O planalto com carisma entre Douro e Serra da Estrela

O planalto com carisma entre Douro e Serra da Estrela
Do cimo da Serra da Marofa vê-se um planalto que se estende até Espanha: Figueira de Castelo Rodrigo. Um território da Beira Alta a explorar, feito de vinhas, aldeias históricas e uma quinta isolada que voltou a ganhar vida. Veja mais na galeria.

Encaixado numa encosta da Serra da Marofa, o Colmeal passou de aldeia desabitada e em ruínas a aldeia dedicada ao turismo rural. Em finais de 2015, o Colmeal Countryside Hotel abriu portas, depois de quatro anos de obras que reabilitaram, com projeto do arquiteto Pedro Brígida, parte das casas do antigo povoado. Nelas se incluía o Solar dos Cabrais, onde funciona agora recepção, restaurante e 11 quartos do hotel, que também tem apartamentos individuais.

A quinta de 1200 hectares deixou de ser habitada em 1957, depois de uma ação de despejo que obrigou os habitantes a abandonarem o local. Passou desde então por várias fases, quase sempre despercebida devido ao isolamento e aos difíceis acessos. «A quinta, que foi da família de Pedro Álvares Cabral, foi comprada pelo meu avô, sem rendeiros», explica João Leitão, atual proprietário. Nos anos 1970, era sítio de pastagem de ovelhas e cabras, de produção de mel, de macieiras e oliveiras. Nos anos 80, foram plantados eucaliptos. O avô faleceu nos anos 1990 e dentro das partilhas, João e dois irmãos ficaram com este pedaço. «Para isto não se perder, era preciso cuidar o melhor possível. Restabelecemos exploração agrícola, plantámos vinha, e estamos a converter as plantações de eucalipto com carvalhos, azinheiras e sobreiros», espécies próprias desta região da Beira Interior.

 

 

Muitos dos produtos que agora saem da terra vão para a mesa do restaurante do hotel, que tem consultoria do chef Vítor Sobral, sendo o chef de serviço Pedro Oliveira. «Queremos valorizar os produtos locais, o que comemos também é cultura», diz António Andrês, diretor e supervisor operacional do hotel, que gosta de dar a conhecer aos hóspedes esta região que, entre o Douro e a Serra da Estrela, tem carisma próprio.

Pouco basta para o comprovar, já que subir o monte para se conhecer melhor a Serra da Marofa é tarefa fácil a partir do Colmeal, seguindo depois pelos vários trilhos pedestres que o hotel sugere, a pé ou em todo-o-terreno. No cimo da serra, encontra-se uma estátua do Cristo Rei, idealizada pelo influente padre Canário Martins e que foi inaugurada em 1956, sendo assim a mais antiga estátua do género no país. De braços abertos para o planalto pontuado pelo monte da aldeia história de Castelo Rodrigo, a vila de Figueira de Castelo Rodrigo, a albufeira de Santa Maria de Aguiar, a aldeia Mata de Lobos e o vale do Douro, funciona quase como um convite para se descer a ladeira e explorar o território de perto. E pode começar-se por uma das riquezas da região: o vinho.

 

Pinking: um branco diferente

Frescos, aromáticos e elegantes são provavelmente as três melhores palavras para definir os vinhos que se fazem por aqui. A altitude das vinhas – 400 a 750 metros -, o clima de muito frio no inverno e calor e seca no verão, os solos graníticos e xistosos conjugam-se para ajudar a definir o perfil do vinho da Beira Interior, região demarcada apenas em 1999, mas onde se produz há séculos.

Nos últimos anos tem havido uma aposta na divulgação destes vinhos. A Adega Cooperativa de Figueira de Castelo Rodrigo, fundada em 1956, é uma das entidades na dianteira da promoção do enoturismo, tendo inaugurado em 2017 uma confortável e moderna sala de provas na loja, com lugar para 60 pessoas. Abriu as portas a visitas guiadas e lançou o singular vinho Pinking, um branco de cor rosa salmão, feito com a casta síria, típica da região.

Uma das garrafas do vinho Pinking.

A enóloga Jenny Silva, que está à frente da produção há treze anos, é a grande responsável por este vinho. «O pinking era tratado como defeito», explica. Na sua tese de mestrado, feita na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Jenny percebeu que o fenómeno era provocado no final da maturação da vinha, «nos primeiros 10 dias de outubro e por causa das condições climáticas».

