Crónica de Luísa Marinho: o fim do verão

Praia do Cabedelo, Viana do Castelo. (Fotografia de Amin Chaar/GI)
Durante a minha infância e adolescência, passei as férias de verão em parques de campismo. O meu pai não dispensava um agosto ao ar livre, longe da confusão citadina, por entre pinheiros, melgas e brasas de churrasco.

Quando começam as chuvas de setembro puxadas pelo vento húmido do litoral, volto a sentir aquela sensação de final de férias que por esta altura acontecia quando era criança. Durante muitos anos, passei férias em família num parque de campismo junto ao mar, bem perto de Viana do Castelo.

Não posso dizer que adorava fazer campismo. Sentia um certo desconforto – calor, melgas e vento – e mesmo tédio. Não tinha muito para fazer a não ser brincar com as minhas irmãs, o que era bom, ir à praia, não tão bom, ou passear de bicicleta até aos limites do parque à espera que algo excitante acontecesse – “uma aventura”, como nos livros que lia.

Mas nada acontecia, sendo que os melhores finais de tarde eram aqueles em que ia para o meio das árvores apanhar pequenos ramos e carumas para ajudar o meu pai a acender o grelhador, onde uma vez por semana se assava um frango para o jantar. Não éramos família de luxos campistas, pelo menos comparando com outras que instalavam televisores e jardins rodeados por cercas. O que me fazia pensar: com tanto conforto, qual a diferença entre estar aqui ou em casa? Talvez o meu pai pensasse o mesmo, pois nem queria ouvir falar em televisão no campismo.

A companhia era apenas sonora, providenciada por um rádio a pilhas, que tanto servia para escutar os programas de discos pedidos das rádios locais como para acompanhar a Volta a Portugal ou os primeiros jogos do campeonato. Para a minha mãe, as férias não eram mesmo férias, pois era ela que se encarregava da limpeza, das refeições, das filhas: rotinas de sempre com outro cenário.

Já não tão criança, a música passou a ser uma das minhas principais companhias dessas tardes. Passava muito tempo a andar pelas dunas, ouvindo cassetes de rock, gravadas nas minhas rádios favoritas para poder ouvir depois onde não houvesse sinal (era tudo tão diferente Internet…). Ou então na cama de rede, até alguma das minhas irmãs me pedir o walkman a que também tinha direito.

Quando chegavam os últimos dias de campismo, pensava que em breve voltaria à minha cidade, ao ritual do regresso às aulas. Entusiasmava-me o cheiro dos cadernos novos, o primeiro contacto com os livros da escola, pensar em como seriam os professores e colegas. Tudo parecia novo e fresco.

Com a rotina e as desilusões escolares (os professores de que não gostava, os colegas que me destratavam), essa sensação esmorecia. Mas o prazer daqueles primeiros dias de outono era todo meu. E esse regressa sempre agora, com as primeiras chuvas, nas primeiras folhas laranjas que piso na rua, caminhando pela cidade, esperando que tudo volte a ser novo e fresco como antigamente.




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