Esposende: natureza, património e comida do mundo

Passadiços dos moinhos de vento da Apúlia. Fotografia: Rui Manuel Fonseca/GI
É uma terra de mar, rios e monte, com ruínas milenares, desportos náuticos, percursos pedestres e de bicicleta, sabores do Mundo e artesanato tradicional atualizado. Esposende enche-se de gente no verão, mas bem merece visita o ano inteiro.

Há 15 anos, Tiago Rocha, que é de Vila Nova de Gaia, começou a ir a Esposende fazer kitesurf, porque o sítio oferecia excelentes condições para a prática deste desporto aquático em que se navega numa prancha puxada por uma espécie de papagaio gigante. E acabou conquistado por essa terra com mar, rios e monte, onde faz a sua vida quase só a pé e de bicicleta. «Um privilégio da natureza» é o slogan do concelho, e foi para tirar partido dela, através de atividades desportivas, que criou a Kook Proof.

Tudo começou com uma escola dedicada ao kitesurf, mas hoje a Kook Proof funciona como um centro de atividades diversas. Ainda investe muito no kitesurf, mas também disponibiliza aulas de surf, stand up paddle, ioga ao ar livre ou passeios de mountain bike. E está a preparar atividades dentro de portas, que possam ser realizadas na época fria – a provar que Esposende é destino para todas as estações, e não só no verão, quando a sua população praticamente quadruplica.

Aula de iniciação ao kitesurf.
Fotografia: Rui Manuel Fonseca/GI

Outro lugar a visitar durante o ano inteiro é o Sky Valley, um restaurante de comida japonesa com esplanada voltada para o Cávado, especialmente apetecível ao pôr-do-sol. Já tem quase três anos, mas vai sendo refrescado com novidades, inclusive, na decoração.

«Aqui também come o olho», diz Jorge Rodrigues, que conduz os destinos da casa com a mulher, Carla Novo. As bebidas e comidas, de aspeto impecável, chegam envoltas em fumo, a condizer com o ambiente intimista e, ao mesmo tempo, festivo, onde não faltam música e um ecrã.

Além de whiskies japoneses e sangria de sake, há cocktails servidos num tabuleiro com pedras ou num aquário com areia da praia, a preparar a aparição do vistoso Diamond Sky, composto por 35 peças de sushi e 15 de sashimi. Atum, salmão, robalo, carapau, vieiras e camarão são algumas das matérias-primas usadas. Procura-se ter pelo menos sete tipos de peixe por dia, todos produtos premium, frisa Jorge, que foi DJ durante 12 anos. Andou pelo Mundo a absorver experiências, e agora aplica isso nos seus negócios.

O best-seller Diamond Sky, com 35 peças de sushi e 15 de sashimi.
Fotografia: Rui Manuel Fonseca/GI

Gente feliz com pizas, nachos e chocolates

No final de março, Jorge Rodrigues e Carla Novo abriram mais um restaurante e bar no coração da cidade. Attytude – Food, Drinks & Something é o nome deste novo espaço do grupo Sky Valley, onde é difícil não sujar os dedos com hambúrgueres, pizas, tacos e demais comidas do Mundo.

Aqui, uma refeição pode arrancar com nachos com queijo cheddar, guacamole e chili, prosseguir com o hambúrguer Texas, em pão azul-turquesa, e terminar com a porn piza, feita com chocolate branco, marshmallows, M&M e Nutella.

A piza Magrinha, com burrata, presunto de Parma e rúcula.
Fotografia: Rui Manuel Fonseca/GI

É como estar num parque de diversões para adultos, centrado na comida de conforto. «O objetivo é fazer as pessoas felizes», confirma o proprietário, que ainda quer ter animação surpresa ao fim de semana. Pode ser um espetáculo de stand-up comedy ou de ilusionismo, sempre sem aviso. «Desde que haja atitude, tudo é possível cá dentro», conclui, a sorrir.

Quase em frente fica outra casa que distribui felicidade: é a confeitaria, chocolataria e bombonaria Marbela, fundada em 1987 por António Costa e a mulher, Maria Jacinta. Primeiro, só tinha pastelaria tradicional; agora, há espaço também para pastelaria do tipo francês, bombons de diversos sabores, gelados e esculturas em chocolate, porque o filho, Rui Costa, tornou-se pasteleiro, mestre chocolateiro e escultor de doçaria premiado. Uma peça de chocolate de Salvador Dalí, por exemplo, já lhe rendeu uma medalha de prata no concurso mundial de cozinha e pastelaria de Chicago.

