Galiza: Onde comer e ir em Santiago de Compostela

Os restaurantes e bares que estão a fazer mexer Santiago, o mercado, as histórias da cidade dos peregrinos e onde comprar tarte de amêndoas caseira são algumas das sugestões deste roteiro pelo município galego.

A noite já vai avançada quando, à mesa de um restaurante em Santiago de Compostela, pousam livros com o nome de Zeca Afonso e de Salgueiro Maia. A sorrir, por detrás das lombadas, está Jesús Coba, ou Suso, como é conhecido o dono dos livros e de O Dezaseis. O movimento no restaurante, que foi em tempos cavalariça, já diminuiu. Tem uma sala no piso superior e duas na cave com mobiliário antigo, quadros nas paredes de pedra e uma videira que ocupa o teto do último salão.

Os empregados vão passando com bandejas de pimentos de Padrón, croquetes de choco preto, presunto, empanadas e tortilla ou com o afamado pudim de leite caseiro d’O Dezaseis. Os pratos da sobremesa ainda estão na mesa quando chega Suso que, com a boa-disposição caraterística dos galegos, arredonda a sua história num tiro, tudo para passar a uma das suas grandes paixões: o fado. Gosta de Carlos do Carmo, de Camané, de António Zambujo e Mariza, alguns clientes habituais do restaurante.

É sempre desfiando conversas em torno de Portugal e da Galiza que veste o casaco e percorre, no início da madrugada, as ruas da cidade peregrina e dos estudantes para mostrar o bar Casa das Crechas. Teve fama de ser bordel, em tempos, mas hoje são muitos os que param por ali à noite para ouvir concertos de música celta a lembrarem a herança nórdica galega.

Numa curta caminhada até à Praza de Abastos chega-se a outro popular destino noturno, onde de dia funciona o mercado homónimo e à noite se «pica», como dizem os galegos, no Abastos 2.0. O bar que há sete anos conquistou os compostelanos com cozinha galega de produto está no exterior do mercado e divide-se em dois. De um lado a Taberna, com o menu feito de tapas e de marisco comprado no mercado. E do outro lado da rua o Ghálpon Abastos, com menus de degustação, harmonização de vinhos e, às quintas-feiras, hambúrgueres de carne galega e cervejas artesanais.

Vale a pena deitar cedo se o objetivo for conhecer o Mercado de Abastos pela manhã. A azáfama instala-se às quintas e sábados, quando os produtores locais se deslocam até ao Abastos com frutas e legumes. De um lado o corredor do pescado, do outro a carne, com os enchidos, as pernas de jámon e os queijos tetilla a ocupar as montras. O nome é sugestivo e chega para compreender a forma do queijo tradicional, que tem denominação de origem protegida.

O queijo tetilla

Cremoso, vai bem com o vermute, um dos aperitivos que continua a ser moda ao final da manhã. No Abastos é fácil encontrá-lo na pequena A Viñoteca do Mercado, um bar de bebidas, gerido por um compostelano e um pontevedrés (de Pontevedra, entenda-se). O balcão de rua tem pouco espaço, mas nas manhãs de grande movimento qualquer canto do mercado serve para empilhar copos com vinho galego, bem como travessas de queijos e enchidos comprados noutras bancas.

Para verdadeiramente tapear só falta o famoso pulpo a feira, polvo cozido, cortado, regado a azeite e salpicado com pimentão, antes de servido num prato de madeira. Encontra-se na Pulperia Abastos, que fica no corredor onde se instalaram nos últimos anos várias bancas de restauração, como a Mariscomania, que por 5 euros cozinha o marisco do cliente. O pimentão pode ser comprado, em frente, na banca de Soraya Gude, a par dos licores que nunca faltam numa mesa galega no fim da refeição: de ervas, de crema de Oruja (creme de leite) e de café.

O que também não falta é o pão – e aí há que ir até à Panadería Divina do mercado. Mercedes e Eladio Pazos são os irmãos responsáveis pelo sucesso da padaria. Ela dá a cara, ele o corpo ao manifesto, produzindo as broas de milho e de passas, o pão de centeio, de espelta, de kamut e o marinho, que prende as atenções. É feito com água da ria de Arousa, engarrafada por uma empresa galega, e um ex-libris na Divina. É com ele que a jovem chef Lúcia Freitas dá as boas-vindas à entrada do restaurante A Tafona, enquanto elogia o trabalho de Eladio e retira dos cestos outros pães que serão servidos noite adentro: de castanha ou de milho, com cebola, cerveja e azeitona.

