Por norma, quando se pensa na Figueira da Foz, surgem duas imagens: a praia e o casino. E, com eles, o Bairro Novo, construído, de raiz, para fins turísticos, num processo que começou em 1861 – havia que responder às necessidades de alojamento e diversão dos veraneantes, que chegaram a dispor de cinco casinos. “Em 1913, era a pastelaria Benard que servia os doces da cafetaria de um dos casinos – vinham de Lisboa, de comboio”, conta Frederica Jordão, responsável pela PÓ DE SABER – CULTURA E PATRIMÓNIO. Até ao fim dos anos 1970, muitos hotéis e restaurantes daquele bairro ainda fechavam no inverno, prossegue a antropóloga e museóloga, que há-de mostrar-nos outros atrativos da cidade, na zona antiga.
Dos vários programas disponibilizados pela Pó de Saber, o menos explorado é uma visita guiada a dois templos contíguos: a Igreja de Santo António, da Misericórdia – Obra da Figueira; e a Igreja de São Francisco, da Ordem Franciscana Secular da Figueira da Foz. A primeira é o que resta de um convento franciscano fundado em 1527. Tem esculturas dos séculos XVI a XVIII, altares do antigo Convento de Seiça e, no coro, um curioso cadeiral com 13 painéis alusivos à vida de Santo António. Já a Igreja de São Francisco data do século XIX. Está decorada com azulejos da fábrica Viúva Lamego, alberga o primeiro órgão de tubos da Figueira e um pequeno núcleo de arte sacra, igualmente visitável.
Além de dar a conhecer o património cultural figueirense, Frederica Jordão também o investiga. Um dos projetos em que colaborou, como antropóloga, prende-se com a BACHARÉIS CHARMING HOUSE, um alojamento novo, com sete quartos e dois apartamentos T1, nascido numa casa de 1878 que pertenceu a quatro gerações de magistrados, de várias famílias. Os atuais proprietários, os irmãos Vitória e Rafael Abreu, decidiram recuperar o passado do edifício ao saber que ali teria vivido Maria Laura Campos Paiva, apontada como uma das amantes de Salazar. Reuniram então uma equipa multidisciplinar, que incluiu a arquiteta Alane de Holanda e o historiador Francisco Queiroz, e coube a Frederica recolher as histórias de vida das duas últimas arrendatárias. Todo esse trabalho resultou, aliás, num livro com apresentação marcada para 26 de março, na Figueira.
O projeto de reabilitação procurou preservar a arquitetura da casa, a sua história e identidade. Daí que tenham sido deixados à vista elementos da estrutura original, em paredes e tetos, e haja revistas estrangeiras, de época, integradas na decoração. Essas publicações estavam no baú de um juiz que foi encontrado no sótão e pode ser visto na sala de leitura.
Quem apreciar livros antigos e raros tem, ali bem perto, a LIVRARIA MIGUEL DE CARVALHO, com nova morada desde dezembro. O livreiro antiquário aproveita as duas frentes de uma antiga sapataria para expor, rotativamente, partes do seu vasto espólio, composto por milhares de volumes, de temas diversos, como poesia, cinema, filosofia, botânica, cozinha ou viagens. A maioria passou por outras mãos, mas também há edições a estrear, de editoras independentes, incluindo a Debout Sur l’ Oeuf (DSO), do próprio Miguel, que ali recebe tertúlias e apresentações.
Se a fome apertar, ao lado está o GATO PRETO, uma tasca fundada em 1963 e que um tio-avô do livreiro frequentava, no regresso das fainas marítimas, antes de recolher ao lar. “Sempre foi uma casa de pescadores”, confirma Pedro Peixoto, que deu outra vida àquele espaço de vinhos e petiscos. Ele, designer gráfico que estende a sua criatividade à cozinha e, em tempos, participou no concurso Masterchef Portugal, continua a servir ali sopa, sandes, iscas, panados, copos de vinho e canecas de “explosivo” (vinho e gasosa), a que junta pratinhos tradicionais com o seu toque.
