Viriatos, cupcakes e outros doces para descobrir (e provar) em Viseu

Da «polémica» sobre o viriato original aos cupcakes que deixam muita gente espantada, Viseu tem boa mão para a doçaria e um gosto especial por aquilo que não amarga na boca - tanto no campo do tradicional como no da novidade.

Lenda ou facto histórico, nenhuma outra terra se atreve a reclamar a Viseu o epíteto de cidade-berço de Viriato. Não admira por isso que o doce de maior fama desta cidade responda, precisamente, pelo nome do herói lusitano. Viriatos há muitos, espalhados um pouco por todas as confeitarias e pastelarias de Viseu e arredores, mas, todos os anos, por altura da Feira de São Mateus, um punhado de casas submete as suas versões à apreciação de um júri e do público. Na edição de 2016, o vencedor foi o do Café das Beiras, que conserva o título pelo menos até ao final de agosto e não tem mãos a medir desde então – por dia sai uma média de 100 a 120 unidades.

O que terá conquistado o júri? Quanto à massa parece não haver grande segredo (é de brioche, à base de farinha, fermento, ovos, água, sal, açúcar e margarina), mas já o recheio parece ser, por estes dias, um divisor de águas. A receita original e o formato em V são atribuídos a três confeiteiros vindos de Lisboa, que os terão começado a produzir em Viseu por volta de 1956, sendo que os mais antigos garantem que o recheio não era de creme, como entretanto se generalizou, mas apenas de coco, ovos e açúcar. Mais seco, dirão alguns, o certo é que o Café das Beiras, fundado em 1958, faz gala em manter-se fiel ao espírito original.

Não se pode, no entanto, subestimar a opinião pública, tanto que o voto popular, no mesmo ano, foi para a versão da Confeitaria Amaral. Casa muito respeitada, em funcionamento desde 1952 e com várias especialidades reconhecidas, deu a volta à receita para rechear o Viriato com o creme da discórdia. A criação encontra-se registada e, por muito que alguns lhe torçam o nariz, caiu de tal forma no goto que é das mais copiadas.

A rotundinha é um pastel redondo de massa folhada com recheio de doce de ovos e amêndoa laminada, inspirado nas muitas rotundas à volta da Confeitaria Amaral

Com patente registada está também a rotundinha de Viseu, outra criação da Amaral, que, inspirada nas muitas rotundas à volta, criou um pastel redondo de massa folhada muito fina e estaladiça com recheio de doce de ovos e amêndoa laminada (semitorrada e moída). Aqui encontramos igualmente os pastéis de feijão (confecionados apenas com feijão branco), as castanhas de ovos (doce conventual) ou as famosas cavacas – maiores do que o habitual, muitas delas conservam o formato de malga para recordar os tempos em que, à falta das mesmas, estas eram usadas para provar nas adegas os primeiros vinhos do ano produzidos no Dão. Hoje há quem prefira combiná-las com o espumante da região.

Na Delícia Chocolateria, a tradição remonta «só» a 1997 e o negócio é outro, mas enche de orgulho quer os seus mentores quer a população. À frente do projeto, com pontos de revenda no resto do país e a partir de agora no Japão, o casal Manuela Soares, gerente, e Ilídio Oliveira, mestre-chocolateiro. Inspirada na antiga mercearia dos seus pais, Manuela fez questão de desenhar os móveis da loja aberta há quatro anos – tal como o fez antes, quando começaram por vender gomas noutro local -, um detalhe nada pequeno que se junta à cozinha-ateliê à vista dos fregueses. Com duas fábricas (de onde saem, entre outras coisas, as conhecidas sombrinhas e as barritas de fruta e frutos secos) e reconhecidos como uma das melhores chocolaterias artesanais da Europa, eles fazem ainda questão de vender apenas chocolates de marca própria e têm um gosto particular na sua linha de bombons de autor, que lhes permite uma maior liberdade criativa nos recheios (do touriga nacional à urtiga, sem esquecer um de cinco pimentas e azeite).

Outro casal, Pedro Teixeira e Marina Rebelo, trocaram Cascais por Viseu e as suas carreiras (ela no ensino básico, ele na Sonae) por um projeto de vida ligado aos cupcakes, às pavlovas, aos cheesecakes, aos sorvetes artesanais e a tudo o mais que faça sentido na Velvet Cupcake & Coffee. O negócio começou online (onde se mantém muito ativo, sendo por aqui que, num raio de 50 a 70 quilómetros, muitos continuam a encomendar-lhes as suas festas), mas a abertura de uma pastelaria na parte mais nova da cidade aumentou-lhes a visibilidade. E a responsabilidade. Pedro foi aprender a fazer gelados com italianos para incluir na oferta a Happy Flavors, mas é Marina que fica com a maior fatia da criação. Além de gostarem muito de trabalhar com produtos locais e da época (como as flores), eles estão a incorporar sabores pouco conhecidos vindos do Sudoeste Asiático como são o yuzu ou o cunquate, duas frutas cítricas muito usadas na alta pastelaria. A recetividade, na loja e nos eventos privados que organizam (de aniversários e casamentos), tem sido boa, mas eles tentam estar sempre um passo à frente dos desejos – e das modas. Quando Lisboa e o Porto enjoavam os cupcakes, eles tornaram os seus irresistíveis porque os rechearam (mais húmidos) com um creme vegetal muito leve. Nos doces, como em tudo o mais, há vontades que não mudam, mas há outras que é preciso estimular – e adaptar.

Algo está a fazer com que o sistema não consiga mostrar a ficha ténica desejada. Pedimos desculpa pelo incómodo.




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