As espigas de milho douradas na parede dão a confirmação de que a ligação ao pão não é mero acaso. «A Tafona eram antigas fábricas de pão», explica a responsável pelo restaurante, que está listado no Guia Michelin com o selo Bib Gourmand, garantia de boa comida a preços moderados. A sala não é grande e tem apenas seis mesas, até porque a cozinha é de autor. Fala-se em gastronomia galega vanguardista, que em setembro passou também a estar em Nova Iorque com a abertura da taberna Tomiño, da qual Lúcia é chef executiva.

De volta à Tafona, o azeite galego já está em cima da mesa e o vermute de fabrico artesanal é servido antes da chegada dos snacks, que fazem parte do longo menu de degustação a 40 euros. Uma folha de lima acolhe o muxo – «um peixe dos nossos rios que ainda é desprezado» – e a pele de bacalhau desidratada parece uma batata frita. Há crocantes de foie gras, empanada líquida e morcela galega antes dos pratos principais. Um bom galego diria, no final desta refeição, «Quedei como un pepe» – traduzindo, «Fiquei de barriga cheia». Até porque a lista continua: ceviche de vieira com um sorvete de leche de tigre, pescada com creme de tubérculos, funcho e maçã verde, leitão crocante com marmelo e queijo San Simón e um prato de atum bonito com tomates da horta biológica de Lúcia e figos.

A esta altura a fruta já não será a mesma porque a chef só cozinha com os produtos da temporada. «A cozinha galega sempre valorizou muito o produto, mas faltava vanguarda, faltava dar-lhe outra roupagem e mostrá-lo ao mundo. Esta nova vaga dá protagonismo ao produto, mas também às mãos de quem cozinha e até das artesãs que fazem a loiça», conclui.

Pelas ruas dos peregrinos

A manhã ainda vai a meio, mas na Praza do Obradoiro não faltam mochilas no chão, peregrinos a descansar ao sol ou abraços naquele que é o ponto de chegada do Caminho de Santiago. Um jovem sul-coreano, encostado à mala, conta como a jornada começou num voo até França, para iniciar o caminho francês, o mais importante e popular dos sete principais, seguido do português.

Na verdade, o percurso de um mínimo de 100 quilómetros percorridos a pé só termina no túmulo de Santiago, já dentro da Catedral. Reza a história que, no século IX, um eremita encontrou num bosque a tumba do mártir perdido e que o rei Afonso II das Astúrias ordenou a construção da catedral, cuja entrada na basílica é gratuita. Para visitar os telhados, as escavações que desvendam uma necrópole ou a coleção permanente é necessário comprar bilhete (entre os 10 e os 16 euros).

Peregrinas a descansar na Praza do Obradoiro

Por todo o centro histórico, onde as ruelas apertadas desembocam em ruas pedonais, está a concha da vieira, que guia os peregrinos pelo caminho. Difícil é saber onde pousar os olhos numa cidade com igrejas, estátuas e conventos a cada esquina. E sobretudo, história, que o guia galego vai desvendando. Ainda na Praza do Obradoiro, Javier López aponta a igreja de São Frutuoso, «onde estiveram durante décadas as relíquias roubadas em Braga pelo arcebispo de Compostela».

Fala do Hostal de los Reyes Católicos, o antigo hospital dos peregrinos, entretanto transformado em hotel de luxo, que «continua oferecer diariamente o pequeno-almoço aos dez primeiros peregrinos que ali chegam»; da biblioteca universitária e da Casa do Cabido na Praza de Platerías, que aparenta ser um edifício e é na verdade uma fachada, construída apenas para ornamentar a praça.

A despedida de Santiago faz-se com a tradicional tarte de amêndoas. Pelas ruas da Caldeirería, Nova e do Vilar encontram-se várias lojas que vendem a especialidade, mas vale a pena procurar o portão verde do Mosteiro de San Paio de Antealtares para comprar às freiras a tarte com a cruz de Santiago. É ir pelas 11h00, tocar à campainha e esperar junto à janela do mosteiro de clausura. Por 12,50 euros leva-se para casa o tamanho mais pequeno (mas generoso) do doce conventual.

 

Algo está a fazer com que o sistema não consiga mostrar a ficha ténica desejada. Pedimos desculpa pelo incómodo.

 

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