOUROS. Da Ermida de Nossa Senhora da Ajuda, percebe-se o porquê de ser tão encantador estar aqui, sem pressa, a admirar a elegância da ilha.

Algo está a fazer com que o sistema não consiga mostrar a ficha ténica desejada. Pedimos desculpa pelo incómodo.




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