Fundão: muito mais do que cerejas

Parque da Casa do Guarda, Fundão. (Gerardo Santos/Global Imagens)
Conhecida como a terra das cerejas, o Fundão, na Beira Baixa, é muito mais do que isso. Não que este fruto carnudo e doce não tenha importância - porque tem muita - mas porque quando a época passa continua a haver muito para ver e fazer na cidade e pela Serra da Gardunha. 

Além das cerejas, o Fundão é também terra de bom vinho, de aldeias históricas e o berço do poeta Eugénio de Andrade. Passear pelas suas ruas centrais ajuda a conhecer um pouco história da cidade – ora passando pelo busto de António Paulouro, fundador do Jornal do Fundão, histórico pela sua oposição à ditadura, ora visitando o barbeiro mais antigo da cidade, Joaquim Caldeira que, com 92 anos, continua de portas abertas a cortar barba e cabelo com precisão e boa conversa. “Comecei a aprender aos 12 anos. Sou de Alpedrinha. Na altura, o meu pai teve de pagar 2 contos para eu ir aprender”, conta orgulhoso da sua história.

A uns passos mais à frente, uma loja de fotografia, a Foto Rosel, homenageia na sua montra Amália Rodrigues, que tem aqui as suas origens familiares e que chegou a atuar no Casino Fundanense, fundado nos finais do século XIX – edifício onde agora funcionam gabinetes da câmara. Na altura, “escandalizando a população conservadora pela sua postura moderna”. Quem conta a história é Olga Nogueira, que trabalha no turismo da autarquia e que muitas vezes leva os turistas a conhecerem a cidade em PASSEIOS DE TUK TUK. Ainda na Praça do Município, passeie-se pelo jardim público, onde se encontra a Câmara Municipal, uma antiga fábrica de lanifícios.

Ali no centro está uma das mais recentes novidades da cidade, a PASTELARIA ALMMA, chefiada por Jorge Machado. O pasteleiro nasceu no Fundão mas foi para França com quatro anos, fazendo lá a sua formação profissional em pastelaria. Voltou há 20 e em 1988 abriu a sua primeira casa na cidade, a pastelaria Paris, que fechou durante a pandemia. Mas logo abriu a Almma que não lhe dá descanso. Aqui, usa a cereja, fruto privilegiado da região para várias confeções criativas, desde o pastel de nata, às cavacas, folhados e semi-frios. Essa vocação reflete-se na falsa cerejeira que exibe no meio da sala arejada e clara, feita de tronco de oliveira e imitações das bonitas flores brancas da árvore.

Jorge Machado, pasteleiro da Almma. (Gerardo Santos / Global Imagens)

Outro fruto muito importante para o Fundão é a uva, ou não fosse o sul da Serra da Gardunha importante para produção de vinhos da região demarcada da Beira Interior. Vale a pena uma visita à ADEGA COOPERATIVA DO FUNDÃO, aberta em 1949, e que funciona com 600 associados, “proprietários de pequenas vinhas”, da sub-região da Cova da Beira, numa área que se estende de Proença-a-Nova, Covilhã e Belmonte”, explica Ricardo Clode Botelheiro, um dos enólogos da cooperativa, trabalho que divide com Fátima Valério e António Madalena, este último também presidente da instituição.

“Neste sul da Gardunha, os vinhos são mais frutados e estruturados, contrastando com a frescura e elegância dos vinhos do norte da serra”, diz o enólogo. Castas específicas da região, como a tinta amarela (ou trincadeira), o rufete e o jaen, nas tintas, ou nas brancas, a síria e a fonte cal, são as que mais se destacam. São estas as principais uvas das 12 referências da adega, entre elas a gama de entrada o Cova da Beira (branco, tinto e rosé), o Alpedrinha, entre outros. Até ao final do ano vão lançar uma edição especial Adega do Fundão – private selection edition, um tinto feito a partir de vinhas velhas, merlot e touriga nacional.

Um pouco mais velho do que a adega, mas não muito, é o RESTAURANTE HERMÍNIA, aberto em 1946 pela mãe do atual proprietário Carlos Couto. “Quando voltei da tropa em 1972, fiquei a tomar conta do restaurante”, lembra. Por esta altura, o HOTEL SAMASA, também da sua família, estava já em construção, abrindo portas dois anos mais tarde. “Construímos de raiz. Nessa altura não havia nenhum hotel na cidade, só pensões”, conta. No restaurante, podem ser apreciados os pratos típicos da região, como polvo à lagareiro, lombinhos com molho de cereja, ensopado de borrego ou arroz de carqueja. O hotel é simples, confortável e cómodo para quem quer pernoitar mesmo no centro da cidade.