Diariamente, há 13 petiscos para saborear na rua. Pode ser sardinha de pijama (aberta e panada), ossos do pernil ou frango frito com mel e mostarda; sem esquecer as empadas Bem Boas, negócio que Pedro já tinha quando ficou com o Gato Preto. Existe prato do dia, opção vegetariana improvisa-se. Algumas coisas, no entanto, faz por manter – como a decoração castiça e a ausência de televisão e de contacto telefónico.
Cocktails, ostras e brunch
Vale a pena caminhar pelas ruas da cidade, de olhar atento às fachadas dos prédios, seguindo caminho até ao Forte de Santa Catarina, na margem direita da foz do Mondego. Ali, avista-se campos de padel e um edifício de linhas modernas, em madeira, projetado pelo arquiteto João Mendes Ribeiro para acolher o PURO, restaurante-bar inaugurado em julho.
Os sócios Pedro Nunes, Margarida Viana, Joana Aguiar e Rui Pedro Oliveira, que integram a direção do vizinho Tennis Club da Figueira da Foz, quiseram que aquele fosse um lugar para todas as horas. Por isso, a carta apresenta opções de pequeno-almoço (ao fim de semana, brunch), petiscos, pratos individuais e uma ampla lista de bebidas, que abrange cocktails, vinhos e sangrias. Tábuas, ostras e calamares são algumas das sugestões para partilhar, quiçá ao fim da tarde, na sala envidraçada ou na esplanada, que deixa ver o movimento dos barcos.
Outro espaço novo é o OLAIAS, no Centro de Artes e Espetáculos (CAE). No lugar de um restaurante encerrado com a pandemia abriu este, em maio, com outras propostas e outra gerência. À sua frente está Pedro Ferreira, escanção que foi diretor de restaurante e vinhos do portuense Pedro Lemos, com uma estrela Michelin; diretor de serviço em algumas edições do Comboio Presidencial; e ainda aproveitou o tempo livre para fazer estágios voluntários em casas estreladas, Mundo fora. Com o presente projeto, que partilha com a namorada, Mónica Gomes, realiza dois desejos: ter algo seu e estar mais perto de casa – é de Condeixa-a-Nova e, em miúdo, passava férias na Figueira da Foz.
Pedro trocou o fine dining por uma “cozinha de sabor” focada, sobretudo, no arroz carolino do Baixo Mondego. Aqui, reinam os arrozes, que podem ser de peixe, pato, rabo de boi ou cogumelos. São pratos feitos com tempo, com caldos muito apurados; comida de conforto saída do forno de barro, o tacho levado à mesa, a reforçar esse lado mais tradicional. Tudo isso sem descurar o serviço nem os pormenores – dos guardanapos, que são de pano, ao couvert, com manteiga de cabra e alcaparrões, em vez de azeitonas.
Sendo esta a casa de um sommelier, não espanta que a carta de vinhos tenha cerca de 150 referências. Quem quiser saber mais sobre o tema, pode sempre inscrever-se numa das suas masterclasses e fazer da Figueira lugar de aconchego no inverno, além de refúgio de verão.
Em casa da editora Bruaá
A BRUAÁ, que nasceu em 2008, na Figueira da Foz, como editora e estúdio de design, tem no Centro de Artes e Espetáculos (CAE) a sua primeira livraria – a outra fica no Convento São Francisco, em Coimbra. A oferta contempla sobretudo as artes visuais, bem como alguma literatura, explica Cláudia Lopes, que divide o projeto com Miguel Gouveia.
Dominam os livros de ilustração, design, fotografia e arquitetura, mas também há novelas gráficas, jogos didáticos e o que Cláudia apelida de “objetos singulares”: peças que dão bons presentes, da cerâmica aos acessórios de moda. Havendo espetáculos, a loja (que promove, regularmente, sessões de contos para crianças e adultos) abre uma hora antes. Ao lado, existe uma sala que acolhe exposições de ilustração.
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