Este “livro-viagem” conta a história da Madeira e das suas mulheres

Levada do Moinho no Funchal, Madeira (Fotografia: Rita Chantre/GI)
A partir das histórias de mulheres madeirenses de várias gerações e experiências, Ana Cristina Pereira conta a história da sua terra-natal e das suas tradições, olhando para o futuro.

É com uma história autobiográfica, um relato de uma ceia de Natal em família, que a jornalista Ana Cristina Pereira, natural de São Vicente, inicia o seu mais recente livro “Mulheres da Minha Ilha, Mulheres do Meu País”, título que remete para as crónicas da também jornalista Maria Lamas, que entre 1948 e 1950 percorreu a país para escrever sobre a situação das mulheres portuguesas. De resto, “As Mulheres do Meu País”, o livro que resultou dessas viagens, e “Novas cartas Portuguesas”, de Maria Teresa Horta, Maria Isabel Barreno e Maria Velho da Costa, servem de epígrafe a este livro.

É, portanto, um livro sobre a vida de mulheres, da Madeira, de várias gerações e experiências. Mas é muito mais do que isso. É um “livro-viagem”, como a própria lhe chama. Cruza estilos de crónica, reportagem, entrevista, narrativa histórica, tudo contextualiado com recurso a conversas com historiadores e antropólogos. Não falta trabalho de pesquisa neste livro, que não é de todo académico. É um livro de histórias que se cruzam no tempo, que sugerem recuos ao passado, reflexões sobre a história do arquipélago e das culturas que lá se desenvolveram: “Logo no século XV, magrebinos, guanches e subsarianos escravizados. Atraídos pelo comércio do açúcar, para aqui convergiam mercadores italianos, flamengos, franceses e bretões. No século XVII, atraídos pelo vinho, britânicos. A partir do século XIX, gente de toda a Europa em turismo”.

“Mulheres da Minha Ilha, Mulheres do Meu País” de Ana Cristina Pereira | Bertrand Editora | 264 páginas | PVP: 16,60 euros

 

A primeira mulher apresentada ao leitor é Joana, descrita a preparar cuscuz. Mote para se cruzar a história desta senhora de 80 anos com a dos primeiros povoadores que lá ancoraram e que levaram as suas tradições e saberes. “Em diversas camadas, desembarcaram condenados e foragidos, filhos segundos, mercadores e aventureiros. Esforçaram-se por recriar o seu rincão. Daí se presume, por exemplo, que a carne de vinha d’alhos, que na madeira tanta vezes acompanha o cuscuz, seja descendente dos rojões à moda do Minho”. Sobre o cuscuz, escreve, “talvez esta tradição berbere tenha vindo com as pessoas livres que começaram o povoar o Funchal, Câmara de Lobos, Machico e Santa Cruz e se espalharam pela costa”. (…) “Entre os primeiros portugueses viviam magrebinos capturados nas guerras travadas na costa africana”. O capítulo termina com a receita de cuscuz. Algumas páginas à frente, a história de Odília Nunes, mulher de pescador, é uma história de amor e de emigração. Este capítulo termina também com uma receita tradicional, desta vez de atum salpresado.

O livro é pontuado por imagens, tanto fotografias como outros trabalhos visuais, de vários artistas. Não sendo um livro de viagens, este “livro-viagem” presta-se a ser levado debaixo do braço numa viagem ao arquipélago, para melhor se entender as suas paisagens, incluindo as humanas.




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