É um local discreto, a 150 metros do início da Avenida da Boavista. Casa com estatuto de interesse municipal e jardins classificados, tudo por causa da sua riqueza cultural e do património edificado. Depois de anos de abandono, o Palacete Severo revela-se ao Porto desde meados de outubro como boutique hotel. O edifício, projetado pelo arquiteto, engenheiro, arqueólogo, político e escritor Ricardo Severo (1869-1940), ficou pronto em 1902, surge restaurado, renascido. Possui 20 quartos e suítes, cada um moldado à medida da configuração dos compartimentos originais – escritório, espaço das empregadas, cozinha, quartos, pombal, etc. Tudo com design de interiores da autoria de Paulo Lobo – e este “tudo” abrange áreas abertas a não hóspedes como o restaurante gastronómico Éon (ver caixa), e o mais informal Bistrô Severo, este último palco de pequenos-almoços, almoços e jantares, ambos liderados por Tiago Bonito, que já conheceu o sabor da estrela Michelin na Casa da Calçada, em Amarante.
Antes dos quase dois anos de obras que conduziram a este pequeno recato rodeado de verde num dos centros nevrálgicos da Invicta, deu-se a descoberta. “Os proprietários que compraram esta casa [um casal francês], a primeira coisa que viram foi o jardim, e não a casa”, conta Joana Almeida, diretora geral do hotel. “Para eles, era muito importante procurar alguma coisa no centro da cidade que tivesse riqueza e património, mas um jardim era imprescindível”. Dito isto, esclareça-se que a casa “estava abandonada, mas relativamente bem conservada. Não estava destruída”. O que se comprova pelo soalho, pelos lambris, pelas portas, pelos tetos trabalhados, vários deles em madeira.
O Palacete Severo é também, todo ele, palco de uma espécie de galeria de arte, com “funcionamento autónomo, mas integrado”. Em rigor, uma extensão portuguesa da Perspective Galerie, no centro de Paris. Com programação própria, “mas com as obras integradas no interior do edifício”, seja nos quartos, seja nas áreas comuns. É visitável todos os dias, das 10 às 12 horas e das 15 às 19 horas. “Mostramos tudo o que é possível” ressalva Joana Almeida. “Pomos um ou dois quartos para visita, se não estiverem ocupados.” Neste momento, e até 26 de janeiro de 2025, experimenta-se a mostra “Mystères sous la surface”, com curadoria de Victoire Di Rosa e obras de Patricio Cabrera, Neil Farber, Curro González, Cristine Guinamand e Jas.
Ao fundo de um corredor no primeiro andar parte uma escadaria estreita, íngreme e curva que termina numa deslumbrante e luminosa suíte, com mais um quarto, o mais pequeno de todos, “uma mansardinha”, pelo caminho. Chegar ao topo é, admite a diretora da unidade, “um desafio”, apenas para hóspedes sem problemas de mobilidade. No espaço noutros tempos destinado à sala de jantar nasceu uma biblioteca, a umas portadas de distância da sala de reuniões; trata-se de um compartimento também com acesso autónomo pelo exterior, e as marcas da sua função original, como sala da música, permanecem na ornamentação do teto, onde abundam os instrumentos musicais.
Cruzamo-nos frequentemente com vitrais, também originais, também reparados. Um deles contém os nomes “Ricardo” e “Francisca”. Francisca Santos Dumont, brasileira, casou-se com Ricardo Severo em 1893 em terras de Vera Cruz, para onde este republicano havia partido, às avessas com a monarquia lusa. Severo “integra um grupo de arquitetos, portugueses e brasileiros, que se comunica na tentativa do encontro da casa ideal portuguesa. Este palacete faz parte desse ensaio”.
Lá fora, uma piscina aquecida e de sal. Na face oposta, árvores centenárias e um jardim denso, com salpicos de mesas e cadeiras aguardando o verão. Nas traseiras, uma nova e discreta construção alberga mais nove quartos, assim como spa e ginásio. Nada é severo no Palacete Severo.
Réveillon no Éon
O restaurante gastronómico do Palacete Severo foi buscar o nome ao que os dicionários definem como um “período incomensurável de tempo”. No Éon, que tem ao leme o chef Tiago Bonito, pretende-se projetar a gastronomia portuguesa para um “patamar de modernidade e exceção” (lê-se em nota de imprensa). Nos dias habituais de funcionamento – de quinta a domingo, das 19.30 às 23 horas – serve-se um menu de 14 momentos. Pedro Carvalho é o chef pasteleiro, e a sommelier Sara Godinho cuida das ótimas, e nada óbvias, escolhas vínicas. A 31 de dezembro acontece jantar de fim de ano, com o seguinte elenco: cocktail de boas-vindas no bar Severo; batata, espargo e trufa preta; atum rabilho, caviar e ostra do Algarve; carabineiro do Algarve, coco e manga, caril verde; robalo de anzol, vieira, couve-flor e noisette; novilho, foie Grass, cogumelos selvagens e molho holandês; ananás, iogurte grego e hortelã; chocolate branco e bergamota, champanhe e mel de urze; café e “mignardises”; champanhe e passas à meia-noite. Vale 275 euros por pessoa, com suplemento de pairing de vinhos disponível por 80 euros.
Palacete Severo
Rua de Ricardo Severo, 21, Porto
Tel.: 229 677 000
Web: palacetesevero.com
Preço: quartos desde 319 euros/noite