Uma proposta diferente para se fazer uma refeição também ali no centro é a casa 1. D’ ENCONTRO. “Lê-se ‘um ponto de encontro’”, esclarece Paula Farinha, que veio para o Fundão há 15 anos e que agora gere a petisqueira com o marido Paulo Elvas, que toma as rédeas da cozinha. “O meu marido sempre gostou de fazer petiscos”, conta. E são esses pratinhos bem portugueses que chegam às mesas do interior ou da esplanada: pica pau, dobrada, moelas, salada de orelha, pastéis de bacalhau e uma reconfortante sopa de peixe. Tudo em ambiente bem informal e com o acordeão de Paula encostado à espera de um momento propício para a responsável, que também é música, animar a clientela.

SUBINDO A SERRA
Um dos mais ilustres filhos da Serra da Gardunha é o poeta Eugénio de Andrade (de seu nome de batismo José Fontinhas). Mesmo não tendo vivido muitos anos na Póvoa da Atalaia, só passou lá parte da infância, o ambiente rural e serrano sempre marcou presença na sua obra. A terra retribui com homenagens ao autor. Como é exemplo a criação da CASA DA POESIA EUGÉNIO DE ANDRADE, na antiga escola primária da aldeia. Aqui, além de se ficar a conhecer a vida e a obra do poeta, pode ainda levar-se para casa vários poemas. Há ainda um pequeno percurso pedestre que se pode fazer pela aldeia, recordando as referências à mesma na sua poesia. Vale a pena também passar pelo jardim O Lugar da Casa, onde se encontram expostos vários dos seus poemas e se homenageiam as “mulheres de preto”, que nas entradas de suas casas criavam (e ainda criam) os tradicionais bordados da região.

Outra personalidade importante do Fundão, mesmo não tendo lá nascido, é António Guterres, antigo primeiro-ministro de Portugal e atual secretário-geral da ONU. Donas, a aldeia onde tem raízes familiares – a uns 20 minutos subindo a serra da Gardunha desde a Póvoa da Atalaia – foi onde o político aprendeu a ler, com a sua tia que era professora primária. Guterres nunca deixou de estar ligado à terra e escolheu-a para doar muitas das ofertas que recebeu em visitas de Estado. Ao todo, nesta CASA DAS MEMÓRIAS ANTÓNIO GUTERRES, encontram-se 66 valiosas peças, de várias partes do mundo. Há um quadro de Malangatana, tapeçarias cabo-verdianas, esculturas e até um relógio Cartier com pedras preciosas oferecido pelo príncipe Aga Khan.

Castelo Novo. (Gerardo Santos / Global Imagens)

Neste passeio da Atalaia para Donas, pare-se para uma visita à aldeia histórica de CASTELO NOVO, onde merece visita o próprio castelo e um lagar de vinho romano escavado na rocha. Logo ao lado, encontra-se ALPEDRINHA, aldeia onde se pode apreciar a antiga calçada romana, o chafariz D. João V e o Palácio do Picadeiro, estes dois monumentos barrocos. Continuando serra acima, chega-se a ALCONGOSTA, onde a cereja abunda e onde se pode fazer um piquenique com uma vista para todo o planalto da Cova da Beira e para a Serra da Estrela, no parque de merendas Casa do Guarda.

Para um dia em cheio na serra, a Câmara do Fundão sugere o apadrinhamento de uma cerejeira (www.visit-fundao.pt). Pode ir-se, mais uma vez, de tuk tuk até ao pomar da autarquia, também em Alcongosta. O nome do padrinho ou da madrinha é pendurado na árvore apadrinhada. Custa 20 euros e dá direito a uma caixa de cerejas de 2 quilos por ano. Além disso, podem sempre que quiserem usufruir do pomar. Uma forma de promover a ligação a esta terra beirã, criando raízes.

Pomar em Alcongosta. (Gerardo Santos/Global Imagens)

VISITAR O MUSEU ARQUEOLÓGICO DO FUNDÃO
José Alves Monteiro dá nome a este museu de arqueologia, instalado no Solar Falcão d´Elvas, no centro do Fundão, inaugurado em 2007. Mas a coleção que aqui se apresenta começou a ser criada por Alves Monteiro (1890-1980), advogado, poeta e interessado pela arqueologia, que descobriu, investigou e recolheu várias peças na região; peças essas que deram origem a este acervo. Vários séculos estão aqui representados – pré-história ao século V, entre conjuntos romanos e pré-romanos, machados, e exemplares de peças funerárias.

FICAR NO LUXO DE UM ANTIGO CONVENTO
Reabriu o mês passado depois de vários meses fechado devido à pandemia o Convento do Seixo Boutique Hotel & Spa. Situado na Serra da Gardunha, o espaço recuperou um antigo convento franciscano e tem a funcionar, na antiga capela-mor, o restaurante Pecado.

Algo está a fazer com que o sistema não consiga mostrar a ficha ténica desejada. Pedimos desculpa pelo incómodo.

 




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