Crítica de Fernando Melo: restaurante A Lúria, Tomar

Restaurante A Lúria «é mais do que abrigo», diz Fernando Melo. Fotografia: Henriques da Cunha/GI
Não há muitos sítios assim. Aliás, não há nenhum sítio assim. Até podia ser da centralidade geográfica que ninguém lhe pode negar. Esta lúria é mais que abrigo, é genuíno ponto de convergência de todas as épocas gastronómicas do ano e de todas as especialidades.

Fátima e Francisco Antunes assumiram o local que o pai de Fátima fundou e, como acontece com todo o grande tesouro, deixaram que crescesse, apenas. Deve ser isto que se diz ser bem-nascido. Ao longo do ano, encontro aqui nas grandes marés da cozinha tradicional portuguesa gente vinda de norte a sul, de lés a lés, para se sentar à mesa e passar meia dúzia de horas bem passadas. Os viajantes pressurosos também encontram recompensa, mas o tempo é dimensão maior.

Inesquecível o dia em que cheguei com o fito das silarcas – os cogumelos amanitas ponderosa chamam-se cilercas no Ribatejo – e na pérgula da entrada estavam meia dúzia de lampreias a abocanhar a pedra, enquanto esperavam a vez para a mortificação e processamento. Tinham vindo do rio Minho, eram das primeiras, assunto quase secreto. Tanto ou tão pouco que em meia hora a horda preenchia todas as mesas e espaços. Uma mesa de algarvios, duas de alentejanos, etc., ao fim e ao cabo ocupação matizada, comensais que se puseram a caminho de manhã para provar as especialidades recorrentes do Lúria ao almoço, depois voltar pela noitinha para os pontos de partida.

As ditas cilercas são servidas simplesmente assadas (10 euros) ou com ovos (8 euros), sendo que a variante pura é que se recomenda, sobretudo para quem não conhece. Ganha-se pedindo também por exemplo um queijinho de cabra curado (4 euros) e petinga no forno (5 euros), espécie de cebolada da sardinha-bebé sem exageros de tempero. Além de nos entretemos, enjeitamos a ansiedade inconfessa mas que sempre se instala enquanto a cozinha elabora o pedido. Carne ou peixe, carne e peixe, já que se leva fome melhor ambas, no tempo dela sai um arroz da dita (20 euros) que pede vénia, assim como duas açordas de antologia, seja a de cherne (14 euros) ou sável (14 euros). É difícil de descrever de vezeiro por aí que é o polvo grelhado (14 euros) mas é de considerar aqui, em modo quintessencial.

O magusto de carnes (26 euros, 2 pessoas) consta de peças de cabrito, porco e vaca, acompanhado de deliciosa açorda de cilercas no pão, mais que suficiente quando se pende mais para carnívoro. Assunto muito sério e ponto de honra da Lúria é o cabrito, que há quase sempre e tem zénite no forno (15 euros), competente e gostoso na brasa (15 euros). O bovino mirandês declina aqui uma posta deliciosa (15 euros) mas há que deixar espaço para a copiosa oferta de sobremesas, todos os dias diferente. Vai para três décadas a tratar assim bem de nós e sair com a impressão de estar em casa. Não há igual.

Classificação

O espaço: 4,5

O serviço: 4

A comida: 4,5

A refeição ideal

Cilercas assadas (10 euros)

Estaladiço de caça (8 euros)

Petinga no forno (5 euros)

Polvo grelhado (14 euros)

Cabrito no forço (15 euros)

Algo está a fazer com que o sistema não consiga mostrar a ficha ténica desejada. Pedimos desculpa pelo incómodo.

Leia também:

A cidade de Tomar além do Convento de Cristo
Crítica de Fernando Melo: Cais da Villa, Vila Real
Crítica de Fernando Melo: restaurante A Cave




Outros Artigos





Outros Conteúdos GMG





Send this to friend