Uma tagine minhota e quatro pistas de bowling

Os sabores do Mundo cabem todos em Esposende, e não é só pela comida japonesa do Sky Valley, pelas propostas do Attytude (onde se come com o mesmo gosto com que se atacaria um cachorro quente cheio de molho nas ruas nova-iorquinas), ou pelos macarons coloridos da Marbela.

No restaurante Sra. Peliteiro, a chef Paula Peliteiro apresenta as suas sugestões de «cozinha global portuguesa». São pratos inspirados em viagens pelo globo e feitos com produtos tradicionais.

No restaurante Sra. Peliteiro, já fora da cidade, na Barca do Lago, em Gemeses, a chef Paula Peliteiro apresenta as suas sugestões de «cozinha global portuguesa». São pratos inspirados em viagens pelo globo e feitos com produtos tradicionais.

A chef – responsável também pelo restaurante Ignácio, em Braga – gosta de cruzar a comida do Mundo com os ingredientes portugueses. Daí que, na tagine minhota & cuscus marroquino, use carne de vaca, em vez de cordeiro.

O Sra. Peliteiro começou por abrir, em 2011, no centro de Fão. Alguns pratos estão na carta desde essa altura, porque os clientes – vindos, geralmente, de fora – não os deixam tirar. A tagine, a moqueca de gambas ou o polvo à Sra. Peliteiro já são clássicos, e têm direito a menu próprio de degustação.

Mas, a cada época, Paula procura introduzir algumas novidades, como o tamboril grelhado com tomatada de feijocas, uma festa de verão a acontecer no prato. Sim, o tamboril também se grelha – e sabe mesmo bem neste refúgio na Quinta da Barca, com o Cávado, tranquilo, ao lado.

Do rio ao mar a distância é curta, e mais curta é a que vai do Axis Ofir à praia de Ofir. Este hotel de quatro estrelas rente ao areal tem 192 quartos, quase todos com varanda, um restaurante que deixa ver as ondas, bar, piscina e parque infantil.

Muitos dos hóspedes são clientes habituais, alguns com 40 anos de casa, conta Paulo Rodrigo Silva, diretor deste alojamento com clara ligação ao desporto. É conhecido por ter campo de futebol e ainda dois campos de ténis e quatro pistas de bowling – uma jogada de mestre, sobretudo se não houver condições para fazer atividades lá fora.

O hotel de quatro estrelas Axis Ofir fica mesmo junto à praia.
Fotografia: Rui Manuel Fonseca/GI

Masseiras, moinhos e uma homenagem à avó

Próximo do oceano fica também o Cantinho d’ Avó, uma nova casa de hóspedes, com oito quartos (dois deles suítes) e restaurante, a 200 metros da praia da Apúlia. Joana Dias, cozinheira e responsável pelo espaço, conta que se trata de uma homenagem à avó materna, Maria Carminda Pereira, que teve um percurso curioso: dava cursos de bordados e culinária – «era muito prendada» -, foi mãe solteira e a primeira mulher, na Apúlia, a andar de manga cava, elenca a neta, com orgulho.

Joana Dias mantém alguns pratos da avó na ementa – como o polvo à apuliense, que lhe valeu o Prémio Revelação no evento Março com Sabores do Mar 2019.

Carminda, que era auxiliar de ação educativa numa escola, em 1976 abriu, naquele mesmo sítio, uma pequena casa de petiscos. Ainda converteu a tasquinha em restaurante e arrendou os quartos da casa, que, precisando de obras, acabou por fechar, 20 anos depois. No seu lugar surgiu, em novembro, este Cantinho d’Avó de linhas modernas.

Carminda ainda assistiu à inauguração, mas faleceu pouco depois. «Isto era o maior sonho dela», prossegue Joana, que mantém alguns pratos da avó na ementa do restaurante – como o polvo à apuliense, que lhe valeu o Prémio Revelação na iniciativa Março com Sabores do Mar 2019.

O Cantinho d’ Avó é uma nova casa de hóspedes de linhas modernas.
Fotografia: Rui Manuel Fonseca/GI

Não faltam histórias para desenterrar na praia da Apúlia, no extremo sul do Parque Natural do Litoral Norte, uma zona que tem passadiços de madeira e um núcleo de moinhos de vento construídos sobre o cordão dunar.

