Da República aos dias de hoje: a charmosa história de Campo de Ourique

A histórica pastelaria A Tentadora tem mais de 100 anos nesta morada. (Fotografia de Leonardo Negrão/GI)
O chiar do elétrico sobre os carris, o rebate dos sinos da igreja, o jogo de sombras das árvores e as diferentes línguas dos passantes, tudo isto dá origem à sinestesia do bairro de Campo de Ourique, considerado um dos mais emblemáticos da capital.

Todos os dias milhares de pessoas o cruzam em afazeres diários, trabalho ou lazer, desconhecendo talvez os contornos da sua rica e longa história que perpassa em larga medida a do próprio país, pois foi nele que eclodiu o movimento republicano. Campo de Ourique foi projetado por Frederico Ressano Garcia após a implantação da República, em 1910, ocupando um retângulo estendido entre as ruas Ferreira Borges e Tomás de Anunciação, Campo de Ourique e Saraiva de Carvalho. O seu traçado retilíneo e marcado por quarteirões surgiu em linha com o do antigo quartel situado na Rua Ferreira Borges, o qual veio a popularizar também o Jardim Teófilo Braga como Jardim da Parada, em virtude de ter sido o terreiro da parada militar.

A expressão “rés-vés Campo de Ourique” corre nas bocas do povo e associa-se, por norma, ao facto de o destrutivo terramoto de 1755 ter poupado o bairro, mas é bom lembrar que naquele século a urbanização ainda não existia. A crer na informação publicada no website da Câmara Municipal de Lisboa, ganha força a teoria de ter sido um bairro limítrofe, ficando “por um triz, por pouco, à justa” com a Rua Maria Pia. Idiossincrasias que todos os bairros carregam e que se perpetuam no tempo.

Ainda durante a primeira República foi no bairro que se consolidaram as tradições republicanas e reivindicativas, com greves, protestos e manifestações populares a tomarem conta das ruas. Cafés e tertúlias como a centenária pastelaria A Tentadora e O Canas reuniram movimentos patrióticos e republicanos, dando palco a nomes de vulto ligados à cultura e à política portuguesas. A Tentadora, de resto, é também um marco arquitetónico da Arte Nova, tendo sido projetada por Ernesto Korrodi.

(Fotografia de Paulo Spranger/GI)

A cultura sempre correu nas veias do bairro, conforme lembram as casas-museus dedicadas a Amália Rodrigues e Fernando Pessoa – ambas com programação cultural regular e aberta à cidade. O Mercado de Campo de Ourique, revitalizado, é outro dos pontos centrais da população. Numa outra esfera de curiosidade encontra-se ainda, na Rua Sampaio Bruno, um afloramento de calcário rico em briozoários fósseis, datado entre 21 e 23 milhões de anos, quando tudo era oceano.


O concorrido Elétrico 28

A carreira do Elétrico 28 da Carris já deu muitas voltas antes de chegar ao percurso de hoje, entre os Prazeres, na freguesia da Estrela, e o Martim Moniz. Apareceu em 1901, com uma carruagem puxada por cavalos, e só em 1914 ganhou o formato que hoje conhecemos, sendo na altura apelidado de “Amarelo”. Ícone alfacinha, motivou a criação de um jogo de tabuleiro e inspirou até o criador de um brinquedo em peças de Lego. Por estar referido em todos os guias, circula quase sempre cheio de turistas, que percorrem o sobe e desce dos bairros antigos encantados com a vista.


 




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