Crónica de Tiago Guilherme: ser turista na minha cidade, em Lisboa

Opinião: ser turista em Lisboa, a minha cidade
Crónica assinada por Tiago Guilherme sobre a cidade de Lisboa.

De estados da União Europeia como a Alemanha, a Itália, a Espanha e a Bélgica, mas também de países como Israel ou o Brasil. Nos últimos meses tenho recebido em Lisboa amigos de vários lugares e feito de guia turístico na minha própria cidade, o que é uma experiência enriquecedora. Percorrer as ruas, as vielas e as avenidas com o olhar de pessoas que as veem pela primeira vez é, de facto, um exercício que nos faz também observá-las de forma diferente.

Há umas semanas estava no miradouro da Graça com uma alemã e um israelita que vive na Alemanha. E ficámos os três ali a contemplar aquela vista, com o castelo, o rio e a Ponte 25 de Abril à esquerda, a Baixa, Chiado e Príncipe Real à frente e Avenida da Liberdade e Avenidas Novas à direita.

Depois de uns comentários banais sobre os pontos visíveis dali, mantivemo-nos em silêncio uns bons 10 minutos. Só a olhar. Era manhã e o sol ainda estava atrás de nós iluminando todo o casario. Que privilégio este, num dia de fevereiro, com temperaturas amenas e poder estar tranquilamente a usufruir deste espetáculo urbano e natural ao mesmo tempo. E partilhar este amor pela minha própria cidade com amigos de outras paragens.

Dali seguimos para o Castelo de São Jorge. Felizmente ainda não estava apinhado de turistas e, mais uma vez, a vista ocupou o nosso tempo. O israelita apenas conseguiu dizer: “This city is so fucking amazing”. No dia anterior ele tinha ido com a minha amiga alemã aprender a surfar em Carcavelos e estava doido com o clima, as praias, as vistas, os locais históricos. E perguntou-me se Lisboa não seria a melhor cidade da Europa. Claro que eu não poderia ter uma opinião totalmente isenta, mas respondi-lhe que Lisboa seria perfeita se em Portugal tivéssemos os salários da Alemanha, apontando para a nossa amiga em comum. Ele riu–se e disse: “Não há lugares perfeitos”.

E o israelita tem toda a razão. Cada lugar é bom dependendo daquilo que queremos para nós, daquilo que exigimos como qualidade de vida, do que nos faz sentir bem. E Lisboa faz-me sentir bem. Depois de um percurso a pé que passou por Alfama, Praça do Comércio, Praça do Município, Rossio, Chiado e Carmo sentámo-nos na esplanada do Miradouro de São Pedro de Alcântara. Apesar da grade que ainda ali está por causa das obras de sustentação das terras, é mais uma vista que encanta. Pedimos umas imperiais.

De repente, lembrei-me que estava em Lisboa sentado com uma alemã e com um israelita que vive na Alemanha. E atirei: “Há 75 anos este nosso encontro seria impossível. Eu viveria numa ditadura com um país fechado ao Mundo e vocês na Alemanha não poderiam estar juntos numa mesa por causa do nazismo”. E nós os três de repente apercebemo-nos com a nossa própria vivência do privilégio que é viver numa Europa com paz e liberdade. E rimos, emocionados.

 

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