Joaquim Marques, portuense apaixonado por cultura e património, mudou-se para Valongo, nos anos 1970, e foi à descoberta do território: deu umas voltas, falou com pessoas. “Os mineiros diziam que havia bichos na lousa. Eu fui ver e, realmente, havia”, recorda aquele paleontólogo amador, responsável por um pequeno espaço museológico dedicado aos fósseis de Valongo da Era Paleozóica que ele mesmo criou, num anexo rente à sua casa, em Susão.
“É neste ambiente que me sinto um jovem, junto de seres que já viveram e têm centenas de milhões de anos. São mesmo velhos, comparados comigo!”, graceja Joaquim Marques.
Alguns fósseis estão em expositores de vidro, outros em alvéolos, dentro de caixas. Falta-lhe espaço para mais achados, pelo que se deixou, praticamente, de buscas. Mas continua apaixonado pelo tema. Ainda hoje dá por si a admirar o que resta daqueles animais já extintos, que habitaram o fundo do mar num tempo em que tal território estava submerso. “É neste ambiente que me sinto um jovem, junto de seres que já viveram e têm centenas de milhões de anos. São mesmo velhos, comparados comigo!”, graceja, em nota escrita entregue em jeito de complemento, aquando da nossa visita.
Tudo começou, então, com Joaquim a ver a sua curiosidade espicaçada pelos mineiros que se ocupavam da extração de lousa. Ele, que trabalhara como responsável pelos recursos humanos de uma empresa, nada tinha a ver com a paleontologia, só que era um ávido leitor, e foi procurar informação sobre o tema. Encontrou livros em francês, inglês e espanhol, de difícil tradução, pelo caráter técnico-científico – isso não o impediu de estudar técnicas de pesquisa e cuidados a ter na recolha do material fossilífero. Só depois avançou para zonas sedimentares, à procura de fósseis, nos tempos livres.
Joaquim garante que nunca comprou, vendeu ou trocou qualquer fóssil; foram todos recolhidos por si, por vezes com ajuda da mulher, Filomena Marques, que chegou a acompanhá-lo nessas buscas pelas serras, nos últimos anos. Cada um levava um apito. “Era para sabermos onde estávamos, para pedir auxílio ou para ir embora. Tínhamos toques combinados”, lembra.
Primeiro fóssil foi encontrado no alicerce de uma casa
Atualmente, os fósseis recolhidos por Joaquim Marques repousam no seu espaço museológico, onde exibe também algumas ferramentas para limpeza e restauro dos mesmos. Os visitantes podem observar diferentes espécies: trilobites, orthoceras e mais. É como viajar no tempo.
As trilobites, animais marinhos que tinham uma espécie de carapaça (o exoesqueleto) e, perante potenciais ameaças, se enrolavam qual bicho-de-conta, são dos exemplares mais comuns e estão ali representadas às centenas, em diferentes tamanhos. Ora, Joaquim prefere focar a sua atenção na orthocera, de aparência semelhante à da lula. O seu primeiro fóssil foi, justamente, uma orthocera encontrada num alicerce de uma casa em construção.
Joaquim vai recebendo no seu espaço museológico estudantes, curiosos, mas também entendidos na matéria, de todo o país. Qualquer pessoa é bem-vinda, bastando agendar visita, por telefone, com pelo menos um dia de antecedência. É uma oportunidade para ouvir, na primeira pessoa, relatos sobre as descobertas e particularidades de cada exemplar exposto.
Não faltam curiosidades relacionadas com aqueles fósseis, e uma delas prende-se com o Lugar do Galinheiro, no sopé do Monte do Sobrido (ou Serra da Murta), perto das antigas minas de extração de lousa, em Valongo. O nome resultou da concentração, nesses terrenos, de centenas de nódulos elipsoidais achatados, lembrando ovos, alguns dos quais guardavam fósseis no interior – por isso Joaquim se refere aos mesmos como nódulos parideiros.
Longitude : -8.2245