Este fenómeno – que já foi observado em outras castas, como Sauvignon Blanc, Chardonnay e Riesling – passou agora a ser tratado como ‘feitio’ e não como defeito. E até já foi patenteado, com a primeira produção a ser lançada no mercado no ano que passou. Outra estratégia de promoção passa por associar as marcas à região onde o turismo tem crescido, principalmente no que toca a visitas à aldeia histórica de Castelo Rodrigo. Num futuro próximo, a adega quer reabilitar os espaço sem modificar o seu traço original, criando melhores condições para a produção e para quem a visita.

Se a valorização dos vinhos da Beira Interior é relativamente recente, não quer dizer que a sua produção o seja – e remonta mesmo ao tempo dos romanos.

Mas a região como hoje se conhece começou a definir-se no século XII quando ali se instalaram os monges cistercienses com a sua máxima ora et labora (reza e trabalha) e com a suas culturas tradicionais da Borgonha – a vinha e a amêndoa. Isto no tempo em que região era disputada por leoneses e portugueses na sua demanda de reconquista aos árabes. O Convento de Santa Maria de Aguiar, erigido pelo ordem, hoje musealizado e visitável, foi construído em finais século XII. Vale uma visita a esta construção românica tardia, imponente e austera. Uma escultura do século XIII da Catarina de Alexandria, em jade, e outra da crucificação estão entre as suas maiores preciosidades.

 

A doceira Geninha

Da austeridade do convento passa-se para a descontração e alegria da Geninha, como é conhecida Eugénia Torres, que recebe de sorriso e braços abertos quem se dirige à sua pequena fábrica, em Figueira de Castelo Rodrigo, a escassos dois quilómetros do convento. Sabores da Geninha é a marca que criou em 2003 para oficializar aquilo que já fazia desde 1999: amêndoas doces e compotas com outros produtos locais. «Comecei a fazer para os amigos e depois a vender nos postos de turismo e a fazer feiras», conta. O sucesso foi tanto que criou a marca e, em 2008, abriu a fábrica. «Sou muito curiosa e como sempre me interessei por isto, não é nada difícil», diz.

A premiada doceira Geninha.

Hoje, continua a fazer as tradicionais amêndoas, mas também bolos e bolachas à base de amêndoa, manteiga de amêndoa, pasta de azeitona, azeitona britada e vários tipos de compota. Na sala de entrada da fábrica, onde se pode comprar os produtos, exibe na parede todos os prémios que teve ao longo dos anos. O mais recente é do concurso nacional de frutos secos tradicionais portugueses de 2018, no qual ganhou as medalhas A Jóia da Coroa e a Melhor dos Melhores, com umas simples amêndoas torradas. «Desta não estava à espera», diz Eugénia com um sorriso largo. Desde há dois anos que tem uma loja em Castelo Rodrigo onde, além de vender doçaria, vende também artesanato. Esta é apenas uma das muitas razões para se subir até a uma das mais belas e importantes aldeias históricas portuguesas, visitar o castelo medieval e, mais uma vez, contemplar de cima a vastidão da paisagem.

 

Garganta do Colmeal

Num dos três trilhos pedestres propostos pela Colmeal Countryside há uma rota que passa pela garganta do Colmeal e que acompanhada a ribeira de mesmo nome, a uns escassos 150 metros do hotel. Aqui, podem observar-se aves de rapina que nidificam nas falésias e também encontrar pinturas rupestres que remontam ao neolítico. É só pedir dicas ao hotel e estar de olhos bem abertos.

Da Colmeal Countryside podem observar-se aves de rapina.

 

Albufeira de Santa Maria de Aguiar

Quem gosta de praticar birdwatching tem nesta albufeira um óptimo ponto de observação. Desde 1981 que a construção da barragem modificou a zona, que é agora sítio de grande biodiversidade. Aqui, há um abrigo para a observação de aves, um espaçoso parque de merendas e uma vista aberta para as serras envolventes.

A albufeira da Barragem de Santa Maria de Aguiar.

 

Restaurante Casa d’Irene

Vale a pena percorrer alguns quilómetros até à aldeia de Malpartida, já perto da aldeia histórica de Almeida, para almoçar na Casa d’Irene. Nascida e criada na aldeia, Irene Frias não tem mãos a medir entre a cozinha e a sala, tanta é a clientela que ali pára na hora do almoço. A aventura começou quando abriu um mini-mercado e um bar na localidade. A escassez de população deixou de justificar o mini-mercado e Irene começou, então, a fazer uns petiscos no bar e depois estes pratos de comida tradicional.

O arroz de polvo da Casa d’Irene.

 

 

Algo está a fazer com que o sistema não consiga mostrar a ficha ténica desejada. Pedimos desculpa pelo incómodo.

 

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