Comer e passear pelos caminhos do Românico, em Lousada

É um pequeno tesouro por descobrir. Há monumentos que nos contam a vida passada, quintas escondidas na paisagem onde as vinhas adquirem agora os tons de outono, encontros com o cinema de animação e, claro, bons sítios para aconchegar o estômago.

Sete blocos de betão de diferentes tamanhos unidos por corredores de vidro. A arquitetura do recente Centro de Interpretação do Românico, um trabalho do atelier Spaceworkers, aberto há cerca de um ano, pode não ser entendida logo no primeiro olhar, mas uma breve explicação rapidamente desfaz as dúvidas. «O edifício está carregado de simbolismo. A porta por onde se entra é um arco de volta perfeita, uma característica do românico, os blocos de betão parecem prontos a ser trabalhados, para dar origem a um castelo ou a uma torre», partilha Joaquim Costa, guia interpretativo, explicando ainda a escolha do betão em detrimento do granito, «é o material da nossa época».

O equipamento está de portas abertas no centro de Lousada, desde 27 de setembro do ano passado, Dia Mundial do Turismo, e «é mais uma porta o território», afirma Joaquim, referindo-se à região do Tâmega e Sousa, que durante muito tempo foi associada apenas à indústria. Hoje, à gastronomia, à doçaria e aos vinhos verdes, junta-se o equipamento, que promove a Rota do Românico, composta por 58 monumentos, como igrejas, pontes, mosteiros, torres, ermidas e memoriais, salpicados pelos vales do Sousa, do Tâmega e do Douro. Tratam-se de edificações da Idade Média, caracterizadas pelo uso do granito, cujo centro ajuda a contextualizar nas suas seis salas temáticas, algumas interativas.

Desde a sala Território e Formação de Portugal, onde a romanização, os castro e os monumentos são projetados numa maqueta, com a ajuda de um ecrã tátil, até à sala Os Monumentos ao Longos dos Tempos, onde se observam imagens antigas dos monumentos, ferramentas e materiais de obras, a visita ocupa cerca de uma hora e dá a bagagem necessária, como informações e mapas, para se partir à descoberta. «A Rota do Românico é um projeto-âncora do território. A ideia é que as pessoas vejam os monumentos, comam nos restaurantes e fiquem nos alojamentos», refere Joaquim Costa. E mesmo no centro da vila, há duas novidades, boas opções para confortar o estômago antes, ou depois, de visitar alguns dos monumentos da Rota.

A Hamburgueria da Praça, a única hamburgueria artesanal de Lousada, é uma das novidades. Os 15 hambúrgueres de vitela, picanha, porco, frango e um vegetariano são servidos há dois anos numa casa restaurada quase bicentenária. «Tentamos recuperá-la sem alterar muito», explica Sérgio Machado, o proprietário, acrescentando que isso está à vista na casa de banho, que ainda mantém a banheira de pés. Ao todo, há duas salas para refeições e uma esplanada com vista para o Jardim do Monte do Sr. dos Aflitos, que se abre no verão. A poucos metros do jardim, fica o Best Food, o café de comida saudável de Daniela Ferreira, nutricionista. Saladas, tapiocas, tostas, açaí e smoothie bowls fazem parte de uma carta com opções vegetarianas, sem glúten e com produtos locais, que atrai muita clientela, sobretudo ao almoço.

Dali até qualquer um dos seis monumentos românicos que se encontram em Lousada – Ponte da Veiga, Torre de Vilar, Igreja do Salvador de Aveleda, Ponte de Vilela, Igreja de Meinedo e Ponte de Espindo – não são mais de 15 minutos, de carro, numa viagem que dá lugar a ver vinhas, casas senhoriais e quintas. O percurso também pode ser feito a pé, sugerindo-se para isso reservar um dia inteiro. Todos merecem uma visita, mas destaca-se sobretudo a Ponte de Espindo, ainda hoje usada, e tão bonita que à distância parece tratar-se de um quadro, as duas igrejas, e a Torre de Vilar, inserida no Parque da Torre de Vilar, que ajuda a reforçar a sua beleza.

A torre apresenta um pequeno centro interpretativo no rés do chão que pode ser visitado ao fim de semana. Durante os dias úteis, as portas abrem-se apenas por marcação. Vale a pena vencer os lances de escadas e apreciar a panorâmica, a 14 metros de altura, sobre as vinhas e o casario de Lousada e Felgueiras. Com atenção, encontra-se o Santuário da Senhora da Aparecida, palco de uma romaria em honra da Senhora da Aparecida, de 13 a 15 de agosto. No segundo dia é transportado o maior andor do país, com 22 metros, aos ombros de 80 homens, num momento de grande emoção.

