Pedro Brito: “A minha ideia era fazer bolos de desenho animado”

Pedro Brito vê a pastelaria como uma espécie de escultura, ainda que efémera. (Fotografia de Elisa Azevedo/DR)
Por detrás do projeto Cracked Bolos está Pedro Brito, com um percurso ligado às artes. Isso transparece nos seus bolos de aparência exuberante, assentes em formas, cores e elementos decorativos algo inesperados.

No Instagram, descreve os seus bolos como não ortodoxos.

Todo o processo até chegar aqui foi arranjar a minha forma de fazer bolos. Nunca foi tentar fazer à maneira daquilo que já existia, ou de alguém. Apesar de me inspirar por tudo à volta, é de uma forma muito própria. Por isso é que os defino assim. E também é um statement [declaração]: se já têm uma ideia de bolo, se calhar não é aqui o sítio. Vou sempre fazer da forma que me apetecer e como sair, não vai ser muito previsível. É dar-me essa liberdade, poder reinventar, explorar, experimentar… E mesmo na minha linha pode haver uma coerência, mas que não limite o que vou fazendo.

Disse que vai colher inspiração a todo o lado. Os bolos remetem-me para um universo de contos-de-fadas. Essa é uma das suas referências?

Há vários estilos no que já fiz, muitos têm a ver com isso. Até porque muitas vezes pedem-me bolo de fadas, ou coisas mais etéreas. Mas a minha ideia, inicialmente, era fazer bolos de desenho animado (risos), em termos de escala, elementos e exagero. Uma coisa meio cómica, não sei se é infantil, mas não se leva demasiado a sério. Gosto de usar elementos que tenham a ver com esse exagero, brilhos, cores e texturas assim meio goblin

Há espaço para o acidente, o que acontece no momento. Tenho tido sorte. Quase 100% das pessoas dão-me carta branca para fazer o que quiser. Dizem-me: gosto destes teus bolos, ou o tema é este, mas faz o que quiseres, eu confio.

Encontra-se flores, mas também elementos um bocado inesperados, figuras, bonecos… Como é o seu processo criativo?

Idealmente, a pessoa dá-me um tema, que tento que seja o mais específico possível. E daí é que vêm esses elementos inesperados, até para mim. Se calhar, se não me dessem esse repto, eu não chegaria ali. Vou desenhando coisas, tendo ideias até chegar a uma imagem do que podia ser o bolo. E às vezes fica muito parecido com aquilo que tinha em mente, noutras vezes não. Há espaço para o acidente, o que acontece no momento. Tenho tido sorte. Quase 100% das pessoas dão-me carta branca para fazer o que quiser. Dizem-me: gosto destes teus bolos, ou o tema é este, mas faz o que quiseres, eu confio. Enquanto criativo, é muito bom sentir isso.

(Fotografia: DR)

Procuram-no em que ocasiões?

Já fiz dois bolos de casamento, mas a grande maioria foi para festas de aniversário. Ou é o aniversariante que pede ou os amigos, para lhe oferecer. Também tenho uma versão mini, mais acessível, e quase todos esses minis são para oferecer.

[O meu trabalho na pastelaria] não é muito diferente de escultura. A grande diferença é que é uma coisa efémera, e tem esse objetivo que é ser comestível.

Estudou Design Gráfico, depois Artes Plásticas. Como é que a pastelaria apareceu na sua vida?

A minha mãe e a minha avó sempre fizeram bolos, foi uma coisa que fui aprendendo e gostava de fazer. Por acaso, nunca me interessou a parte decorativa, e achava que era muito complicada, até. Estudei Design Gráfico, licenciei-me em Artes Plásticas, mas nunca pensei usar isso nos bolos. Isto surgiu, como muitos projetos, na pandemia. Mostrei a um amigo um bolo que tinha feito por piada, e ele pediu-me para lhe fazer um bolo de anos. [Antes,] eu tinha feito um workshop online muito curto com a artista Cakes4sport, que é escultora, mas também faz bolos. E aí vi as potencialidades. Pensei: isto é quase como fazer arte; basta saber fazer a base e depois há uma infinidade de coisas a explorar. No workshop, era suposto usarmos elementos que tivéssemos em casa, então usei estrelitas (risos)…. Fui ver o que podia funcionar. Fiquei meio espantado. Mas não pensei: vou fazer um negócio disto. Pensei: vou fazer uma página de Instagram e pondo lá os bolos que faço para amigos ou para mim, pode ser que as pessoas gostem. Rapidamente, pessoas que eu nem conhecia começaram a pedir bolos.

Vê um paralelismo entre a arte e este trabalho que faz na pastelaria.

Sim. Não é muito diferente de escultura. A grande diferença é que é uma coisa efémera, e tem esse objetivo que é ser comestível.

(Fotografia: DR)

Em alguns artigos, surge inserido numa nova tendência da pastelaria: os bolos “feios”. Identifica-se com esse rótulo?

Existe uma estranheza. Não é comida que apeteça logo comer. Se calhar, concordo com o feio nesse sentido: é que [os bolos] não têm medo de ser estranhos; mas não acho que sejam feios. São só diferentes. Acho que têm muita beleza em si, nessa espontaneidade e nessa maneira de fazer própria de cada artista. Não levo a mal, claro.

Voltando aos elementos decorativos, qual foi a coisa mais estranha que usou num bolo?

Malaguetas (risos). Porque me pediram para fazer um bolo baseado em comida indiana. Foi um dos primeiros.

Os bolos têm um aspeto exuberante, cheio de cores e elementos, várias camadas de informação… Mas nos sabores e recheios podem ser mais consensuais, não é?

Sim. As pessoas têm gostos muito específicos, e há quem não goste de coisas que para mim são muito normais. Penso também que, se o bolo é para uma festa, com muitas pessoas, é melhor não arriscar demasiado. Tento que haja a possibilidade de escolher sabores mais consensuais, mas fui aprimorando as receitas para ter a certeza de que todos eles são bons. E acrescentando alguns sabores mais diferentes, como moka e especiarias, matcha, lavanda…

(Fotografia: DR)

No futuro gostava de ter um espaço?

Gostava de tentar ir para outro país e ter uma cozinha-ateliê, receber pessoas, fazer workshops

Gostava de ir para outro país por alguma razão especial?

Principalmente porque é muito difícil ser criativo cá.



Do chocolate à lavanda, com entrega na zona de Lisboa

São bolos de aspeto invulgar, mas podem ter sabores e recheios mais consensuais. Chocolate, laranja, coco e cenoura surgem como possibilidades ao preencher o formulário de encomenda online. Quem quiser fugir ao convencional tem desde moka e especiarias até matcha ou lavanda. E há opções vegan.

(Fotografia: DR)

 

 




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