Dezenas de turistas agrupam-se à volta do Monumento ao Calceteiro, nos Restauradores, para tirar fotografias com o desenho da barca de São Vicente com dois corvos – o símbolo de Lisboa – da autoria de Sérgio Stichini, feito por calceteiros municipais com 10.500 pedras. Habituados a pisá-la quotidianamente, absortos nos seus afazeres, os lisboetas são, provavelmente, quem menos presta atenção à calçada artística portuguesa espalhada pela cidade, e que é uma das suas imagens de marca. O novo livro “Calçada Artística de Lisboa” procura mudar esse paradigma.
Publicado pela Associação da Calçada Portuguesa (edição da Caleidoscópio; 19,08 euros) com o apoio do Turismo de Lisboa e da câmara municipal, um dos sócios-fundadores da associação, o livro traça cinco roteiros pedestres acessíveis a qualquer pessoa interessada em saber mais sobre os “tapetes de pedra” da cidade, como lhes chama o autor da obra e técnico superior de História António Miranda. “A grande referência foi o levantamento de Eduardo Bairrada, de 1985, do qual conseguimos mesmo aproveitar as fotografias de arquivo”.
O percurso A, cosido por 16 pontos interessantes para observação, percorre o Parque Eduardo VII até à Praça do Município e atinge o ponto alto na Praça D. Pedro IV, vulgarmente conhecida por Rossio. É aí que está o Mar Largo, com um padrão ziguezagueante com planos côncavos e convexos, terminado originalmente em 1849 e replicado por calceteiros lisboetas na avenida de Copacabana. A ilusão de ótica era de tal forma intensa, que “as senhoras, pouco habituadas a sair de casa e vestidas com espartilhos, queixavam-se que o chão provocava náuseas”, revela.
O padrão fora criado pouco antes pelo tenente-general e governador de armas do Castelo de São Jorge, Eusébio Furtado, ao mandar calcetar a parada militar com um desenho artístico de pedra basáltica. A partir daí, o revestimento expandiu-se em grande escala, adotando os estilos de diferentes épocas, do classicismo à Art Déco e Arte Nova, e os calceteiros passaram a usar, adiante, a pedra calcária, mais fácil de talhar com o martelo de pena. Ao empregar diferentes e complexas técnicas, criaram também um léxico próprio, deixando pistas subtis nas execuções.
OUTROS QUATRO PERCURSOS
B. Do Chiado ao Largo de São Paulo
Começa no cruzamento da Rua Nova do Almada com a Rua da Conceição, por onde circulam os elétricos da carreira 28 da Carris, e inclui o primeiro QR code em calçada portuguesa, criado pela Associação de Valorização do Chiado em 2012, entre o estabelecimento Paris em Lisboa e a livraria Sá da Costa. Tem 14 pontos.
C. Do Padrão dos Descobrimentos ao Terreiro das Missas
Junto ao monumento do bairro de Belém pode ser observada uma rosa dos ventos com 50 metros de diâmetro, e na Praça do Império um desenho feito com a técnica do amalhete. Perto do Museu de Arte Popular, dos Pasteis de Belém e do Museu Nacional dos Coches também há trabalhos na calçada. Tem 14 pontos.
D. Da Avenida Almirante Reis à Igreja de São Brito
Este percurso passa pelo Instituto Superior Técnico, Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Rua António Patrício e Mercado de Alvalade, revelando três personagens de desenhos animais – Pato Donald, Pernalonga e o Calimero – em calçada. No último ponto está a primeira calçada-mosaico a cores. Tem 19 pontos.
E. Da torre da Galp ao Terreiro dos Corvos
Localizado na zona oriental e mais recente da cidade, no Parque das Nações, o quinto roteiro passa pelos Jardins de Água, Rossio dos Olivais e Jardim dos Jacarandás e acaba no Terreiro dos Corvos. Monstros marinhos acenam junto ao Oceanário, enquanto junto do Pavilhão de Portugal há uma homenagem ao calceteiro. Tem 10 pontos.