Há um novo roteiro para respirar os bons ares de Penacova

Há um novo roteiro para respirar os bons ares de Penacova
No início do século XX, a vila do distrito de Coimbra era procurada pelos chamados aristas, pessoas que ali passavam temporadas, atraídas pela qualidade do ar e pelas paisagens. O novo Roteiro do Arista é pretexto ideal para conhecer este território com moinhos, fornos de cal e um mosteiro que é dos mais antigos da Europa.

Aristas. Foi por esse nome que ficaram conhecidas as pessoas que, no início do século XX, passavam longas temporadas em Penacova, para respirar o seu ar puro e desfrutar das suas paisagens. A vila, empoleirada lá no alto, tinha ainda a vantagem de estar perto de Coimbra e das termas de Luso. Desse passado se fez presente: o município acaba de lançar o Roteiro do Arista, com oito locais a visitar, cada um deles com uma das letras que formam a palavra Penacova, em tamanho gigante – um convite para descobrir o território, tendo a natureza como fio condutor.

O arranque é no Penedo do Castro, que oferece uma bela panorâmica sobre o Vale do Mondego e está associado a uma antiga tradição carnavalesca. De lá antigamente partilhavam-se histórias embaraçosas sobre os habitantes, de forma anónima, usando uma aparelhagem sonora. Este miradouro é uma das obras que a Sociedade de Propaganda de Portugal, composta sobretudo por lisboetas, deixou no concelho, há mais de cem anos.

Outro ponto do roteiro com uma vista arrebatadora é o Mirante Emydgio da Silva, que lembra um pagode oriental, com colunas provenientes do Mosteiro de Lorvão. A propósito dele, Vitorino Nemésio até escreveu que dali parecia estar «a ver a catedral do púlpito». Fica numa zona alta, no centro de Penacova, que já teve um castelo, uma capela, um preventório para filhos de pais tuberculosos e um hotel, hoje em ruínas.

Rematando este troço do passeio com um passeio a pé pelo casco velho da vila, há que parar na Tasquinha do Clides e escolher o almoço entre pratos como barriguinhas de leitão, bacalhau com grão ou dobrada. Doutores, agricultores, pedreiros – toda a gente entra na tasca de Euclides Amaral e Adelaide Carvalho. «Tenho clientes que vêm da sala com o prato pedir mais comida; é como se fosse uma família», diz ela.

Outra opção é o Panorâmico, um restaurante com vista, onde se serve aquilo que os seus donos, Dalila Correia e Paulo Cruz, resumem como «comida tradicional portuguesa com muito sabor e apresentação mais moderna». Referem-se aos peixinhos da horta de espargos, arroz de pato e chanfana. Está há um ano nas mãos deles, que o decoraram a pensar na natureza – não se foge a ela, numa terra ainda com alguma ruralidade.

A Serra de Gavinhos proporciona vistas amplas como esta, junto aos moinhos. (Fotografia de Maria João Gala/GI)

 

Moinhos, ovos e cal

A manter-nos no roteiro do arista, o caminho segue a descer da vila até à Praia Fluvial do Reconquinho, com bandeira azul, de onde se avista corvos marinhos e até cabras. E dali para o grupo molinológico da Serra de Gavinhos, em Figueira do Lorvão, onde nos deparamos com uma bela vista panorâmica e um monumento em honra do Sagrado Coração de Maria – construção tão desejada pela população, que deu ovos à paróquia para vender e financiar a obra. Mas o maior encanto do lugar, porém, serão os 14 moinhos, e saber que ainda lá anda um moleiro entre maio a outubro.

Gente a trabalhar é o que já não se encontra nos dez Fornos de Cal de Casal de Santo Amaro, que transformavam a pedra calcária das encostas em frente em cal parda, utilizada na construção, conta Luís Rodrigues, técnico de turismo da Câmara de Penacova. Os homens escavavam a rocha com picaretas e as mulheres carregavam a pedra à cabeça, em cestos de vime.

A paisagem que marca todo este roteiro em homenagem aos bons ares foi o que fez nascer o Hotel Rural Quinta da Conchada. Foi António Dias quem o mandou constuir junto à albufeira da Barragem da Aguieira, encantado com o panorama. Este quatro estrelas tem dez quartos, spa, massagens e passeios de barco por marcação (ler caixa). No restaurante também se fica confortado, com uma carta que inclui naco na pedra, bacalhau na telha ou lampreia, na época dela, entre janeiro e abril. Jardins, piscina e uma esplanada completam o quadro de sossego, passada a aflição dos incêndios de outubro de 2017, cujas marcas ainda são visíveis.

