Nelson Marques: “Quis tirar os chefs do pedestal e mostrar o outro lado”

Nelson Marques acaba de lançar o livro "Chefs sem reservas". (Fotografia: Rui Oliveira/GI)
“Chefs sem reservas” é uma espécie de confessionário alegre de dez cozinheiros de fama mundial, como Alain Ducasse, Massimo Bottura ou o português José Avillez. O autor, jornalista, quis contar as histórias por trás da fama.

Isto é um livro sobre chefs, sem ser um livro sobre comida. Como lhe ocorreu fazê-lo?
Há uma expressão que costumo usar: é que eu sou preguiçoso. Os meus dois livros começaram, primeiro no jornal onde trabalho, que é o Expresso, e nasceram ou de uma reportagem ou de entrevistas. Percebi, por esta altura, no ano passado, que tinha entrevistado uma série de chefs renomados – oito dos que entram no livro, à exceção do Alain Ducasse e do Massimo Bottura, que surgem quando já decidira fazer o livro.

O falhanço é o que mais têm em comum?
Essa é uma narrativa, mas não é a única, há também uma narrativa de grande sucesso, apesar de o falhanço ser talvez acentuado pela capa. Nalguns casos, trata-se mesmo de falhanços estrondosos, como falências, ou tragédias. Como a do Alain Ducasse, que sobrevive a um acidente de avião.

São homens que erram e recomeçam. Quis mostrar isso?
Eu quis tirá-los do pedestal, mostrar o outro lado, que ao final do dia as preocupações deles são as nossas preocupações. Falei com o Nuno Mendes quando tinha acabado de ganhar uma estrela Michelin, e ele disse: “Ando mesmo com vontade de ter uma banda”. Ele teve uma banda na adolescência, teve uma editora que ele criou. O José Avillez conta que deixou a rádio porque estava ausente de casa tanto tempo, mesmo a viver no Chiado, que os filhos pensavam que andava a viajar e um deles, um dia, disse que ele era “o pai do mano”. A vida deles é dura, a vida de quem trabalha para eles é dura, quis mostrar isso também.

É um livro com lições para todos?
Sinto mesmo isso, que podemos falhar num caminho, temos que procurar outro. Que muitas vezes o caminho que queremos seguir não é óbvio e não há mal nisso. Vale a pena lutar pela vocação, mesmo sendo incompreendido.

Alguma das histórias destes chefs lhe tocou mais?
Uma das entrevistas é ao Anthony Bourdain, a quem dedico o livro, e foi feita há muito mais tempo do que as outras – e durou muito menos tempo, foram 40 minutos, quando ele veio fazer um programa a Portugal. Fiz o livro poucos meses depois da morte dele e gostava de lhe ter feito a entrevista que fiz aos outros. Acabei por incluí-lo como forma de lhe prestar homenagem.

Avisa, logo no prefácio do livro, que não há histórias de mulheres porque lhes falta conquistar espaço mediático. Um próximo livro pode ser sobre chefs mulheres?
Tive esse debate com algumas pessoas: se podia ou não ter incluído alguma mulher. Já entrevistei mulheres cozinheiras, acredito que essa revolução é precisa, eu assumo-o logo, mas é uma revolução que tem que acontecer nas cozinhas e não nas páginas de um livro. Sou jornalista, tenho que falar da realidade e não criar uma. Estes chefs são os mais mediáticos, a nível nacional e internacional, e um dia vai haver entre eles mulheres.

Sobre o livro e o autor
“Chefs sem reservas – As confissões, os erros e as lições de dez grandes cozinheiros” é o título do livro lançado este mês, com a chancela do Cube do Autor (216 páginas, PVP 19,5 euros). Conta com um prefácio da autoria do chef Ferran Adrià (chef do El Bulli, de Barcelona). Nelson Marques é jornalista do Expresso desde 2011, tendo passado por outras redações dos média portugueses.




Outros Artigos





Outros Conteúdos GMG





Send this to friend