Crítica de restaurante: Galeria do Largo, Porto

A Araújo & Sobrinho diz ainda muito aos tripeiros ligados às artes, outrora ponto de encontro ocasional dos que buscavam materiais para executar os seus trabalhos e onde de tudo um pouco acontecia. Mantém-se o vício e o gesto do belo, no Galeria do Largo. À mesa, pois claro.

Nasci no Porto e mantenho com a Invicta uma relação que não pára de se renovar. A primeira infância foi já passada em Lisboa, onde criei raízes e relações com o inteiramente novo, mas as idas ao Porto sempre tiveram um lado épico que dava cor a uma cidade que me habituei a considerar cinzenta. A fotografia culta que se praticava no Porto, o mundo artístico a que tive acesso na juventude ajudaram-me a viver e crescer com a convicção de que um pouco do telúrico imanente me pertencia um pouco a mim também.

Talvez por isso, fazia parte dos pequenos prazeres passar pela loja artigos para belas artes nem que fosse para comprar um lápis, e sentir os cheiros e os sons da Araújo & Sobrinho, no Largo de São Domingos. Nesse mesmo lugar, ergueu-se o hotel A.S. 1829, de nome óbvio, a loja arredou-se e nasceu o restaurante Galeria do Largo, voltado e vertido para a rua. Foi em boca hora convocado o chef Manuel Ferreira, talento intelectualmente orientado, sensível às muitas influências e histórias do incrível lugar em que nos encontramos, visão experiente do gosto português, que torna muito seu.

Sentei-me a primeira vez aqui ao almoço e viajei no tempo, na geografia, e na leitura moderna irrecusável que o lugar continua a inspirar. Entrada, prato e sobremesa a 14,5 euros é difícil de bater em qualquer parte do mundo, tudo com recorte culinário cuidado, a informalidade no serviço que nos põe a nós também à vontade, mas acima de tudo o privilégio de estar sentado à mesa a ver a gente lá fora a passar. Um Porto que a minha criança nunca conheceu. Voltámos ambos, a criança e eu, noutro dia para jantar e o tempo é outro.

Pratica-se a ciência da hospitalidade nesta casa, porta franca essa sim, a sentar e servir pessoas vindas de longe, das quatro partidas do mundo, o que coloca nota cosmopolita na cozinha, que também se sente. Excecional a entrada de vieiras em duas texturas, cremoso de couve-flor, gema curada e manga (12 euros), regionalíssimo o cachaço de porco fumado com folar transmontano e castanhas em alecrim e mel (10 euros), inevitável o escalope de foie gras sobre brioche, terrina de maçã assada e moscatel do Douro (14 euros).

Nos peixes sobressai o ossobuco de tamboril sobre algas marinhas e risoto negro com poejo (19,5 euros), leitura brilhante do mar e da terra, clássica a lagosta em manteiga, ravioli de sapateira, musseline de funcho e pérolas de legumes anizadas (24 euros). Nas carnes, imperdível a royale de lebre, musseline de pastinaca e croquete de chouriço de cebola (18,5 euros), saudavelmente pedagógica a cachena DOP com grelos suados em azeite e alho, batata sauté em cebolada e ervas, molho mirandês (25 euros). Galeria vibrante, esta do Largo.

Classificação
O espaço: 4,5
O serviço: 4
A comida: 5

A refeição ideal
– Sopa de cebola gratinada (5,2 euros)
– Vieiras em duas texturas, cremoso de couve-flor, gema curada e manga (12 euros)
– Ossobuco de tamboril sobre algas marinhas e risoto negro com poejo (19,5 euros)
– Royale de lebre, musseline de pastinaca, e croquete de de chouriço de cebola do Minho (18,5 euros)
– O coco, laranja e o gengibre (5 euros)

Algo está a fazer com que o sistema não consiga mostrar a ficha ténica desejada. Pedimos desculpa pelo incómodo.

 

Leia também:

Crítica de restaurante: Líder, no Porto
O crítico Fernando Melo avalia o Soundwich, do Porto
Crítica: 1858 bbgourmet, em Cedofeita




Outros Artigos





Outros Conteúdos GMG





Send this to friend