Estes antigos motores da economia local, entretanto convertidos em casas de férias, tinham uma particularidade: a sua capucha era móvel, o que permitia adaptar o velame à direção do vento, explica José Costa, técnico da Câmara de Esposende.

Passadiços dos moinhos de vento da Apúlia, onde começa o Trilho das Masseiras.
Fotografia: Rui Manuel Fonseca/GI

É neste lugar cénico que começa o Trilho das Masseiras, integrado na rede municipal de percursos pedestres. São sete quilómetros, da costa até ao interior, marcado por matas e campos em masseira. As masseiras são covas largas e retangulares, cavadas nos solos arenosos, com água doce no fundo. Nos cantos (os «quatro vales») são implantadas vinhas, para proteger a zona central da areia lançada pela nortada.

O trilho passa ainda pela lagoa da Apúlia, um sítio de nidificação de aves onde foi erguida uma torre para observar a paisagem. Do topo vê-se patos-reais e garças, ouve-se o coaxar dos anfíbios e o sopro do vento. E leva-se essa música na memória no regresso à costa, onde também passa a Ecovia do Litoral Norte. Liga Esposende a Viana do Castelo, em S. Paio de Antas, por uma ponte sobre o rio Neiva, e estende-se até Caminha, embora haja troços por completar.

Um castro com vista sobre a planície costeira

O património, natural e construído, é um dos fortes de Esposende. E, se dúvidas houvesse quanto a isso, seriam dissipadas no Monte de S. Lourenço, em Vila Chã. É lá que fica o castro de S. Lourenço, no cimo de uma das elevações da arriba fóssil. As suas raízes remontam ao início do I milénio antes de Cristo e, entre os séculos II antes de Cristo e IV depois de Cristo, passou por um processo romanizador gradual.

Só uma pequena parte deste povoado proto-histórico romanizado está escavada, explica Ana Paula Almeida, arqueóloga da Câmara Municipal que está à frente do Centro Interpretativo de S. Lourenço. Convém começar a visita nesse equipamento, que tem dois espaços expositivos, com alguns achados arqueológicos, antes de avançar para as ruínas milenares.

A reconstituição de algumas casas permite imaginar como seria o quotidiano dos seus habitantes, enquanto se sobe até à capela de S. Lourenço, autêntico miradouro. De lá de cima vê-se mar, a foz do Cávado e a planície costeira, deixando perceber que terão sido razões estratégicas a determinar a localização do castro.

Tão bonita é a vista, que um dos passeios de mountain bike da Kook Proof inclui uma paragem naquele lugar, para tomar o pequeno-almoço. Bem assinalava Tiago Rocha no início: natureza e tranquilidade são, de facto, um privilégio.

Subida à capela de S. Lourenço.
Fotografia: Rui Manuel Fonseca/GI

A nova vida das cestas de junco

Maria do Carmo Arantes faz lindas cestas de junco no tear da sua casa, em Forjães, dando continuidade à tradição da vila, onde a arte do junco foi um importante meio de sustento familiar. A Lançadeira é como se chama a sua marca, e as cestas, que antes eram usadas para transportar compras ou a merenda na lavoura, viraram também acessórios de moda.

As cestas, disponíveis em vários tamanhos, formatos, padrões e cores, seguem dali para destinos tão longínquos como Brasil ou Singapura. Nem sempre foi assim: no início da década de 1990, a procura cessou. A artesã teve de se virar para outros trabalhos, mas, entretanto, voltou ao tear – e à apanha do junco, tingido com tintas naturais. É tudo feito à mão e 100% biodegradável, garante ela, que cria ainda esteiras e biombos. Envia encomendas por correio e recebe clientes por marcação, mas vê-la em ação tem outro encanto.

Fotografia: Rui Manuel Fonseca/GI

 

Há festa no castro

O castro de S. Lourenço acolhe, anualmente, a Galaicofolia – 2000 anos de festa!, que envolve reconstituições históricas, um mercado romano, música, dança, comida e bebida de época. O evento, promovido pela Câmara Municipal de Esposende, toma como inspiração os povos que ali viveram, passaram e lutaram. Acontece de 19 a 21 de julho.

Algo está a fazer com que o sistema não consiga mostrar a ficha ténica desejada. Pedimos desculpa pelo incómodo.

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