A folhagem das árvores não deixa perceber mas o Alpha Lounge está mesmo ali ao lado. Miguel Santos abriu há quatro anos este espaço que reúne bar, esplanada e restaurante, com a envolvente privilegiada do parque. Durante o inverno, o bar abre sexta à noite e também à tarde durante o fim de semana, para servir tostas, francesinhas, crepes, gelados artesanais e uma trilogia de pregos de salmão, peito de frango e lombo de boi. As noites de sábado são embaladas por concertos ao vivo ou DJs, e cocktails na mão. No verão, o espaço abre durante a semana e o restaurante, que vai sofrer uma remodelação, vai acolher chefs convidados.

O cozido do Estrada Real. (Fotografia: Artur Machado/Global Imagens)

Uma outra possibilidade para comer em Lousada, passa por um dos clássicos da vila, o Estrada Real, cujo nome abrange ainda uma adega, um snack-bar e um hotel com 16 quartos. Na sala do restaurante, que está a celebrar 34 anos, os almoços demoram-se à volta de travessas de cozido, tripas ou rojões, em diferentes dias da semana. O bacalhau à Real, coberto com cebolada e maionese, o cabrito assado e os tenros filetes de polvo com arroz de tomate são outras opções, mas sugere-se guardar algum espaço para os doces que ali perto começaram a ser feitos pela bisavó de Cláudio Carvalho, atual proprietário, ao lado da mãe, Rosa Babo. Crocantes beijinhos d’amor e uma fatia fofa de pão-de-ló dão por terminado a repasto da melhor forma.

QUINTAS, CINEMA E VINHO
Passados os portões verdes do número 921, da Rua Rui Feijó, surge uma casa oitocentista pintada de cor-de-rosa. Subindo-se meia dúzia de escadas em pedra, ocupadas por abóboras colossais, entra-se na Casa Museu de Vilar – A Imagem em Movimento, onde o premiado realizador e produtor Abi Feijó, membro da Academia dos Óscares desde julho, nos guia pelo mundo do cinema de animação, em três salas distintas. É uma visita a fazer-se com vagar – no mínimo com uma hora e meia – para dar tempo a Abi de contar, na primeira sala, a história do pré-cinema. Abi recorre muitas vezes a exemplos práticos que enriquecem e animam a experiência. Ora mostra um fenaquistiscópio e um praxinoscópio em ação, ora explica o que são os princípios de staging ou como funciona a técnica lenticular. Na segunda sala é destacada a obra de Abi Feijó e de Regina Pessoa, também uma premiada realizadora de filmes de animação. Na terceira e última sala dá-se a conhecer uma coleção de desenhos originais de filmes de animação estrangeiros, da coleção de Abi Feijó, Regina Pessoa, Normand Roger e Marcy Page, sobre os quais Abi fala um pouco, com um fascínio que resume em duas frases: «Uma curta está mais para um poema, e uma longa para um romance. É essa poesia que eu procuro».

E é uma aura poética que envolve a Quinta da Tapada, onde até meados de janeiro acontecem as gravações de um filme português. É «a maior quinta da região», segundo Pedro Amado, diretor de alojamento, e dela fazem parte 54 hectares ocupados por vinha, adega, uma queijaria e uma plantação de kiwis, jardins e um impressionante solar do século XVIII. Os seis quartos podem ser ocupados a partir de abril, altura pela qual o museu trifacetado sobre os setores agrícola, dos laticínios e administrativo estará terminado. Até lá, é sempre possível visitar a loja e comprar queijo Trevo e vinhos Casa do Carregal.

Onde também se produz vinho é na Quinta de Lourosa, a cerca de cinco quilómetros. Nesta casa de campo, onde a produtora e enóloga Joana Castro e os pais vivem, há sete quartos, uns rústicos, outros mais modernos, com nomes de castas, prontos a receber enófilos ou quem procura um lugar sossegado para desligar. E, a isso, tudo ajuda – a piscina, o campo de ténis, o baloiço e a sala com lareira onde apetece ficar toda a noite. Durante o dia, há que aproveitar as atividades disponíveis, gratuitas para hóspedes. Duas delas são o passeio pelas vinhas, onde Joana fala do LYS, o sistema de condução da vinha que o pai, Rogério Castro, criou, e visita à adega com prova comentada. Apesar de Joana admitir que está «sempre a pensar em coisas novas à volta do enoturismo», o número de quarto é para se manter. «Não queremos massificar».

Da mesma forma pensa Célia Morais, que não pensa aumentar o Distinto, um restaurante pequeno e quase sempre lotado. Instalado na garagem de uma moradia amarela, a fachada não deixa adivinhar a espécie de taberna que ocupa o seu interior, com mesas de madeira, bancos corridos e uma salamandra que agora se começa a acender. A especialidade é só uma e é por ela que a casa enche nos três dias em que abre, de sexta a domingo. A francesinha folhada, recheada com bife de vaca, frango, porco ou vegetais, e acompanhada por cerveja belga La Trappe, atrai comensais de perto, mas também do Porto, de Vila Nova de Gaia e até lisboetas já lá pararam. Um dos vários segredos que Lousada guarda.

Algo está a fazer com que o sistema não consiga mostrar a ficha ténica desejada. Pedimos desculpa pelo incómodo.



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