A praia fluvial do Vimieiro tem o rio Alva a correr selvagem, com águas de qualidade com certificação Bandeira Azul. (Fotografia de Maria João Gala/GI)

 

Um rio selvagem e uma praia

É rente à água que continua o Roteiro do Arista, pela Praia Fluvial do Vimieiro. Ostenta a bandeira azul, tem o rio Alva a correr selvagem e um restaurante. É O Vimieiro, mas podia chamar-se Nuno e Susana, porque o casal Frias é a alma da casa, acolhedora, com pratos como javali estufado com castanhas, ou polvo doce com salada e arroz de passas.

Neste canto bucólico nem sequer falta cama para descansar. O Medronheiro é uma casa de xisto, de tipologia familiar (dois quartos, um de casal e outro com dois beliches, inserida no primeiro medronhal do mundo com produção certificada. Tem lareira, salamandra e a música do Alva, habitado por trutas e lontras. Este afluente do Mondego é dos rios mais limpos do planeta, garante Carlos Fonseca, responsável pelo projeto, biólogo e professor universitário.

O roteiro não acaba antes de uma paragem na lendária EN2, que liga Chaves e Faro, para ver a Livraria do Mondego. O geomonumento, formado ao longo de 400 milhões de anos, tem esse nome porque as altas assentadas de quartzíticos dispostos quase na vertical parecem lombadas de livros.
Nas páginas da história está, sem dúvida, a última paragem do roteiro: o Mosteiro de Lorvão, que terá sido fundado no século VI, e no século XIII passou de mosteiro masculino a feminino, com a chegada das filhas de D. Sancho I. D. Teresa, que viu anulado o seu casamento com o rei de Leão, fez sair os frades, instalou-se lá e tornou-se numa das mulheres mais poderosas do reino.

É um monumento cheio de curiosidades, mas há três peças que se destacam: o órgão de tubos de dupla face; a grade de ferro forjado e aplicações em bronze que separava o coro da igreja; e o cadeiral em jacarandá negro e nogueira. Deste berço de doçaria conventual ainda hoje se sai consolado. Principalmente depois de subir ao topo do edifício para apreciar a vista e, uma vez mais, respirar os bons ares de Penacova.

A empresa 3 Rios faz passeios de barco entre as barragens da Aguieira e do Coiço. (Fotografia de Maria João Gala/GI)

PASSEIOS DE BARCO
A empresa 3 Rios faz passeios de barco com partida do Hotel Rural Quinta da Conchada, entre as barragens da Aguieira e do Coiço, durante hora e meia. O barco Furão sai pelo valor mínimo de 60 euros e tem capacidade para 12 a 15 pessoas. É um programa tranquilo, em que se pode observar aves como a águia, a cegonha ou o pato-real e, no verão, dar um mergulho.

Lampreia de ovos, palito de Lorvão, pastel de Lorvão, nevada e queijinho com palitos artesanais de Penacova. (Fotografia de Maria João Gala/GI)

DOCES CONVENTUAIS
Lampreia de ovos, palito de Lorvão, pastel de Lorvão, queijinho e nevada. Está tudo na pastelaria O Mosteiro, dedicada à doçaria conventual que teve origem no Mosteiro do Lorvão. Quando lá havia receções, os doces eram enfeitados com os famosos palitos de madeira trabalhada. A indústria paliteira teve tanto peso na região, que os palitos de pá e bico, menos artísticos, chegaram a ser moeda de troca.

Fátima Lopes é paliteira. Faz miniaturas de madeira. (Fotografia de Maria João Gala/GI)

ARTESÃ DE MADEIRA
Chamam-lhe paliteira, mas Fátima Lopes diz-se artesã de miniaturas de madeira, pois não faz só os tradicionais palitos, de flor ou de pestana, conforme sejam trabalhados; também cria moinhos e presépios com madeira de salgueiro e uma navalha aguçada. Aprendeu com a mãe, Palmira. Na oficina, até recebem grupos em excursão.

 

Algo está a fazer com que o sistema não consiga mostrar a ficha ténica desejada. Pedimos desculpa pelo incómodo.

 

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